Há 30 anos, o mundo não estava preparado para tamanha afronta. Madonna, numa fase de consolidação da carreira internacional, sabia disso e esticou a corda ao máximo. Em Toronto, no Canadá, as autoridades chegaram mesmo a ameaçar prender a cantora norte-americana, caso ela insistisse em simular um ato masturbatório que roçava o sexo explícito em palco enquanto cantava uma versão exótica de "Like a virgin", um dos seus maiores sucessos. A artista não se deixou intimidar.
Depois de ter perdido o patrocínio da Pepsi, que temeu os apelos de boicote às bebidas da marca que começaram a ser feitos por muitas organizações incomodadas com a exploração dos símbolos religiosos no vídeo de "Like a prayer", o primeiro single do álbum homónimo que a digressão iria promover, Madonna, na altura com 31 anos, estava apostada em triunfar e investiu todos os esforços naquela que, ainda hoje, é considerada uma das suas melhores digressões.
Para além de contratar alguns dos maiores músicos, coreógrafos e bailarinos da época, recrutou Jean Paul Gaultier para os figurinos. O exótico criador de moda francês pegou nos sutiãs cónicos que tinha confecionado para Nana, o urso de peluche que tinha desde criança porque os pais nunca lhe permitiram ter uma boneca, redesenhou-os e apresentou-os à cantora. Madonna ficou fascinada com a criação e, só nessa digressão, incorporou-os em quatro indumentárias de palco diferentes. No dia 13 de abril de 1990, a artista estreava a digressão "Blond ambition world tour", a terceira da sua carreira, em Chiba, no Japão.
A utilização de símbolos religiosos e a encenação de uma masturbação em palco causaram (muita) polémica. O papa João Paulo II chegou a pedir aos católicos para não irem ver o concerto. Um representante de uma organização cristã classificou-o como "um dos espetáculos mais satânicos da história da humanidade". Mais de 800.000 fãs da artista ignoraram as críticas. Na altura, as 57 atuações geraram quase 63 milhões de dólares, mais de 57 milhões de euros, de receitas.
Aos valores de hoje, seriam cerca de 123 milhões de dólares, quase 113 milhões de euros. "Esta digressão não ofende os sentimentos de ninguém. É para mentes abertas e leva [as pessoas] a olhar para a sexualidade de uma forma diferente", afirmou a cantora numa conferência de imprensa improvisada num dos aeroportos de Roma, em Itália. A tournée inspirou o aclamado documentário "Madonna: Truth or dare", que fora da América do Norte seria rebatizado "In Bed with Madonna".
Em 1990, a "Blond ambition world tour" foi considerada a produção de palco mais criativa na cerimónia de entrega dos prestigiados prémios Pollstar Concert Industry Awards. O espetáculo dado em Gotemburgo, na Suécia, foi visto por 55.000 espetadores, uma das maiores audiências da época. "Essa digressão mudou o panorama da cultura pop", escreveu a revista People. Em setembro do ano passado, Madonna regressou aos palcos com a "Madame X tour", a mais acidentada da sua carreira.
Comentários