“Não existe nenhuma vacina para nenhuma doença parasitária humana, todas as vacinas que existem são contra doenças bacterianas ou virais. Um parasita é um organismo muito mais complexo do que um vírus ou uma bactéria” e tem “maior capacidade de se defender”, justifica o investigador Miguel Prudêncio, líder de uma equipa do Instituto de Medicina Molecular que trabalha no desenvolvimento de uma vacina desde 2010.

Esta complexidade ajuda a perceber porque é que, apesar de terem sido investidos milhões de euros ao longo de décadas, ainda não foi possível criar uma vacina eficaz contra esta doença que se transmite pela picada de mosquitos infetados.

A resposta imunitária proporcionada pela vacina tem também limitações.

Como a “memória imunitária” face a este organismo (o Plasmodium) é de curta duração, a vacina não permite uma proteção prolongada. Mesmo pessoas expostas ao parasita em regiões endémicas, que desenvolvem um determinado grau de imunidade à doença, ficam vulneráveis à malária se abandonarem essas regiões e deixarem de estar em contacto com o parasita.

O desafio “é criar uma vacina que permita espoletar um grau de imunidade suficientemente elevado para conferir proteção, mas também arranjar formas de tornar essa imunidade o mais duradoura possível”, adianta o especialista

A vacina experimental que está mais avançada começou a ser testada em larga escala, em abril, no Malaui. Até 2020, o objetivo é inocular 120 mil crianças neste país, no Quénia e no Gana.

Este “candidato a vacina” tem vindo a ser desenvolvido há 30 anos e já passou por várias fases de testes, mas os resultados mostram que confere um grau de proteção relativamente baixo.

“Confere uma proteção média de 35%, dependendo da idade, e vai diminuindo ao longo do tempo. Ao fim de quatro anos já não confere proteção nenhuma”, descreve Miguel Prudêncio, sublinhando que é preciso avaliar se faz sentido, ou não, licenciar uma vacina com este grau de proteção.

Por isso, o investigador é cauteloso: “é muito importante o que está a acontecer, porque se trata do primeiro ensaio-piloto em grande escala com esta vacina, mas isto não deve ser confundido com o licenciamento. É errado dizer-se que já existe uma vacina contra a malária disponível”

Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), esta campanha vai ajudar a avaliar qual o impacto da vacinação em larga escala na redução de casos de malária severa.

Desta avaliação “poderá resultar ou não um licenciamento por parte da OMS”, afirma o investigador, acrescentando que “o consenso na comunidade científica relativamente a esta vacina é de que fica aquém do objetivo de 100% de grau de proteção e é necessário desenvolver alternativas mais eficazes”.

Existem vários projetos de investigação em curso a nível mundial, entre os quais o trabalho liderado Miguel Prudêncio e financiado, entre outras entidades, pela Fundação Bill and Melinda Gates que já custou entre 2,5 a 3 milhões de dólares.

Os ensaios clínicos em humanos (24 pessoas) decorreram o ano passado, na Holanda, em parceria com Malaria Vaccine Initiative e o Radboud University Medical Center (Radboudumc) e os resultados estão prestes a ser publicados, mas o investigador não quis adiantar detalhes.

“A nossa vacina está a fazer o seu caminho”, resumiu.