Fumar continua a ser uma das principais causas evitáveis de doença e de morte prematura em todo o mundo. Os últimos dados do relatório do Observatório Europeu dos Sistemas e Políticas de Saúde revelam que, em Portugal, cerca de um terço das mortes registadas em 2019 podem ser atribuídas a fatores de risco comportamentais, nomeadamente ao tabagismo. Nesta análise do estado da saúde na União Europeia (EU) verificamos, ainda, que o tabaco contribuiu em 12% para a mortalidade nesse ano.

No século XXI, uma revolução tecnológica está a transformar a forma como abordamos a cessação tabágica. Das aplicações móveis à inteligência artificial, das terapias digitais à imunoterapia, um novo arsenal de ferramentas surge para ajudar os fumadores a libertar-se da dependência da nicotina.

Aplicações móveis, como a Smokefree, QuitNow e Flamy, acompanham o fumador 24 horas por dia na sua jornada para deixar de fumar. Com inteligência artificial, aprendem padrões de consumo, antecipam momentos de risco e enviam mensagens motivacionais personalizadas. É como ter um "treinador pessoal" de cessação tabágica no bolso.

Wearables, como pulseiras e patches inteligentes, monitorizam em tempo real indicadores fisiológicos associados à abstinência, permitindo uma intervenção precoce e personalizada. A realidade virtual, com ambientes imersivos que simulam situações do quotidiano, ajuda a treinar estratégias para resistir à tentação de fumar. Aliás, um estudo piloto, publicado em 2020 no Journal of Medical Internet Research, demonstrou que a terapia de exposição com realidade virtual, combinada com técnicas tradicionais de terapia cognitivo-comportamental, contribuiu para reduzir significativamente a ansiedade e o desejo de fumar, com taxas de abstinência promissoras e uma alta adesão dos participantes. Ainda que esta evidência careça de maior sustentação científica é um ponto de partida promissor.

No campo farmacológico, a imunoterapia anti-nicotina, com vacinas que induzem o sistema imunológico a produzir anticorpos contra a nicotina, pode reduzir a dependência e os efeitos de reforço do ato de fumar.

Soluções simples, como linhas telefónicas de apoio e mensagens de texto automatizadas, também demonstram eficácia na promoção da abstinência, com potencial para alcançar populações com menor acesso a tecnologias.

Mas, apesar dos benefícios, a tecnologia também traz desafios, como a desinformação nas redes sociais, muitas vezes impulsionada pela indústria do tabaco. Iniciativas como a campanha "Truth" nos EUA utilizam as mesmas plataformas para desmascarar táticas enganosas e capacitar os jovens com literacia mediática.

O futuro passa pela integração destas múltiplas abordagens num ecossistema digital sinérgico, oferecendo uma experiência holística e personalizada para cada fumador. A análise de big data permitirá identificar padrões e preditores de sucesso, otimizando intervenções em tempo real.

Este futuro inspirador requer um compromisso coletivo de governos, profissionais de saúde, academia e sociedade civil para garantir o acesso generalizado a estas inovações. Só assim aproveitaremos todo o potencial da tecnologia para criar um mundo livre do tabaco.

A revolução tecnológica na cessação tabágica já começou. Cabe-nos abraçá-la e moldá-la em prol da saúde pública. Com criatividade, colaboração e ciência, podemos transformar a forma como abordamos este desafio de saúde. O futuro é promissor e está ao nosso alcance.

Um artigo de Tiago Esteves, Diretor-geral da Linde Saúde para a região Europa Ocidental.