De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), as doenças crónicas são descritas como doenças duradouras e de progressão lenta, raramente tendo uma cura definida, exigindo, por esse motivo, cuidados continuados. Estas doenças podem ter um impacto significativo no funcionamento diário da pessoa e podem gerar comprometimentos a nível físico (E.g. limitações ou incapacidade física), psicológico (E.g. oscilações ao nível do comportamento e do humor que podem afetar o equilíbrio emocional), social (E.g. impacto nas relações interpessoais ou isolamento) e alterações no que toca à qualidade de vida e bem-estar do indivíduo.

O diagnóstico de uma doença crónica e a consciencialização da possível complexidade da mesma, pode trazer uma “avalanche” de questões e inquietações aos doentes e familiares:

“Como vou continuar a trabalhar?”; “Como vou cuidar dos filhos?”; “Será que serei capaz de cumprir com todas as minhas responsabilidades?”; “ Que impacto terá no meu corpo e na minha imagem?”; “Vou sofrer?”.

Estas e outras questões podem começar a “povoar” os pensamentos. Muitas das vezes não há respostas concretas para as suas dúvidas, ou as perspectivas são assustadoras, gerando incerteza e/ou preocupação, que podem despoletar reações emocionais intensas de medo e ansiedade (E.g. ter medo de não voltar a ser capaz de desempenhar as tarefas de forma independente, ter medo de ser considerado um “fardo” para a família).

A tentativa de manutenção de um estado funcional e o contínuo esforço para extrair algo positivo da doença estão circunscritos à maioria das pessoas que possui uma condição crónica, contudo é importante ressaltar que a prevalência destes fatores não é linear, na medida em que existe uma variabilidade de condicionantes, ora externos (E.g. contexto em que o indivíduo se encontra inserido), ora internos (E.g. preocupações em relação à doença crónica).

Com o passar do tempo e a possível progressão da doença, alguns indivíduos podem sofrer perdas graduais de autonomia, independência e de autocontrolo na realização das tarefas da rotina diária e no que diz respeito aos cuidados básicos de higiene e saúde e, com isso, carecer de mais apoio e cuidados. Pode tornar-se difícil manter um estado de humor positivo e manter um sentido para a vida. Este comprometimento pode gerar tristeza (E.g. sentir-se triste por ter limitações; sentir-se triste, porque a vida pode nunca mais voltar ao dito normal) ou zanga (E.g. sentir-se zangado e frustrado ao tentar perceber porque motivo é que tem doença crónica).

Decorrente das especificidades da doença crónica, é fulcral que sejam realizadas adaptações nas áreas de vida do paciente (E.g. laboral, pessoal e familiar). O suporte social providenciado de modo informal (Família e amigos) é um importante recurso no processo de adaptação da doença. A família tem um papel preponderante ao nível da (re)construção de significado, da resolução de problemas e da prestação de cuidados de saúde diários. Existe muitas vezes uma redefinição de papéis e mudanças na dinâmica familiar com o intuito de dar resposta às exigências da pessoa portadora de doença crónica. A introdução da família como fonte de ajuda pode implicar uma (re)organização das rotinas diárias (o processo saúde-doença precisa de ser interpretado segundo uma perspetiva biopsicossocial).

Paralelamente aos cuidados médicos e de enfermagem, e ao apoio que o serviço social pode prestar na mobilização de recursos e adaptação à doença pode tornar-se imprescindível o recurso a apoio formal de profissionais de saúde mental especializados.

Apesar das reações de ansiedade, tristeza ou zanga serem expectáveis e normativas, a doença crónica pode contribuir para o desenvolvimento de quadros de perturbação de ansiedade e depressão com significado clínico, para a manifestação de irritabilidade, desconforto, insegurança, dor, angústia e perda de sentido de vida, que pode até ser acompanhada de ideação suicida. Face à manutenção e/ou intensificação deste tipo de sintomatologia, podem existir claros benefícios na prescrição de medicação por especialistas de psiquiatria, que atue sobre a mesma.

Neste apoio, que pode ser extensível aos cuidadores familiares, também eles muitas vezes em sofrimento, o papel da psicologia clínica e da saúde pode também fazer a diferença. Uma intervenção centrada nas necessidades e caraterísticas individuais da pessoa e da doença, utilizando técnicas de psicoeducação, ferramentas orientadoras da autorregulação emocional e uma reorganização cognitivo-comportamental podem potenciar uma melhor adaptação à doença e uma reconstrução de uma narrativa com mais sentido para a vida.

Um artigo de Carolina Pinheiro, Mayra Delalibera e Pedro Frade, da Consulta de Luto e Acontecimentos de Vida do PIN.