Como dar sinais de consentimentos não-verbais e como identificá-los?

O consentimento é tendencialmente acompanhado de entusiasmo e de uma atitude positiva. Pode ser dado verbalmente, mas também pode ocorrer através de comportamentos não verbais como um aceno de cabeça. Estes sinais não verbais tendem a ser mais facilmente confundidos ou mal interpretados, pelo que é preciso alguma cautela.

Nalgumas situações desconfortáveis, o silêncio é o caminho tomado pelas vítimas. Na sua opinião, por que razão isto acontece?

A sexualidade é um tema de cariz íntimo e que ninguém gosta de ver exposto ou comentando. Isto, associado à vergonha e em alguns casos ao eventual medo de represálias, fazem com que muitas situações desconfortáveis sejam silenciadas. O desconforto da exposição da situação pode em alguns casos ser superior ao desconforto da própria situação ou pode ser mais uma situação desconfortável a somar àquela que já foi vivida, facto que leva ao silenciamento.

Com a sua experiência, acha que é possível dizer-se que entre casais ainda permanece a ideia bíblica de que o corpo do parceiro lhe pertence? Como nos podemos desfazer dessa crença e empoderarmo-nos do nosso próprio corpo?

Mais do que a pertença do corpo, existe a necessidade de corresponder à expectativa do parceiro(a), de modo a não o(a) desagradar por medo de perder o seu amor e afeto. Logo, pode gerar-se uma dinâmica em que um dos parceiros acaba por fazer algo desconfortável para assim agradar ao outro. Felizmente, em casais com um funcionamento normativo, a ideia de pertença sobre o corpo do outro já não é comum. É importante, contudo, perceber que só estando bem e confortáveis com o próprio corpo e com determinadas práticas poderemos estar bem nas relações que estabelecemos com os outros e connosco próprios.

Muitas mulheres, mesmo após dizerem não e mostrarem desconforto, calam-se e "permitem" que os parceiros prossigam o ato sexual. Isto é uma violação? Quais as consequências de situações como esta?

Estas situações em que não há um posicionamento claro e assertivo e onde o "não" não é audível e indiscutível correm o risco de cair na ambiguidade ou ser mal-entendidos pelo outro. Pode levar o outro a assumir que o(a) parceiro(a) permitiram. Assim, é importante ser-se claro no momento do “não”, caso contrário, poderemos criar situações desconfortáveis, constrangedoras e potencialmente traumáticas.

Durante muitos anos a atividade sexual existia maioritariamente para gratificação do homem, não existindo muita margem de diálogo ou espaço para a expressão feminina. A mulher foi-se desenvolvendo dentro destes parâmetros, onde o consentimento era uma coisa pouco relevante, já que a mulher estava ali para satisfazer o homem. Assim, a mulher tem descoberto nas últimas décadas a sua liberdade sexual e direito ao prazer, ao mesmo tempo que aprende a posicionar-se e a dizer “não” quando não sente vontade ou não deseja.

A insistência após o não é um tipo de abuso?

A insistência perante um “não” é uma forma de abuso e de agressão psicológica e emocional perante outra pessoa. Em situações limite, a insistência após um não constitui uma violação.

Nas gerações anteriores dizia-se que o homem traia para ter o que não tinha em casa. É possível dizer que esta é uma forma de manipulação para que as mulheres se submetam a atos que normalmente não consentiriam?

Acima de tudo, esta crença é uma forma de legitimação da infidelidade e de comportamentos que desrespeitam o outro. Mais do que uma forma de manipular o(a) parceiro(a) para fazer práticas com as quais não se sente confortável, é uma estratégia que sempre foi usada para desresponsabilizar alguém de uma infidelidade. Pode, por isso, ter uma dupla intenção.

Como comunicar ao outro os seus limites?

A melhor forma de o fazer é ser claro(a), assertivo(a) e deixar expressos os comportamentos e práticas com as quais não estamos confortáveis e que não vamos fazer independentemente de ser uma vontade do outro. É importante também entender que, o consentimento pode ser retirado. Mesmo que hoje eu tenha aceitado fazer determinada coisa não significa que isto se traduz num consentimento vitalício. Acima de tudo, é não ter medo de magoar o outro e, se acontecer, é uma inevitabilidade que preservará a nossa integridade física e emocional.

O que fazer em caso de perigo?

Afastar-se da pessoa em causa, falar com um amigo, familiar, profissional de saúde ou autoridade policial. Proteger-se em primeira instância e, se for o caso, denunciar a seguir.