O sono saudável ajuda a manter a pressão arterial estável e a regular o açúcar no sangue, essencial para reduzir a incidência de diabetes gestacionais.
Por outro lado, um sono sem a duração e qualidade necessárias impacta no sistema imunitário, o que pode comprometer a saúde materno-fetal: aumenta o risco de pré-eclâmpsia, de trabalho de parto prolongado, parto por cesariana, parto pré-termo e baixo peso no recém-nascido.
Pode mesmo predizer problemas de sono e choro aumentado no bebé, que é das queixas mais frequentes dos pais em consulta, a par da depressão pós-parto.
Sabe-se que cerca de 50% das grávidas têm queixas de insónia, ou seja, dificuldade em adormecer e/ou manter-se a dormir de noite. Os responsáveis são as flutuações hormonais, mudanças corporais que implicam desconforto físico e a ansiedade/excitação relativas à gravidez, ao parto e à maternidade.
No 1º trimestre, com a elevação rápida da progesterona, as queixas passam muito por fadiga e sonolência aumentada. Apesar da grávida se deitar mais cedo pelo avanço de fase do sono, os acordares noturnos para ir à casa de banho e, de dia, as náuseas, vómitos e outros desconfortos físicos, drenam-lhe a energia habitual.
Contudo, esta desaceleração forçada até pode, na realidade, ser protetora da própria gravidez, se permitir que a grávida se foque no seu auto-cuidado e nos meses que tem pela frente.
O 2º trimestre traz alguma acalmia
Os enjoos tendem a melhorar e já não há tantas visitas à casa de banho porque o útero já não pressiona tanto a bexiga. Apesar de novos desconfortos (cãibras nas pernas, dores na zona lombar), a grávida volta a sentir mais vitalidade e sente que o seu sono é mais reparador, apesar de começar a ter sonhos vívidos.
É uma boa altura para a grávida dormir bem e “armazenar” energia para as etapas que se seguem. Pelas 20 semanas começa a sentir o bebé, o que o torna cada vez mais real e isto traz tanto de alegria como de preocupação pelo seu bem-estar.
O 3º trimestre volta a desafiar o sono
O crescimento do feto provoca um aumento de peso na grávida e pressiona órgãos e músculos, o que causa insónia e faz surgir outras perturbações do sono. O tamanho da barriga dificulta uma posição confortável para dormir e, tanto a pressão sobre a bexiga, como os movimentos do bebé, podem acordar a mãe adormecida.
Paralelamente, o aumento de peso promove o ressonar e até pausas na respiração no sono (apneias); podem surgir sensações desagradáveis nas pernas que interferem com o sono (síndrome das pernas inquietas, cãibras) e até refluxo gastroesofágico.
Este “mau sono” poderá também associar-se a sintomas depressivos e a ansiedade pela proximidade do parto e à mudança de vida no pós-parto, o que contribui para pesadelos frequentes sobre o bebé e circunstâncias associadas.
Mas não há que desanimar; há formas de atenuar estes incómodos para que a grávida viva melhor este “estado de graça” e consiga um sono de maior qualidade:
- Boa higiene do sono (horários regulares de sono e exercício físico, sesta curta se sono diurno excessivo, hidratação de dia, mas redução de líquidos à noite...);
- Nas náuseas, fazer várias refeições ligeiras e ter bolachas de água e sal na mesa de cabeceira;
- Evitar cafeína, comida picante e refeições pesadas perto do deitar para impedir o refluxo;
- Relaxar antes de deitar: banho quente, massagem nas pernas, meditação, relaxamento...
- Dormir virada para o lado esquerdo com as pernas ligeiramente curvadas facilita a circulação sanguínea e o envio de oxigénio e nutrientes para o feto; umas almofadas debaixo da barriga ou entre as pernas podem também ajudar;
- Em caso de refluxo frequente, pernas inquietas e apneia do sono, deve consultar um médico, preferencialmente especializado em sono; no caso de insónia ou pesadelos frequentes, procurar um psicólogo com formação em sono é a melhor opção, pois esta intervenção não é farmacológica;
- Aproveitar para, ainda na gravidez, consultar um especialista em sono para perceber como funciona o sono do recém-nascido e como garantir bons hábitos de sono desde o início;
- Obedecer aos ritmos do corpo e da mente: aceitar que o ritmo de vida mudou e que é importante fazer atividades que promovam bem-estar, pois a saúde mental é essencial para uma boa gravidez e um pós-parto saudável. Se surgirem sintomas ansiosos ou depressivos, é essencial consultarem um profissional de saúde mental com formação na área perinatal.
Vemos assim que o sono saudável na gravidez é determinante para uma boa gestação e para o saudável desenvolvimento fetal, bem como para gerir o melhor possível a privação de sono expectável depois do bebé nascer.
Texto: Mafalda Leitão - Psicóloga especialista em Psicologia Clínica e da Saúde e Psicoterapeuta; Pós-Graduada em Ciências do Sono; Coordenadora do Núcleo de Perturbações do Sono; Psicóloga na Consulta do Prematuro - PIN - em todas as fases da vida
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