No seu mais recente relatório periódico, divulgado na quinta-feira, sobre a aplicação em Portugal da Convenção dos Direitos das Crianças, o comité das Nações Unidas para os Direitos das Crianças destaca que a Lei de Proteção de Crianças e Menores dá preferência às medidas de proteção em meio natural de vida, ou seja, com elementos da família, para as crianças a partir dos seis anos.
Por outro lado, mostra preocupação pelo facto de a institucionalização continuar muito difundida, incluindo para crianças com menos de três anos “e por razões atribuídas a pobreza ou deficiência”.
Portugal “deve garantir que as políticas e práticas são guiadas pelo princípio de que a pobreza material ou financeira – ou condições diretas e unicamente atribuídas à pobreza – nunca podem ser a única justificação para retirar uma criança dos cuidados parentais, para receber uma criança em cuidados alternativos ou para prevenir a reintegração social de uma criança”, refere o comité.
O relatório defende que Portugal adote uma estratégia de desinstitucionalização geral e garanta a existência de famílias de acolhimento por todo o país, e tome todas as medidas necessárias para evitar a retirada de crianças da família, desde logo garantindo os apoios adequados para os pais e famílias vulneráveis, para que as crianças com mais de seis anos estejam numa família de acolhimento e nunca numa instituição.
Ainda em matéria de pobreza, o comité diz estar preocupado com as “persistentes desigualdades salariais” e com as elevadas taxas de risco de pobreza e taxas de pobreza efetiva entre as crianças, sobretudo as que vivem em habitações não convencionais, as das comunidades ciganas e afrodescendentes.
Por outro lado, sugere que Portugal avalie o impacto das políticas de austeridade aplicadas no período 2011-2014 nos direitos das crianças.
No seu relatório, o comité insta o país a alterar a sua legislação e retirar “todas as exceções que permitem o casamento antes dos 18 anos”, aumentar o número de casas abrigo para crianças vítimas de violência doméstica, abuso ou negligência e garantir a “completa proibição dos castigos corporais, por muito leves, seja nas famílias, na lei ou na prática”. Recomenda também que a idade mínima para assistir a touradas seja 18 anos.
Pede que Portugal garanta que todos os profissionais que trabalhem com crianças, em particular os assistentes sociais, polícias, profissionais de saúde, entre outros, tenham formação obrigatória sobre direitos das crianças e quer ver o superior interesse das crianças refletido em todas as legislações e políticas.
O comité das Nações Unidas para os Direitos das Crianças disse ainda estar preocupado por Portugal continuar sem uma Estratégia Nacional para as Crianças, e critica os “atrasos desnecessários” na aprovação, apontando que põe em causa a monitorização da aplicação da convenção.
Segundo dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o número total de noivas e noivos ainda crianças deve rondar os 765 milhões. As raparigas continuam a ser as mais afetadas por este flagelo: cerca de uma em cada cinco mulheres jovens com idades entre os 20 e os 24 anos, foram casadas antes dos 18 anos, em comparação com um em cada 30 rapazes.
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