Retratos Contados: Conheceste os teus bisavós?
F.F.: Não, não tive a sorte de conhecer os meus bisavós.
R.C.: Então e que histórias relacionadas com bisavós? Ouviste algumas histórias ao longo da vossa vida?
F.F.: Não… Eu lembro-me de ouvir algumas, mas agora assim de repente não me lembro assim de nenhuma que me tivesse marcado.
R.C.: E em relação aos avós?
F.F.: Eu tive a sorte de crescer com os meus avós, não só conhecer mas, conviver crescer e ser educado também pelos meus avós.
R.C.: Pelos quatro?
F.F.: Pelos quatro, sim. Lembro-me que os avós tanto do lado do pai como da mãe fizeram sempre muito parte da minha vida. Obviamente, tive uma relação muito especial com a minha avó materna, a avó Delfina a quem eu dedico o Fado da Sina, e que foi uma avó que basicamente gostava de cantar fado e que me influenciou bastante a nível musical. Mas, lá está, aquilo que os meus avós me ensinaram perdura até hoje, independentemente de hoje já só ter vivo o meu avô da parte do pai.
R.C.: O facto da tua avó Delfina gostar muito de cantar fado é como se tivesse passado essa herança?
F.F.: É herança mesmo, a minha mãe adora cantar também, e a minha avó materna adorava cantar, portanto acabou por passar bastante. E o meu pai também, teve uma banda quando era novo, a título de amizades, claro, aquelas bandas escolares! Mas portanto a música sempre fez parte da história deles também.
R.C.: Então e como é que foi o privilégio das tuas avós, terem-te visto em palco ao longo do tempo? Assistiram ao evoluir da tua carreira?
F.F.: No meu caso, os meus avós paternos acompanharam muito mais o meu percurso, até porque a minha avó paterna só nos deixou há 2 anos atrás e o meu avô paterno ainda é vivo, acompanharam muito mais o meu percurso e se calhar inicialmente nunca acharam que a coisa iria ganhar as proporções que depois ganhou, e ficaram obviamente muito felizes por perceber que sim, que eu era uma pessoa realizada naquilo que gostava de fazer. Curiosamente, a avó que mais me marca a nível artístico é aquela que não assiste sequer ao ‘’Bravo, Bravíssimo’’ quando eu tinha 11 anos e cantei o fado “Gaivota” e que posso considerar como o primeiro momento em que estava a fazer alguma coisa a nível musical. Curiosamente, é a figura que quando eu entro em palco se calhar mais me lembro e mais penso, até mais do que os meus pais ou que outra pessoa qualquer, ou que as minhas referências, a minha avó Delfina está sempre muito presente.
R.C.: Como se estivesse a olhar por ti!?
F.F.: Como se estivesse a olhar por mim, como se estivesse um bocadinho sempre atrás daquilo que eu faço, ou à frente daquilo que eu faço.
R.C.: Como um anjo da guarda?
F.F.: Sim, acho que sim. Gosto de pensar nisso, e acho realmente que a minha avó me marcou bastante e a influência que ela tem sobre aquilo que eu faço é enorme. E é muito interessante pensar nisso, pensar que ela nem sequer assistiu em vida àquilo que eu comecei a fazer.
R.C.: Tens muitas saudades dessa avó?
F.F.: Muitas saudades, aliás, tenho saudades dos meus avós que já não estão cá, como tenho saudades das pessoas de que eu gosto e que fazem parte da minha família e que já não estão aqui. Mas sim, fazem-me muita falta.
R.C.: E há algumas histórias que os teus avós te contavam da infância deles, ou da vida deles que vos marcaram?
F.F.: Acima de tudo, as histórias que os meus avós me mais me marcaram foi o facto de, por exemplo, a minha avó paterna era modista e portanto conta-me histórias muito engraçadas das senhoras daquela altura que iam experimentar e provar as roupas, e lembro-me de algumas histórias engraçadas que ela me contava, porque ainda por cima ela era modista em casa, portanto a casa onde eu também cresci da minha avó materna tinha muitas histórias para contar e havia aquela caixa de costura da Singer que ainda hoje lá está e que é uma relíquia para a nossa família, e que simboliza também muito a história da minha avó. E depois por outro lado, pensar nos meus avós paternos que eram pessoas do campo, pessoas muito humildes de origens muito modestas porque não havia muito dinheiro, havia muito trabalho e pouco dinheiro, e viviam daquilo que a terra dava e obviamente de muito trabalho de sol a sol. E também, obviamente algumas histórias de tempos em que a mentalidade era muito, muito mais fechada, e ainda por cima num ambiente rural.
R.C.: Qual é que a melhor herança que os teus avós te deixaram?
F.F.: A herança dos afectos que eu acho que é a herança mais importante para qualquer coisa que se faça nesta vida, quer a nível profissional, quer a nível humano. Os meus avós, tanto do lado do pai como da minha mãe, ensinaram-me a amar, mostrando isso, tocando nas pessoas, abraçando-as, e ganhando o respeito obviamente pelo toque, pelo afecto, e não aquela coisa à distância de dizer “gosto muito de ti”.
R.C.: Como é que achas que estão a ser tratados os idosos em Portugal hoje em dia?
F.F.: Na minha opinião, acho que são tratados como não deveriam ser no sentido em que se acha que os idosos são a fase final da vida, e aborrece-me muito pensar que os idosos são uma fase final do que quer que seja. Porque ser idoso é simplesmente uma nova fase da tua vida, quando tu atinges uma idade como os 70, ou os 80 anos, não estás no final de nada, está simplesmente numa nova fase da tua vida assim como deveria ser respeitado pelo facto de fazeres 30, ou 40, ou 50 anos. E sente-se a todos os níveis, a nível económico, a nível de acharmos que são pessoas mais velhas que acabam por prejudicar, a história das reformas, e a história da Segurança Social, e não podemos obviamente pensar nisso, até porque estamos a falar das pessoas que se hoje em dia temos o país que temos, e a liberdade que temos, e as coisas que conseguimos ter é a custa de muito trabalho, e trabalho muito mal remunerado que aconteceu durante anos, e anos, e anos.
Comentários