“Sinto-me presa. Sempre gostei de dividir o espaço de trabalho e o de descanso e agora o meu quarto é o sítio de tudo”, desabafa Carolina Assunção, estudante de Engenharia no Porto, residente em Braga, já sem sintomas mas “um bocado perdida” quanto à fase em que poderá concluir a quarentena, pois aguarda desde 23 de março, altura da confirmação da infeção, o telefonema do hospital que o delegado de saúde pública disse que ia chegar.

Com Joana Sousa, responsável de loja de 31 anos, do Porto, o delegado de saúde manteve contactos, mais intensos no início da confirmação da infeção, a 16 de março, mais espaçados conforme foi ficando estável, recebendo a indicação de que não fará novo teste, antes vai “esperar o último dia de sintomas, contar a partir daí 14 dias para sair do isolamento e “poder abraçar de novo a família sem medo”.

António Assunção, médico de 49 anos, pai de Carolina, considera “muito extraordinária” a situação vivida com a família, devido à ausência de contacto hospitalar.

“Só a consigo enquadrar, pensando que o hospital percebeu que os pais eram médicos e optou por não ligar. O delegado de saúde disse-lhe que ia ser contactada pelo hospital sobre o tratamento em casa, para aguardar orientações do hospital e o contacto nunca chegou”, observou, em declarações à Lusa.

Agora que passaram os sintomas (febre, cansaço, dor de cabeça, alterações do palato, dificuldades em engolir, garganta inflamada, ataques de tosse), a filha, Carolina, sente-se “muito perdida” sobre se terá de aguardar “mais uma/duas semanas ou um mês” para dar por concluída a quarentena.

A infeção, julga tê-la contraído enquanto participou na organização de um evento que juntou estudantes de engenharia de vários pontos da Europa na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP).

“Voltei para casa, em Braga, quando a FEUP anunciou o cancelamento das aulas presenciais, a 11 de março. Os primeiros sintomas surgiram logo, mas era uma febre baixa. Depois foram piorando”, recorda.

Foi aí, ao “quinto dia de febre mais alta”, que os pais acharam que não seria uma virose e, após contactos infrutíferos com a linha Saúde 24, recorreram à linha de Apoio ao Médico e, apesar da ausência de ligação a um caso confirmado, conseguiram que a filha fosse testada.

Desde 22 de março que nunca mais ninguém da família saiu de casa.

Carolina continua com aulas na faculdade, à distância, mas enquanto esteve doente ficou “um bocado perdida”, na “fase pior nem conseguia pensar nisso”.

Confinada ao quarto, lê, fala ao telemóvel com os amigos, canta, faz alongamentos. “É uma rotina um bocado aborrecida”, desabafa.

Quando puder deixar as quatro paredes, “provavelmente” não vai poder sair de casa, mas finalmente poderá “abraçar os pais”.

Joana, infetada pela mãe

Já Joana Sousa está certa de ter sido infetada pela mãe, que trabalha no hospital de São João, no Porto, e também testou positivo para o novo coronavírus.

Estão as duas isoladas em quartos diferentes da mesma casa e contam com o apoio da irmã nas limpezas, refeições e desinfeções.

É uma “tarefa complicada”, mas os sintomas foram “ligeiros", passando por “dor de cabeça, perda total do olfato e paladar, dores musculares, febre sempre baixa, alguns enjoos e alguma falta de ar”.

Para ocupar o tempo, faz “coisas normais”, como ler, ouvir música, ver séries e filmes, “tentar não ler muitas notícias” e “lentamente, regressar ao exercício físico”.

“Há momentos em que nos sentimos mais em baixo. Sente-se falta da rotina e da normalidade. Mas tenta-se combater da melhor maneira. Tenho a sorte de ter jardim, onde posso passar algum tempo”, relata.

Portugal registou hoje 187 mortes associadas à covid-19, mais 27 do que na terça-feira, e 8.251 infetados (mais 808), segundo o boletim epidemiológico divulgado pela Direção-Geral da Saúde (DGS). De acordo com dados da DGS, a grande maioria dos infetados (7.525) está a recuperar em casa, 726 (mais 99, +15,8%) estão internadas, 230 (mais 42, +22,3%) dos quais em Unidades de Cuidados Intensivos.

Detetado em dezembro de 2019, na China, o novo coronavírus já infetou perto de 866 mil pessoas em todo o mundo, das quais morreram mais de 43 mil.