Não se trata apenas de ter quatro filhos. Trata-se, sobretudo, acredito eu, de ter quatro filhos com idades muito próximas. Lembro-me que, quando os gémeos eram ainda recém-nascidos, eu passeava diariamente com um carrinho duplo e duas meninas pequenas de cada lado. Elas tinham três e quatro anos, acabados de fazer. As pessoas olhavam, claro, e não eram poucas as que nos abordavam diretamente. Se, por um lado, todos temos uma curiosidade imensa em ver dois seres iguais, por outro, parece que quase existe também um sentimento macabro em relação a pessoas com “muitos” filhos. Macabro, sim, porque, mais do que palavras de conforto, eu ouvia comentários de verdadeiro desalento. O mais absurdo de todos foi quando
uma senhora, do alto da sua maturidade cinquentona, me perguntou se já tinha laqueado as trompas. Aproveitei a ainda proeminente barriga pós-parto para a esfregar quase que eroticamente e responder: “não… primeiro vou ter de parir mais estes três que nascem no final do ano!”.

Ter quatro filhos, tal como ter dois ou 10, não é obviamente tarefa fácil. Começando pelo que isso implica financeiramente (sim, um filho sai caro!), pelas alterações logísticas (gostava de ver alguém enfiar quatro cadeirinhas de bebé num carro citadino) e, sobretudo, pelo que isso exige dos pais, física e psicologicamente. No outro dia fiz as contas e percebi que estive dois anos a dar de mamar – ou seja, estive dois anos praticamente sem dormir (e isto sem contar as infindáveis madrugadas que dediquei a insónias, birras, lençóis vomitados e mudas de roupas aromatizadas a diarreia).

Não nos podemos esquecer ainda do que significa ter quatro crianças na escola: não são apenas os manuais e o material escolar. É muito mais do que isso: o ir pôr as mais velhas a uma escola e os gémeos a outra, o ter de os ir buscar em horários diferentes, o tentar acompanhar os trabalhos de casa de anos escolares totalmente distintos. “Como raio é que tu ainda não sabes que C mais A se lê CA, se a tua irmã já está a estudar aritmética?”.

A verdade é que damos nas vistas. Agora se calhar menos do que há uns anos, que eles já medem os quatro mais de um metro e 20. Mas ainda nos encaram como “muitos”. Fazemos barulho, ocupamos espaço, marcamos uma mancha de gente que obriga qualquer pessoa a desviar-se para a estrada, de maneira a que nós os cinco, sempre de mãos dadas, consigamos prosseguir calmamente a marcha no passeio.

Os meus filhos pedem-me mais irmãos. Curioso, não é? Mesmo com o reboliço que é a nossa casa e com as discussões e brigas que marcam cada um dos nossos dias, estas quatro criaturas querem (pelo menos!) mais um irmão. Eles pedem um menino, para jogar à bola, elas sonham como uma menina. “Porque dão menos trabalho, mãe…”.

E eu? Apesar da ginástica orçamental que faço invariavelmente todos os meses; da agenda que parece esticar para articular tudo dentro de cada dia; dos momentos em que, exausta, me apetecia pegar nos quatro e congelá-los apenas por umas horas, também sonho com isso. Com o dia em que aqueles oito bracinhos se estiquem para acariciar mais um minúsculo membro da família.

Enquanto este desejo não se torna projeto, e talvez como forma de mentalização, vou recordando os momentos em que ter “muitos” filhos é, realmente,

a coisa mais maravilhosa do mundo.

(Como o dia em que, em plena sessão de cinema, uns senhores sentados ao nosso lado estavam mais concentrados nos meus filhos que no filme. Até ao momento em que um dos mais novos, na altura com uns dois anos, olhou para mim e interrompeu a concentração de todos com um sonoro: “oh mãe, eu acho que tenho a pilinha a arder!”).

Alda Benamor

 

Licenciada e consultora em Comunicação Empresarial, é mãe de quatro crianças. Os filhos dizem-lhe que é a melhor do mundo, mas que não conhecem mais nenhuma mãe que seja assim “tão extrovertida”. Ela reconhece o papel, assumindo que isso afasta, por enquanto, potenciais genros e noras que queiram aparecer para jantar.