Os resultados do estudo, que abrangeu as épocas gripais entre 2008/09 e 2018/19 — excluindo a época 2009/10 por causa da pandemia de H1N1 -, sugerem que existe uma subdeteção da gripe na população portuguesa.
Em declarações à agência Lusa, o coordenador do estudo, o pneumologista Filipe Froes, explicou que a investigação analisou as épocas gripais até à 2018/19, para evitar modificações nos resultados decorrentes da pandemia de covid-19, que chegou a Portugal em 2020.
No estudo (BARI — Burden of Acute Respiratory Infections) “verificámos uma subnotificação grande em termos de códigos de gripe [o código internacional de registo da doença] e um excesso de mortalidade. Atribuímos todos os anos um excesso mortalidade, quer à gripe quer ao frio, mas depois não temos essa tradução nos certificados de óbito”, afirmou.
“Confirmamos que neste período temos em média de excesso mortalidade anual que rondará os 3.000/3.600 óbitos, (…) que são atribuídos ao frio e à gripe, mas isso apenas se traduz em cerca de 100 a 200 códigos de gripe nos certificados de óbito”, explicou o pneumologista, consultor da Direção Geral da Saúde, apontando o porquê desta situação: “a pessoa que passa o certificado de óbito não vai pedir um teste para confirmar a gripe, e escreve infeção respiratória”.
Esta subnotificação, sublinhou, “dificulta a avaliação do verdadeiro impacto da gripe”.
Filipe Froes diz que depois da pandemia de covid-19, com o impulso dos métodos de biologia molecular, vai haver “mais ferramentas para diagnosticar, quer a gripe, quer outras infeções virais”, aumentando a consciencialização do impacto da doença.
“Em termos de causas de morte, há uma subnotificação e, em termos de internamento, há um subdiagnóstico”, afirmou o especialista, insistindo: “Temos uma doença que é a primeira doença infecciosa em termos de carga de doença e, em termos de impacto e internamentos hospitalares, temos um subdiagnóstico que faz com que, em média, o número de internamentos que são codificados como associados à gripe raramente ultrapasse os 2.000 2.500”.
A investigação indica ainda que o número médio de internamentos codificadas como gripe por época foi de 1.207, resultando em 11,6 casos por 100.000 pessoas. O custo anual direto médio desses internamentos foi de 3,9 milhões de euros, dos quais 78,6% foram gerados por pacientes com comorbidades.
O estudo identificou ainda uma relação entre o pico da atividade gripal e os internamentos por pneumonia: “as pessoas quando têm gripe, muitas vezes, acabam por ser internadas pelas complicações da gripe, e não necessariamente pela gripe em si, o que também ajuda à desvalorização”, expicou Filipe Froes.
O especialista, que é também membro do Conselho Nacional de Saúde Pública, lembrou ainda que a gripe “favorece a pneumonia bacteriana secundária ou a descompensação de outras comorbilidades”, como é o caso, por exemplo, das doenças cardíovasculares.
A investigação concluiu que a média anual de hospitalizações por doenças respiratórios ou cardiovasculares associadas à gripe foi estimada em 5.356, correspondendo a 51,5 casos por 100.000 para todas as faixas etárias e a 199,6 para a população com idade igual ou superior a 65 anos.
O custo anual direto médio dos internamentos em excesso por problemas respiratórios ou cardiovasculares foi estimado em 15,2 milhões de euros para todas as faixas etárias e 12,8 milhões para a população com idade igual ou superior a 65 anos.
Face à real dimensão dos efeitos da gripe sobre os serviços de saúde, nomeadamente pelos recursos que consome, Filipe Froes considera que, mesmo para quem paga a vacina da gripe (nestes casos comparticipada a 37% pelo SNS) “é um dos investimentos mais rentáveis que faz todos os anos”.
“Não há nenhum investimento económico que dê tanta rentabilidade, porque se estiver doente, o que se gasta em medicação compensa o investimento feito”, acrescenta.
Este foi o primeiro estudo nacional a estimar a carga de morbidade e mortalidade epidemiológica e económica da gripe.
Os dados de mortalidade são representativos do país, pois foram utilizados todos os óbitos registados em Portugal. Quanto aos dados de internamentos, representam todas as hospitalizações no Serviço Nacional de Saúde, não incluindo o setor privado.
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