A realidade é contada por Maria von Känel, presidente da Rede de Associações Europeias de Famílias LGBT (NELFA, na sigla em inglês), que está em Portugal, juntamente com a mulher e os dois filhos, para participar no quarto encontro europeu de famílias arco-íris, ou seja, famílias onde há, pelo menos, uma pessoa Lésbica, Gay, Bissexual ou Transgénero (LGBT).

Em entrevista à agência Lusa, explicou que para além do facto de este encontro trazer a possibilidade de confraternização entre pais e filhos, há um outro propósito: “Mostrar à sociedade civil que nós somos parte da sociedade e que as famílias com pais do mesmo sexo existem em todo o lado, independentemente do país. Não há como ignorar”.

Na opinião da responsável, esta é uma oportunidade para as famílias se encontrarem e perceberem que existem diferentes situações legais, dependendo do país onde vivem.

“Por exemplo, em Portugal ainda não há um reconhecimento legal para as famílias arco-íris, enquanto na Eslovénia existe, aceitam e reconhecem a adoção por parte destas famílias, tal como acontece na Finlândia, Dinamarca ou Reino Unido”, apontou Maria von Känel.

De acordo com a presidente da NELFA, dentro da Europa existem 12 Estados membros que reconhecem a adoção plena, enquanto outros 15 aceitam a co-adoção e 24 permitem o acesso à procriação medicamente assistida (PMA).

Maria von Känel deu como exemplo a realidade na Suíça, o seu país de origem, onde é permitido o casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas onde as famílias LGBT ainda não são reconhecidas.

“As nossas duas crianças cresceram com duas mães, mas legalmente só estão protegidas com uma e isso significa que se a minha companheira morrer ou se nos divorciarmos, as crianças não têm a mesma segurança”, sublinhou.

A responsável refere que se trata de direitos humanos básicos e que, por isso, alguém tem de se manifestar, “alguém tem de dizer que isto que estão a fazer é inaceitável”.

Mas os problemas não terminam aqui e Maria von Känel lembra que há um direito fundamental que está em causa e em relação ao qual a Europa tem responsabilidade e que tem a ver com a liberdade de circulação.

“As famílias circulam na Europa e portanto existe a possibilidade de alguém da Suécia vir para Portugal porque trabalha numa empresa. E o que é que isso significa? A empresa aceita, vão tratá-la como uma família”, questiona, sublinhando que se trata de “um assunto sério” e que as famílias não são todas tratadas da mesma maneira.

Com isto, Maria sublinha que não está a defender que se obrigue os países a reconhecerem legalmente estas famílias, mas que fique definido “que se uma família atravessa as fronteiras, as crianças não devem perder os seus pais”.

“A primeira coisa que as autoridades europeias deviam fazer era reconhecer estas famílias porque esta é a coisa mais importante para os interesses das crianças. Deviam ter a força de dizer que nenhuma família devia passar a fronteira e perder os seus direitos familiares. Isto é uma coisa que eles podiam fazer agora”, apontou.

Sobre os interesses das crianças, ressalvou, por um lado, que a história mostra que estas famílias sempre existiram e, por outro, que o que é importante para os menores é que tenham uma relação de qualidade com os pais, onde haja alguém que cuide delas e lhes dê amor.

O quarto encontro europeu de famílias arco-íris, que decorre pela primeira vez em Portugal, começa hoje e prolonga-se até domingo.