O Fashion Freak Show é um espetáculo sobre a sua vida e a sua carreira. Alguma vez imaginou que a sua vida tinha potencial para se tornar num musical? Escrever e criar algo deste género sempre foi sonho para si?
Quando era criança, talvez com nove anos, assisti pela televisão em casa da minha avó ao espetáculo de estreia do Folies Bergère [nome dado às casas de cabaret parisienses] onde as raparigas desciam do teto vestidas com meias de rede e plumas… Fiquei tão fascinado que no dia seguinte comecei a desenhá-las durante a aula e fui apanhado pelo meu professor, que afixou os desenhos nas minhas costas e obrigou-me a percorrer todas as salas da escola. Isso teve o efeito oposto em mim: em vez de me humilhar, tornou-me popular e todos os meus colegas de turma queriam que desenhasse algo para eles. Aí, percebi que poderia ser amado através do meu trabalho.
Uns anos mais tarde vi o filme Falbalas (1945), do Jacques Becker, sobre uma casa de alta-costura durante a época da guerra onde havia um desfile no final. Fiquei tão apaixonado por aquilo que percebi que era isso que queria fazer da minha vida. E, assim, tornei-me designer de moda e costureiro.
Contudo, o teatro e o cabaret sempre ficaram dentro de mim e quando se aproximou o marco dos meus 50 anos de carreira no mundo da moda, pensei que estava na altura de regressar àquele que tinha sido o meu primeiro amor. E que melhor história para contar do que a minha, a que conheço melhor. Neste espetáculo coloquei tudo o que é importante para mim. Como a minha própria vida sempre girou em torno da moda e dos “freaks”, eu adoro a diferença e diferentes tipos de beleza. E claro que é um espetáculo.
O teatro e o cabaret sempre ficaram dentro de mim e quando se aproximou o marco dos meus 50 anos de carreira no mundo da moda, pensei que estava na altura de regressar àquele que tinha sido o meu primeiro amor
Este espetáculo estreou em 2018, pouco tempo antes de anunciar que ia abandonar o mundo da moda. Sentiu que essa era a altura certa para experimentar algo fora da sua zona de conforto, como é este espetáculo?
Trabalhei em diferentes áreas ao longo da minha carreira. Fiz figurinos para filmes, três deles com o cineasta espanhol Pedro Almodóvar, colaborei com a coreógrafa Regine Chopinot por mais de 10 anos e até gravei um álbum. Adoro ter experiências diferentes e sair da minha zona de conforto. Mas este espetáculo é diferente, uma vez que é sobre a minha vida e tudo aquilo que me apaixona. Estreou em 2018 e retirei-me do mundo da moda em 2020. Foi o momento certo após uma carreira de 50 anos, onde comecei ao lado de Pierre Cardin na década de 1970 e lancei a minha própria marca em 1976.
Quais foram os maiores desafios que sentiu ao criar um espetáculo deste género que abrange 50 anos da sua vida e carreira?
Sou designer de moda, costureiro e não um diretor teatral, mas tive uma grande equipa à minha volta. A falecida Tonnie Marshall como minha codiretora, Marion Motin como coreógrafa, Raphael Cioffi nos diálogos, Thierry Suc no papel de produtor e o meu elenco fantástico. Todos eles fizeram com que esta fosse uma experiência fácil e gratificante.
Adoro ter experiências diferentes e sair da minha zona de conforto. Mas este espetáculo é diferente, uma vez que é sobre a minha vida e tudo aquilo que me apaixona
Como foi o processo de produção para o Fashion Freak Show: quando tempo dedicou à sua criação, como criaram os efeitos visuais e decorreu o processo de casting do elenco?
Já tinha esta ideia na minha cabeça há algum tempo, mas demorámos dois anos até a concretizarmos. Desde as primeiras reuniões ao casting, passando pela escolha da música com o Nile Rodgers, ensaios e previews. E continuamos a melhorar cada um destes aspetos ao longo da digressão internacional. Os efeitos visuais melhoraram, há novos ecrãs e novos vídeos. Queria que o casting fosse um reflexo da diversidade e dos diferentes tipos de beleza que existem, e acho que consegui.
Há momentos tristes, mas a maior parte é repleta de alegria e há momentos muito divertidos
Quais foram as suas principais inspirações durante o processo criativo deste espetáculo?
Além de mostrar aquilo que foi a minha vida, também quis fazer um retrato da época em que vivemos. Há uma cena inspirada no período em que trabalhei com o Pierre Cardin durante os anos 1970, há outra em Londres que sempre me inspirou e ainda algo relacionado com a cirurgia cosmética e a obsessão com a juventude.
Há muitos aspetos neste espetáculo - música, dança, moda. Diria que também existe comédia e humor?
Claro, nunca me levo demasiado a sério. A moda é uma indústria muito séria, é um trabalho árduo, mas eu sempre quis trazer algum humor para o espetáculo. Há momentos tristes, mas a maior parte é repleta de alegria e há momentos muito divertidos.
É uma história universal que mostra a importância de termos um sonho e de acreditarmos nele
O que gostava que o público retirasse deste espetáculo e aprendesse sobre si, não só enquanto costureiro, mas também como pessoa?
Espero que gostem tanto do espetáculo como eu adorei criá-lo e que possam levar consigo emoções fortes. É a minha história, mas é uma história universal que mostra a importância de termos um sonho e de acreditarmos nele. Se acreditarmos nos nossos sonhos, tudo se torna possível.
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