O evento “BEYOND 5: Juntos Transformando Paradigmas, Perspetivando a Cura com CAR-T”, organizado pela Gilead/Kite, celebra 5 anos de terapia CAR-T em Portugal. Reunindo especialistas nacionais e internacionais, o evento visa partilhar experiências, discutir resultados e analisar o futuro desta terapia inovadora. Em entrevista ao nosso jornal, a Dra. Marília Gomes, Assistente Hospitalar Graduada de Hematologia Clínica do Serviço de Hematologia Clínica do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, EPE destaca os avanços alcançados e as perspetivas promissoras para o tratamento oncológico no país

Healthnews (HN) – Ao completarmos 5 anos de terapia CAR-T em Portugal, quais considera serem as principais conquistas e aprendizagens desta jornada?
Dra. Marília Gomes (MG) – A introdução da terapia CAR-T em Portugal foi fundamental para dar resposta terapêutica a doentes com linfomas, particularmente B difusos de células grandes, que de outra forma não teriam outra opção com intuito curativo.
Pessoalmente, considero que progressivamente conseguimos identificar e selecionar de forma mais adequada os potenciais candidatos, referenciá-los em tempo útil e lidar de forma mais adequada com a potenciais complicações.

HN – Como avalia o impacto da terapia CAR-T nos resultados clínicos e na qualidade de vida dos doentes oncológicos portugueses desde a sua introdução? Comparando com países como Espanha e França, como se posiciona Portugal em termos de utilização e resultados da terapia CAR-T? Que lições podemos retirar destas comparações?
MG – Nesta reunião Beyond 5, da iniciativa da Gilead/Kite, vamos poder tomar conhecimento do real impacto desta terapêutica nos doentes portugueses, uma vez que vai haver uma partilha das experiências de Portugal, Espanha e França. Os resultados dos estudos de vida real têm reproduzido quer em termos de eficácia, quer em termos de segurança, os resultados dos estudos piloto como o Zuma 1 (Jacobson, C. A. et al. Blood 2023; 141 (19): 2307–2315). Assim, estou muito expectante relativamente a esta sessão.
A partilha de experiências é extremamente positiva, para individualmente, nos nossos centros, podermos otimizar a nossa prática clínica, e melhorarmos os outcomes dos nossos doentes.

HN – De que forma a terapia CAR-T tem transformado o paradigma do tratamento oncológico em Portugal, e quais as perspetivas futuras desta transformação?
MG – A identificação precoce de doentes quimiorefratários ou com recidivas precoces, permitiu oferecer uma terapêutica com potencial curativo com células CAR-T, com taxa de sobrevivência global expectável de cerca de 46% aos 5 anos, versus cerca de 16% aos 2 anos, se a terapêutica subsequente fosse imunoquimioterapia. (Neelapu, S.S. et al. Blood 2023; 141 (19): 2307–2315; Van der Neste, et al. Bone Marrow Transplantation (2016) 51, 51–57).
Por outro lado, nos doentes de alto risco com recidivas precoces (menos de 12 meses após primeira linha terapêutica), os resultados obtidos com o standard of care de quimioterapia salvage, com esquemas baseados em platino seguido de consolidação com autotransplante, parecem ser superados pela terapêutica CAR-T com Axi-cell e Liso-cell, condicionando uma potencial mudança no paradigma terapêutico. (Westin, J., & Sehn, L. H. Blood (2022), 139(18), 2737–2746)

HN – Quais são os principais desafios atuais para garantir um acesso equitativo e oportuno à terapia CAR-T em Portugal, e que estratégias podem ser implementadas para os superar?
MG – Com a abertura de novos centros qualificados em terapia celular com CAR-T, o acesso dos doentes elegíveis torna-se mais equitativo. O desafio centra-se na seleção adequada dos doentes e na referenciação atempada. É, igualmente importante implementar em Portugal, uma comissão de decisão centralizada, à semelhança do que existe em outros países, não só para garantir equidade, mas também a pensar na sustentabilidade económica do SNS.

HN – Olhando para o futuro, quais são as principais inovações ou desenvolvimentos esperados na terapia CAR-T, e como podemos preparar-nos para os implementar de forma eficaz em Portugal?
MG – Penso, que no futuro, a terapia celular com células CAR-T vai ter um leque mais alargado de indicações em Portugal, como o mieloma múltiplo, ou em primeira linha em doentes com linfoma B de grandes células de alto risco.
Espero que o desenvolvimento de células CAR-T alogénicas para uso “imediato” encurtando o tempo entre a identificação da indicação terapêutica e a administração do fármaco, bem como com mecanismos que incrementem a sua eficácia e diminuam a sua toxicidade, nomeadamente com “switch-based control systems”, se tornem uma realidade na prática clínica.
A participação dos centros portugueses em investigação nesta área, pré-clínica e clínica, é fundamental para o desenvolvimento e implementação de terapêuticas inovadoras.