Afinal o que é ser pai nos dias de hoje? A resposta não é simples mas uma coisa é certa. É completamente diferente do que era há uns anos! "Ao fim da tarde, estamos sempre juntos. Se estiver bom tempo, vou passear com ele até ao parque, jogamos futebol, andamos de bicicleta... Depois quando chegamos a casa, dou-lhe o banho e preparo o jantar". É assim que João Brito, pai de João Bernardo de 6 anos, descreve o dia a dia que tem com o filho.
Há uns anos, este era o discurso característico de uma mãe e não o de um pai. Mas, com o passar dos anos, o pai foi ocupando um outro lugar na família e hoje está diferente. Atualmente, no conceito mais moderno de família, pai e mãe partilham as mesmas tarefas e a distinção de papéis comum há duas décadas atrás já não existe. A própria evolução natural da sociedade exigiu esta mudança e fez com que o papel do pai ganhasse uma nova configuração.
Hoje, "o pai é mais caloroso, mais apoiante, tem uma proximidade emocional com a criança, quer transmitir-lhe apreço e acompanhar o seu desenvolvimento de uma forma mais ativa". Estas são as palavras de Vítor Rodrigues, psicólogo clínico, quando questionado sobre o atual papel do pai nas famílias modernas. Um papel que, nos últimos anos, com as muitas mudanças sociais que ocorreram, se tem vindo a alterar.
Uma presença que passou a ser mais constante
Um estudo apresentado no I Congresso de Psicologia do Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA), em Lisboa, veio comprovar que, atualmente, o pai assume mais responsabilidades nas atividades do dia a dia das crianças do que há uns anos. Os investigadores do mesmo estudo afirmam que "se constata uma presença maior do pai em dimensões relativas aos cuidados, ao apoio emocional e à estimulação das crianças, tarefas nas quais o pai tradicionalmente não se envolvia".
"Alterações sociais como a profissionalização maciça do trabalho feminino, a divisão das tarefas domésticas e do cuidar dos filhos ou as novas tipologias de famílias, resultantes das separações e dos divórcios, contribuíram para esta mudança, tal como as próprias expetativas da sociedade e a crescente preocupação com o bem-estar e desenvolvimento das crianças", revela ainda o mesmo estudo.
Levada a cabo por um grupo de investigadores da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, da Universidade do Porto, a investigação abre novas perspetivas de análise. Na visão mais tradicional de família, era o pai quem assegurava o sustento económico e quem disciplinava os filhos. Nos dias que correm, a realidade é outra. "Hoje, estas funções continuam ainda a ser da responsabilidade do pai", afirma Vítor Rodrigues.
"No entanto, já são executadas, muitas vezes, em pé de igualdade com a mãe", refere ainda o psicólogo clínico. Uma opinião partilhada pelo pediatra Paulo Oom, que afirma, convictamente, que "o pai e a mãe ocupam o mesmo lugar na família, com as mesmas responsabilidades e com a mesma importância na vida da criança". Essa é, pelo menos, a tendência que se tem vindo a acentuar nos últimos amos.
Os vestígios do passado
Em pouco mais de duas décadas, muita coisa mudou no que se refere à parentalidade, à semelhança do que também ocorreu em muitos setores da sociedade. "Há 20 anos, a mulher não trabalhava e a educação cabia à mãe. O pai estava raramente presente e, quando estava, era para exercer disciplina e pôr ordem em casa. Agora, na maior parte dos casais, a educação dos filhos já é uma tarefa muito mais partilhada", confirma o especialista Paulo Oom.
Essa não foi, contudo, a única alteração. "Por um lado, a mulher adquiriu um papel na sociedade em termos profissionais que lhe roubou algum tempo e, por outro lado, os pais refrearam um pouco a sua atividade profissional de forma a poderem partilhar mais tempo com os filhos", acrescenta ainda o pediatra. No entanto, ressalva ainda que "ainda não estamos numa situação de equilíbrio completa".
Uma afirmação que vem ao encontro das conclusões do estudo apresentado no ISPA que revelou que "a mãe continua a assumir mais responsabilidades do que o pai nas atividades e tarefas quotidianas das crianças", nomeadamente no que diz respeito ao acompanhamento escolar e que "o pai é quem continua a representar o papel mais relevante, no que toca à autoridade e disciplina".
O psicólogo clínico Vítor Rodrigues explica que "estamos ainda numa fase de transição, em que as mulheres têm forçosamente de ter mais tempo para estar com as crianças quando efetivamente na realidade, não o têm e os pais continuam a ter uma herança cultural muito presente, o que faz com que estes não tenham espaço mental para acompanhar a escolaridade das crianças, para estarem com elas para brincar ou para levá-las a passear", lamenta.
Como é o pai ideal
E como deve ser o pai ideal nos tempos que correm? Certamente que já se interrogou várias vezes com essa questão ao longo deste artigo... Lançámos essa pergunta ao psicólogo clínico Vítor Rodrigues e trazemos os seus conselhos até si. De acordo com este especialista, este deve ser mais atento, mais próximo, mais flexível, brincalhão, mais apoiante e menos rígido. Talvez sejam estas as palavras que melhor caracterizam este novo papel.
De acordo com este psicólogo clínico, o atual pai deve "estar mais atento à criança, deve querer acompanhar o seu desenvolvimento e apoiá-la nas iniciativas que ela tem, de forma a que esta seja mais autónoma e criativa". Uma postura que se diferencia do papel tradicional em que o pai era muitas vezes o censor. "O pai moderno deve ser mais flexível e menos rígido", defende ainda.
"Cabe também ao pai ajudar os seus filhos a ganharem a ousadia de serem eles mesmos e incentiva-los a procurar as atividades onde eles se sentem bem e não aquelas que o pai considera serem as melhores", alerta Vítor Rodriques, lembrando que esta atitude paterna é essencial para a autoconfiança da criança, à semelhança do que também defendem outros especialistas, nacionais e internacionais.
"O pai já não é aquela pessoa que manda e que domina, é importante que ele seja alguém que proteja a criança, alguém que tenta compreender as suas opções e apoiá-la na suas decisões", acrescenta ainda. Nos tempos que correm, "é também importante que a mãe se sinta apoiada" nas suas tarefas diárias, "por vezes, excessivamente exigentes", refere Vítor Rodrigues, já que atualmente a mãe não se ocupa apenas dos filhos e da casa.
A balança de valores que norteia a ação dos pais de hoje
Tal como os pais, também as mulheres têm um percurso profissional que exige tempo e dedicação. "O pai deve estar, por isso, presente nas tarefas domésticas, desde a arrumação da casa até à preparação das refeições, passando pelos cuidados básicos com a criança que tradicionalmente cabiam à mãe, para apoiá-la e, sempre que possível, colaborar com ela na realização dessas tarefas", recomenda o psicólogo clínico.
Mas não é só aqui que os novos pais devem estar mais presentes. "O pai moderno deve estar mais próximo da criança noutras áreas, incluindo a escolaridade e as atividades de diversão, interessando-se mais pelas tarefas escolares da criança. Participando, por exemplo, mais nas reuniões com os professores e ajudando a criança a fazer os trabalhos para casa [TPC]", aconselha o psicólogo.
"Tal como é fundamental procurarem ter mais disponibilidade para que possam partilhar algum tempo diário com as crianças, para levá-las a passear ao fim do dia, para brincar e para se rirem com elas", remata Vítor Rodrigues. Esta igualdade de papéis entre mãe e pai não só é importante para dar resposta às necessidades que surgiram em consequência das mudanças sociais que se foram vivendo nos últimos anos, mas também, porque é importante para o bem-estar da criança.
"É fundamental que a criança tenha sempre presente, em todas as variáveis da sua educação, o exemplo do pai e da mãe", defende o psicólogo clínico Vítor Rodrigues. "O que está aqui em causa é um contributo equilibrado, importante para o desenvolvimento da inteligência emocional da criança", refere o autor de livros como "Constrói a tua felicidade", publicado pela editora A Esfera dos Livros.
"Quando ambos os pais estão presentes, nos vários momentos de educação da criança, ela recebe o benefício de contatar com maneiras de estar na vida diferentes que resultam das diferentes perspetivas do pai e da mãe, o que facilitará, no futuro, o seu processo de socialização", explica. "A criança que recebeu um bom exemplo de ambos os pais ao longo do seu crescimento, vai futuramente ser capaz de interagir e perceber melhor pessoas de todos os quadrantes", defende.
Os riscos do futuro
Se olharmos para o perfil de uma família de há 20 anos atrás e para o de uma família atual, as diferenças são, de facto, notórias. No entanto, os especialistas dizem que ainda não chegámos à situação ideal. Paulo Oom, pediatra, acredita que "dentro de mais alguns anos, os papéis de pai e de mãe vão estar mais equilibrados". "Pai e mãe devem ter o mesmo tempo disponível para os filhos", defende o especialista.
"Estamos a caminhar para uma família mais equilibrada", considera o pediatra. "Por um lado, a mãe vai estar mais perto do trabalho e, por outro lado, o pai vai estar mais perto do filho", afirma o especialista. Há, no entanto, alerta Paulo Oom, "um perigo evidente, o risco de a mãe se afastar demasiado da família para se dedicar mais ao trabalho e o pai continuar a dedicar-se ao seu trabalho".
Uma situação que, segundo o especialista, já se verifica, nos dias de hoje. "Já existem famílias, em que as crianças estão abandonadas, porque o pai e a mãe têm a sua carreira profissional, em primeiro lugar e, por isso, têm pouca disponibilidade para estar com os filhos", conta o pediatra. Para que as atuais famílias não caiam nesse risco, o especialista deixa alguns conselhos.
"Estar com os filhos não é uma questão de tempo mas, sim, uma questão de prioridades. Pais e mães devem estabelecê-las e, em certa altura da vida, a sua prioridade deve ser estar com os seus filhos", aconselha Paulo Oom, recomendando ainda que "é importante que os pais continuem a ter tempo para a sua vida social e para fazerem aquilo que lhes dá prazer". E é precisamente esse equilíbrio entre a profissão, a família e a atividade social, o segredo para uma família (quase) perfeita.
Texto: Sofia Santos Cardoso
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