Amália da Piedade Rebordão Rodrigues terá nascido a 23 de julho de 1920, em Lisboa. "Nunca a família soube ao certo o dia do nascimento. Nem a mãe, Laurinda, alguma vez se lembrou. Recordava-se que tinha sido em junho de 1920", garante o antigo jornalista Manuel Catarino na obra  "Amália - Segredos, episódios e excentricidades", a biografia da fadista que publicou em setembro de 2019. Na dúvida, a intérprete de "Com que voz" elegeu, desde cedo, o dia 1 de julho como data do seu aniversário.

1. Foi criada pelos avós maternos

Amália Rodrigues tinha 14 meses quando os pais a deixaram com os avós maternos para virem para Lisboa à procura de melhores condições de vida. Só os voltaria a ver quase quatro anos depois. A fadista era filha de Albertino de Jesus Rodrigues, um músico sapateiro natural de Castelo Branco, que, para sustentar os quatro filhos e a mulher, Laurinda da Piedade Rebordão, nascida em São Martinho, no Fundão, se mudou para a capital.

2. A avó queria que fosse bordadeira

Ana do Rosário Bento, uma mulher austera e decidida de quem Amália Rodrigues não guardaria grandes recordações, como revelaria aos mais próximos décadas depois, não tinha dúvidas. A neta iria ser bordadeira. Além de gostar de bordados, a fadista também gostava de engomar, uma das tarefas domésticas que a avó lhe ensinou desde cedo. Apesar da madrinha e da tia bordarem, a anciã prefere mandá-la para longe de casa.

3. Andava 10 quilómetros a pé por dia

Amália Rodrigues tinha 13 anos quando a avó materna a enviou para um ateliê para aprender bordadura. Para chegar àquele espaço, localizado num primeiro andar das escadinhas do Duque, que descem do largo da Misericórdia, no Chiado, em direção à estação ferroviária do Rossio, a futura fadista, que residia em Alcântara, tinha de percorrer um trajeto de cinco quilómetros a pé. Às 18h00, para regressar a casa, fazia o percurso inverso.

Todos os dias, exceto domingos e dias santos, é esta a rotina diária da filha de Albertino de Jesus Rodrigues e de Lucinda da Piedade Rebordão. Apesar de haver um carro elétrico que liga os dois destinos, a futura artista que não imagina o que o futuro lhe reserva, que não chega a ganhar 15 tostões, não se pode dar ao luxo de o apanhar. Para enganar a fome e o estômago, leva uma bucha, uma prática muito comum para a época.

4. Manuseava o ferro a carvão como poucas

Apesar de gostar de bordadura, a mestra da oficina para onde Ana do Rosário Bento enviou Amália Rodrigues pouco ou nada lhe ensina, pelo que os progressos da jovem são modestos. A situação piora quando a responsável descobre que a futura cantora era um ás do ferro de engomar. A partir daí, não lhe dá mais nada para fazer a não ser roupa para passar. A fadista não se queixa mas a avó, quando descobre, fica furiosa e insta-a a sair.

5. Trabalhou numa fábrica de guloseimas

Depois de deixar o ateliê de bordadura, Amália Rodrigues vai trabalhar para uma fábrica de doces, perto de casa. Na unidade fabril, localizada na calçada da Pampulha, a futura artista descasca marmelos e embrulha rebuçados enquanto canta. As colegas elogiam-lhe a voz e, à medida que as horas vão passando, pedem-lhe mais cantigas. Além de ser desembaraçada, é também uma das mais despachadas. Há dias em que ganha 15 tostões.

6. Um dos irmãos agrediu-a por cantar na rua

Aos 16 anos, Amália Rodrigues e a irmã Celeste Rodrigues vão trabalhar para o quiosque de um conhecido do pai, no cais da Rocha de Conde de Óbidos. Além de bordados, vendem vinho e recordações e, mais tarde, fruta, por conta própria. Com o dinheiro que ganha, a fadista passa a ir regularmente ao cinema ver filmes musicais, cantando depois algumas das canções na rua. O irmão Vicente Rodrigues, envergonhado, chega a bater-lhe.

7. Estreou-se com um vestido amarelo às riscas verdes

Amália Rodrigues, que até então se apresentava como Amália Rebordão, estreou-se como fadista na casa de fados O Retiro da Severa em julho de 1939. Na véspera da primeira apresentação pública, a mulher de Jorge Soriano, o proprietário do espaço, foi com a intérprete de "Gaivota" e "Barco negro" às compras. A escolha recaiu num vestido de manga curta, amarelo às riscas verdes, com peitilho de renda e uma gola dourada.

8. Um dos seus fados mais conhecidos foi composto por um farmacêutico

A letra de "Foi Deus", um dos fados mais populares de Amália Rodrigues, foi composta por um farmacêutico de Reguengos de Monsaraz no Alentejo. Orgulhoso da composição, que lhe saiu da alma à mesa de um café local, Alberto Janes anuncia, pouco depois, aos amigos que se prepara para viajar até Lisboa para a oferecer à fadista. A maioria, incrédula, ri-se. Dias depois, toca-lhe à porta. Ela lê o poema e aceita gravar o fado.

9. Deixou os produtores da 20th Century Fox pendurados

Em 1952, Amália Rodrigues parte à conquista da América e triunfa em toda a linha. Alguns agentes propõem-lhe gravar em inglês canções de compositores como Cole Porter, George Gershwin e Samuel Barber. A fadista recusa. Em Hollywood, também são vários os produtores de cinema que a disputam. Os executivos da 20th Century Fox acenam-lhe com um contrato milionário. A artista regressa a Lisboa sem lhes dar resposta.

10. Fred Astaire impediu que se suicidasse

Em setembro de 1984, Amália Rodrigues, adoentada, mentaliza-se que um tumor maligno na cabeça é a causa de todas as suas maleitas. Para não viver em agonia e sofrimento e para não ser encontrada morta em casa, resolve meter-se num avião para ir acabar com a vida em Nova Iorque, nos EUA. Instala-se num hotel mas, antes de ingerir um frasco de comprimidos, decide ver um dos dois filmes de Fred Astaire que levou com ela.

No fim do primeiro, a fadista, que era uma grande admiradora do ator, bailarino, coreógrafo, cantor e apresentador de televisão norte-americano, decide ver o segundo, adiando a toma dos fármacos para o dia seguinte. Na manhã a seguir, quando acorda, desce à loja do hotel e compra mais filmes com Fred Astaire. À medida que os vai vendo, um atrás do outro, desiste da morte. Meses depois, descobre que o tumor, afinal, era benigno.