Ora é um ilustre que reclama do barulho que elas fazem nos restaurantes, ou uma blogger que se incomoda com a areia que elas espalham na praia, ou qualquer outra pessoa que garante que, mal tenha filhos, evitará a sua presença em locais públicos onde possam incomodar terceiros.
Eu tenho uma opinião muito clara quanto a isto. Mas, antes de a apresentar, quero adiantar que, apesar de ter quatro filhos, não acho que todas as crianças sejam maravilhosas. Aliás, nem acho que as minhas o sejam sempre, a bem da verdade. Há crianças chatas, birrentas e tão incomodativas que, de facto, se tornam a pior das companhias – mesmo que a dez metros de distância.
Acontece que o mesmo se aplica aos adultos.
É verdade que, quando vamos a um restaurante com o objetivo de aproveitar um momento de paz, nos apetece tudo menos ouvir a birra da criancinha da mesa ao lado, que se atira para o chão por não gostar da comida. Mas, quando vou jantar fora, incomoda-me igualmente o adulto abusador que, para além de falar tão alto que se ouve em todo o recinto, insiste em atirar o fumo do charuto para cima de mim ou em chupar os caracóis com tal afinco que mais parece estar a fazer uma verdadeira intervenção de salvamento.
Também é verdade que, quando vou à praia e acabo de me estender na toalha impecavelmente esticada e limpa, não gosto quando as crianças passam por mim a correr, enchendo-me de areia que se cola ao meu corpo molhado. Mas irrita-me igualmente aquele adulto que, mesmo num areal vazio, insiste em montar o estaminé a dois centímetros do meu nariz, encaixando o barril de vinho junto aos meus chinelos e colocando em alto som o tijolo com música pimba que, acredita ele, dá outro ambiente à coisa. Isto sem esquecer os casalinhos que, mesmo ao meu lado, tentam recriar o ambiente do filme “Nove Semanas e Meia” ou a mãe que, vendo o filho a correr em direção ao mar, grita histericamente um “Jean Pierre, vien ici ou levas porrada!”.
Isto já para não falar naquelas criancinhas que, no meio do corredor de frescos do supermercado, resolvem gritar como se estivessem a ser depenadas apenas porque a mãezinha não lhes compra um gelado. Mas convenhamos que ainda gosto menos do adulto chico-esperto que me tenta passar à frente na fila da caixa ou que acredita que uma ida ao supermercado é um verdadeiro momento cultural, provocando trânsito nos corredores mais estreitos apenas porque observa cada embalagem de detergente como se estivesse a admirar uma Mona Lisa.
Conforme comecei por dizer, eu não acho que todas as crianças sejam maravilhosas. E muito menos o achava antes de ter filhos. Os miúdos chatos incomodavam-me e eu achava as crianças muito queridas e fofas, mas desde que na casa dos outros. Digamos, então, que o verdadeiro instinto maternal apenas me apareceu depois de engravidar da minha primeira filha. Tive, por isso mesmo, a certeza de que não quereria que os meus filhos fossem para os outros aquilo que muitos eram para mim: um incómodo, em determinados momentos.
Poderão as minhas palavras dar a entender que, assim sendo, os meus filhos raramente me acompanham nos momentos sociais – o que não podia estar mais longe da verdade. Pelo contrário, sempre acreditei que, para habituar uma criança a qualquer ambiente, é necessário expô-la a diversas situações e educá-la a saber estar. Sempre fui jantar fora, ao cinema, ao teatro, às compras e a espaços públicos com os meus filhos e raramente passei vergonhas por isso.
A regra é uma: se eles querem ir, têm se portar bem. Não cedo a pedinchices nos supermercados, não permito escândalos nos restaurantes e não aceito que, na praia, andem a espalhar areia fora do nosso diâmetro de presença. Caso a coisa descambe, a tática é sempre a mesma: pego no miúdo, levo-o para longe e só regressamos depois de conversarmos e de ele se ter acalmado. O filho é meu e, como tal, é também minha a responsabilidade de o educar e de levar com as suas crises de humor.
E isto, sim, irrita-me: ver uma criança a espernear – coisa que é “normal” em todos os seres menores de 18 (e, infelizmente, comum em muitos outros com idade para já terem juízo…) – e os pais continuarem impávidos e serenos, ignorando a birra do infante e permitindo que todos os vizinhos inocentes levem com tal intempérie emocional.
É claro que há crianças malcriadas, insubordinadas e irritantes. Mas continuo a acreditar que, na maior parte dos casos, a culpa última não é delas, mas antes dos pais que não sabem colocar limites. É óbvio que é normal que uma criança de colo chore e esperneie. Mas, sinceramente, não me parece tão normal assim que um reguila de 13 anos incomode o meu calmo jantar com uma Playstation que, aos altos berros na mesa ao lado, permite que os pais tenham, finalmente, uma refeição em paz e sossego. É, como em tudo na vida, uma questão de perspetiva. O que me parece é que este mau comportamento infantil de que tantos reclamam advém muitas vezes da falta de punho dos próprios reclamantes. Pode não ser nos primeiros anos de vida dos miúdos, pode ser um processo demorado e difícil, mas a educação faz-se com a insistência nas regras de disciplina. O problema é que, e como já se dizia num antiquíssimo filme português, a maioria dos adultos “não está pardá-las”.
Alda Benamor
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