4 a 8 de novembro de 2024
A Semana de Consciencialização do Patient Blood Management (PBM), oferece uma oportunidade única para refletirmos sobre a importância e os princípios desta prática na melhoria do cuidado dos doentes. A nível institucional, a implementação do PBM tem o potencial de transformar a forma como o sangue é gerido e utilizado, com impacto direto na segurança e na recuperação dos doentes.
Princípios do Patient Blood Management (PBM)
O PBM é uma abordagem multidisciplinar focada na otimização do sangue do próprio doente, com o objetivo fundamental de melhorar o resultado clínico na sua jornada, e baseia-se em três pilares fundamentais:
- Otimização da massa eritrocitária do doente: Este princípio envolve estratégias para garantir um hematócrito adequado antes de procedimentos cirúrgicos ou durante o tratamento de condições crónicas, o que pode ser realizado, por exemplo, através de suplementação de ferro, eritropoetina e mudanças na alimentação e estilo de vida.
- Redução de perda sanguínea e preservação do sangue: Em cirurgias ou tratamentos invasivos, é fundamental adotar técnicas que minimizem a perda de sangue, como o uso de equipamentos (cell saver), técnicas cirúrgicas menos invasivas, estratégia transfusional guiada por testes viscoelásticos, utilização de antifibrinolíticos e otimização peri-operatória da hemostase.
- Aumento da tolerância à anemia: Em vez da transfusão ser um ato quase mecânico despoletado por um valor de hemoglobina, o PBM estimula o tratamento e gestão da anemia de forma personalizada, otimizando os doentes para que estes possam tolerar níveis mais baixos de hemoglobina de forma segura.
Estes princípios são aplicados de forma integrada, com o principal objetivo de melhorar o outcome clínico, reduzindo a necessidade de transfusões alogénicas e promovendo uma recuperação mais segura, com menos complicações e consequentemente menores custos associados.
A importância dos Médicos de Família
Os Médicos de Família desempenham um papel crucial na implementação e sucesso do PBM, pois são os médicos mais próximos do doente e têm um conhecimento abrangente do seu histórico de saúde. Colocam-se, portanto, numa posição privilegiada para identificar precocemente fatores que possam afetar a massa eritrocitária, como défice de ferro ou condições crónicas e podem agir preventivamente, dando início à suplementação ou direcionando o utente para uma investigação e avaliação especializada antes mesmo de um procedimento invasivo ser considerado.
A multiprofissionalidade no PBM
A prática do PBM é profundamente sustentada no trabalho multiprofissional. A gestão do sangue e a promoção de uma recuperação mais segura dependem de uma colaboração integrada entre diversos profissionais de saúde: Médicos, Enfermeiros, Farmacêuticos, Nutricionistas… todos têm papeis fundamentais e complementares na implementação de um programa PBM.
Esta abordagem multiprofissional é essencial para o sucesso do PBM, pois cada profissional traz um olhar específico que contribui para uma estratégia integrada e eficaz. A interação contínua e coordenada entre as áreas proporciona um cuidado integrado e abrangente, onde todas as necessidades do doente são consideradas e abordadas de forma sinérgica.
A ULSM e a Integração de Cuidados
A Unidade Local de Saúde de Matosinhos é amplamente reconhecida pelo seu papel na integração de cuidados, uma abordagem que visa garantir que o doente recebe um tratamento contínuo e coerente em todas as etapas de seu percurso de saúde. A ULSM destaca-se por promover um modelo de saúde baseado na interligação entre diferentes níveis de cuidado – dos cuidados primários aos hospitalares – e por adotar práticas que asseguram uma transição adequada e eficiente para o doente e a família.
O modelo de integração adotado pela ULSM proporciona ainda uma maior eficiência na gestão dos recursos e reforça o seu compromisso em adotar e desenvolver práticas de alta qualidade, o que facilita a implementação de programas como o PBM, que colocam a segurança e o bem-estar do doente como prioridades.
A Importância das Decisões das Autoridades Sanitárias
A implementação e sucesso do PBM dependem fortemente de decisões estratégicas tomadas pelas autoridades sanitárias. O papel dessas entidades é crucial para estabelecer diretrizes, financiar programas, garantir a capacitação das equipas de saúde e monitorizar a qualidade dos serviços oferecidos. Através de decisões fundamentadas, adotadas logo pelas hierarquias de cada instituição, podem promover-se políticas que incentivem a prática do PBM em larga escala, assegurando que mais unidades de saúde adotem e integrem estes princípios, que são já um standard of care de acordo com as boas práticas da medicina baseada na evidência.
A Importância da Recolha e Gestão de Dados para Avaliar o Impacto do PBM
Uma parte essencial para o sucesso do PBM é a capacidade de monitorizar, avaliar e ajustar as práticas com base em dados concretos. As ferramentas informáticas e a recolha de dados desempenham um papel fundamental nesse sentido. Com sistemas de gestão de dados eficazes, a ULSM poderá acompanhar em tempo real o impacto das medidas adotadas, como a redução do número de transfusões, o encurtamento no tempo de recuperação e internamento dos doentes e a diminuição da incidência de complicações.
Estes dados permitem não só demonstrar os resultados positivos da implementação do PBM, mas também avaliar a eficácia das intervenções e identificar áreas de melhoria, ajudando a ajustar as estratégias de forma contínua e comparar a nossa atuação com a de outras instituições, quer nacionais quer internacionais.
Além disso, a recolha e análise de dados oferecem evidências concretas para justificar o investimento em PBM e influenciar a tomada de decisões a nível político e administrativo. Com dados fiáveis e atualizados, é possível demonstrar às autoridades sanitárias e outros stakeholders o impacto positivo das medidas implementadas e a importância de continuar a investir em práticas de gestão de sangue centradas no doente.
O financiamento de sistemas de tecnologia e inteligência artificial para gestão de dados torna-se, portanto, indispensável.
Reflexão
A Patient Blood Management Awareness Week, não apenas celebra esta prática, mas reforça também o compromisso de todos os profissionais de saúde e autoridades em oferecer cuidados mais seguros e eficientes a todos os doentes.
Assim, a celebração da PBM Awareness Week é uma oportunidade para relembrarmos a importância de práticas integradas, humanizadas e seguras na área da saúde. No contexto da nossa ULSM, o PBM não deveria ser apenas uma consulta, mas uma filosofia de cuidado centrada no doente e uma parte da cultura da nossa instituição.
Para materializar esta visão não podemos esquecer que o papel central dos médicos de família, o trabalho real em equipa multiprofissional, a integração de cuidados entre diversos níveis de cuidados e especialidades, as decisões estratégicas das autoridades sanitárias, o apoio da gestão de topo das instituições e a recolha e tratamento eficazes de dados são pilares basilares do PBM.
No entanto, assim como as vantagens dos cuidados de saúde integrados e centrados no doente são amplamente reconhecidas, o que levou à recente criação de inúmeras ULS, também o PBM, que é atualmente um padrão de cuidados amplamente reconhecido e com benefícios inquestionáveis, só é útil se for corretamente implementado.
Apesar das inúmeras vantagens, tanto a nível de saúde quanto económicas, e da vontade de avançar com este projeto na nossa instituição, a implementação de um programa desta magnitude exige a colaboração de todos e um esforço enorme.
Sendo a ULSM um exemplo nacional de cuidados integrados, cujo modelo está atualmente a ser seguido por outras instituições com orientação da tutela, é lícito acreditar que podemos ser também um exemplo na implementação de um projeto tão ambicioso como o PBM.
Um projeto de cada um de nós para todos os doentes. Um projeto alinhado com os valores da ULSM e onde o trabalho em equipa que já fazemos será a chave do sucesso.
Vamos dar o exemplo outra vez?
Comentários