O coletivo de juízes do Tribunal de São João Novo considerou provado que o casal vendeu os quatro filhos, confirmando, assim, a acusação do Ministério Público que imputava os crimes de tráfico de seres humanos e falsificação agravada de documentos.
Nesse sentido, o coletivo decretou penas de prisão efetivas de cinco anos e oito meses para o homem, de 46 anos, e de nove anos para a mulher, de 42.
Os arguidos eram residentes na área do Porto e Vila do Conde, com profissão de pasteleira e construtor, ela de nacionalidade estrangeira e ele portuguesa.
No despacho de acusação, o Ministério Público considerou indiciado que o arguido e a arguida, "que mantinham entre si uma relação amorosa", decidiram gerar filhos e vendê-los a casais que neles estavam interessados.
Segundo a acusação, divulgada em fevereiro pela Procuradoria do Porto, os dois arguidos levaram o plano à prática entre 2011 e 2017, “gerando três filhas e um filho, que entregaram a três casais, a troco do montante global de 89.000 euros”.
Durante a leitura do acórdão, o juiz afirmou hoje que ficou constatado, com base em fotografias e escutas, que o casal mantinha “uma relação extraconjugal pautada por uma vinculação afetiva mútua” e que a presença do homem era “constante e comum” na vida da mulher.
O “'modus operandi' da arguida foi sempre igual”, assegurou o juiz, acrescentando que a mesma recorria a ‘sites’ dizendo que tinha uma criança para vender e que assegurava que recebia “a sua contrapartida antes de a criança nascer e depois do parto”.
Após o nascimento, a criança era registada civilmente, atribuindo-se a maternidade à mulher e a paternidade a um dos elementos do casal adquirente, sendo que, posteriormente, a arguida e o pai registal celebravam entre si um acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, ficando este com o exercício exclusivo das responsabilidades.
“A arguida pouco se importou quem era a pessoa com quem estava a falar, desde que a contrapartida fosse superior a determinada quantia”, referiu o juiz, considerando a atitude “cruel”.
“Não havendo dúvidas quanto à atuação” da mulher, que já era incidente e cometera o primeiro crime enquanto cumpria uma pena suspensa na sua execução, o tribunal considerou também que o homem “congeminou todo este plano” e que ia “vigiando à distância, pronto a intervir a qualquer momento”.
“Desde o momento da conceção [dos filhos], os arguidos focaram-se em obter enriquecimento económico. Reduzindo os filhos a meros objetos, como se de transações se tratassem e entregando-os à própria sorte”, disse o juiz, ainda antes de decretar as penas.
Aquando da detenção do casal, em dezembro de 2018, o diretor da Polícia Judiciária do Norte, Norberto Martins, indicou que as quatro crianças, com idades entre 1 e 7 anos, tinham sido vendidas a cidadãos europeus, entre os quais se encontravam portugueses.
Ao contrário do homem, a mulher pediu a instrução do processo, na tentativa de evitar a ida a julgamento, mas acabou pronunciada, a 27 de fevereiro, nos termos da acusação, segundo uma fonte então contactada pela Lusa.
O julgamento decorreu à porta fechada, uma vez que o número 3 do artigo 87.º do Código do Processo Penal determina que "em caso de processo por crime de tráfico de pessoas ou contra a liberdade e autodeterminação sexual, os atos processuais decorrem, em regra, com exclusão da publicidade".
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