Sou uma jovem adulta que está no auge do conhecimento das novas tecnologias e, mesmo assim, fui enganada. Não me considero uma pessoa ignorante, nem fácil de enganar, conhecendo metade das burlas da internet – mas, agora, passei a conhecer a outra metade.
Dou o meu testemunho, não escondo a minha cara e entrego a minha dignidade quando digo que fui completamente enganada por uma pessoa que se deita, todos os dias, a contar o dinheiro que fez - dinheiro que roubou e que não é conseguido com a mesma dignidade com que alguém o ganhou ao fim de muito tempo de trabalho.
Sempre me agoniei quando me falavam de “promoções imperdíveis” ou até de esquemas em pirâmide. Tudo isto não deixa de ser uma maneira de enganar as pessoas. Mas é uma maneira mais digna, mais legal e menos óbvia de ganhar dinheiro fácil e rapidamente.
Quase tudo o que te enriquece rápido é mentira. Menos as burlas da internet. Porque a verdade é que este é o único esquema em que enriqueces mais rápido do que a rapidez com que alguém tenta cancelar o seu cartão de crédito depois de ser burlado.
Pergunto-me quantas famílias é que vão ficar sem comida na mesa por causa de uma pessoa, por causa de um esquema e por causa da maldade da humanidade. Porque eu não fui enganada por uma simples pessoa. Eu fui enganada por todo um grupo de pessoas que sabiam o que estavam a fazer. Que sabiam que uma percentagem da maldade no mundo lhes pertence e que sabiam e conheciam muito bem o seu público-alvo. Porque elas estudaram provavelmente mais sobre o comportamento humano do que eu, num ano inteiro de marketing.
Estas pessoas parecem saber mais de pessoas do que os meus professores, que lideravam palestras para centenas de alunos. Qualquer dia despedem estes docentes para porem à frente dos alunos os “cabecilhas” destas burlas.
Reforço a crença de que o mal da humanidade é a humanidade - contagiosa e com um risco de contágio mais rápido que a covid. Tenho medo da população que dorme descansada, todas as noites, sabendo que consegue ganhar mais dinheiro a burlar do que a registar produtos na caixa do supermercado da esquina.
Eu cliquei num link que me foi enviado por uma pessoa que na sua foto de perfil aparecia com uma criança ao colo. E eu cliquei neste link porque me esqueci do que as pessoas são capazes e porque acreditei, por meros segundos, que supostamente dominava as tecnologias e ninguém me conseguia enganar.
O dinheiro que me custou a ganhar, o dinheiro que me foi dado em datas festivas ou o dinheiro que os meus pais me ofereciam todos os meses estava agora exposto à maldade de uma rede de pessoas que se ia deitar mais feliz (e rica) do que ontem e menos do que amanhã.
A minha sorte foi o facto de a minha ingenuidade ser temporária. A minha sorte é relembrar-me, muitas vezes, que o mundo tem pessoas más. A minha sorte foi a sorte. E fui a tempo de cancelar o cartão, de denunciar a pessoa que me tentou enganar e de conseguir proteger o meu dinheiro.
Sou alguém que “supostamente” domina tudo aquilo que envolve as tecnologias, a internet e os aparelhos móveis. Mas e as pessoas que se esquecem que há maldade no mundo, ansiando por quem queira comprar o seu móvel usado? As pessoas que desconhecem estas burlas digitais e que, precisando de todos os escassos euros que têm nas contas bancárias, vão clicar naquilo que parece um inocente link? O que será destas pessoas amanhã, depois de amanhã e depois de um depois de amanhã?
Sou só mais uma pessoa que foi enganada, assumindo a probabilidade de, no futuro, voltar a cair numa burla semelhante; porque acredito que pode haver sempre um bom motivo que justifique a maldade das pessoas – um filho por alimentar, uma doença por tratar, um medicamento por comprar.
É isto que me deixa, cada vez mais, a temer a humanidade. Tenho medo das pessoas e sou uma pessoa. Tenho medo. E o medo tem medo das pessoas.
Quantas pessoas é que vão continuar a ser enganadas, quantas pessoas é que vão deixar de ser aquilo que nós mais temos de precioso: a ingenuidade? Quantas pessoas é que vão continuar a ter medo do futuro? E quantas pessoas é que vão continuar a acreditar que, no meio de tanta maldade no mundo, toda ela tem bondade por trás?...
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