Muitos chamam-lhe "cancro dos ossos" porque o atingimento destes é frequente, associando-se a dores de difícil controlo e a fracturas patológicas, muitas vezes incapacitantes.

Outras vezes, atinge os rins, causando insuficiência renal, em alguns casos com necessidade de diálise.

Quase sempre, os doentes queixam-se de cansaço, por vezes extremo, em grande parte relacionado com a anemia.

O Mieloma Múltiplo (MM) é, na grande maioria dos casos incurável, e associa-se a dores ósseas, insuficiência renal e anemia, com um aumento da incidência de infecções, resultantes da própria doença ou da toxicidade dos tratamentos.

Infelizmente há, por vezes, atraso no diagnóstico, o que causa mais sofrimento desnecessário e pode levar à lesão irreversível de órgãos, como os rins ou os ossos, e prejudicar a resposta aos tratamentos e a sobrevida.

No acompanhamento destes doentes, o "cuidador", geralmente um familiar, tem um papel crucial, pela complexidade dos tratamentos e pela multiplicação das idas ao Hospital.

Embora sejam escassos os dados estatísticos em Portugal, alguns dados preliminares do nosso Serviço apontam para uma incidência que pode ultrapassar, em muito, os 10 novos casos por 100.000 habitantes /ano, ou seja, cerca de 1000 novos casos por ano em Portugal.

Os mesmos dados projectam um número de doentes em acompanhamento a aproximar-se dos 10.000.

O aumento da prevalência traduz o aumento de novos casos e, principalmente, o aumento da sobrevida relacionada com os avanços terapêuticos dos últimos trinta anos: novos grupos de fármacos, novos fármacos de cada grupo, associação de fármacos, consolidação com auto-transplante de medula óssea, estratégias de manutenção.

Tudo isto permitiu mais do que duplicar a mediana de sobrevida, com um número crescente de sobreviventes de longo prazo, mais de 10 anos, alguns deles funcionalmente curados.

A este sucesso crescente associam-se aumentos de custos em recursos humanos e financeiros.

O custo total por cada doente, frequentemente , ultrapassa em muito os €100.000 , sendo o MM responsável por uma despesa anual superior a  €100 M em Portugal, e que ainda está a crescer!

O MM é uma preocupação da Saúde Pública, pelo número de doentes envolvido, pelo sofrimento causado, e por uma despesa crescente preocupante.

É importante desenvolver estratégias a diversos níveis.

Diagnóstico

a) ao nível dos Cuidados Primários, sensibilizando os médicos para o MM e criando canais de articulação com os Serviços de Hematologia; b)ao nível dos laboratórios de análises, formando os profissionais para a identificação e alerta sobre os casos potenciais ( temos uma experiência muito positiva na nossa ULS); c) ao nível dos Serviços de Urgência, formando os médicos, em especial nas triagens.

Assim, conseguiremos diagnósticos mais precoces, com menos sofrimento, mais sucesso terapêutico e comportando menos gastos.

Tratamento

Criar no SNS orientações para o tratamento do MM, permitindo mais acerto e igualdade de cuidados, numa doença de grande complexidade terapêutica .

Permitir ao SNS negociar melhores condições com a indústria farmacêutica, de forma a manter o acesso à inovação com custos controlados.

Estes são os desafios que todos temos pela frente numa doença tão complexa e tão difícil.

Para isso, cá estamos todos!

Um artigo de Manuel Cunha, Director do Serviço de Hematologia da ULS de Trás-os-Montes e Alto Douro.

Este artigo expressa unicamente a opinião do autor com base na experiência e recolha de dados do ULS Trás-os-Montes e Alto Douro.