As fotografias espalhadas pelos edifícios da propriedade são a prova inequívoca de que o São Lourenço do Barrocal, no Alentejo, é um espaço onde não faltam história(s) nem memória(s). Este monte alentejano, que acolhe um luxuoso retiro rural desde 2016, está na posse da mesma família há oito gerações. Em 1820, Manuel Mendes Papança, o primeiro conde de Monsaraz, adquiriu a propriedade, então um território de caça com 780 hectares pertencente à Casa de Bragança, transformando-a numa fazenda agrícola.
Para a povoar e para a rentabilizar, decidiu doar um hectar de terreno a cada um dos agricultores que se mudasse para lá, com a família, para plantar vinha. Foi nessa altura que começaram a ser construídos os edifícios que hoje abrigam a receção, o bar, os restaurantes, a loja, os quartos e as suites da requintada unidade hoteleira. Um século e meio depois, com a nacionalização que se seguiu à revolução de 25 de abril de 1974, a propriedade foi ocupada e (muito) maltratada. Só seria recuperada uma década depois.
Estava num estado lastimoso, garante quem a viu na altura. Em 2002, José António Uva, o atual proprietário, trabalhava no Reino Unido quando a recebeu de herança. Localizado a cerca de 4,5 quilómetros de Monsaraz, o monte integra sete edifícios principais e mais de uma dezena de outros, mais pequenos. Percebendo as potencialidades do espaço, o empreendedor não teve dúvidas. Iria transformá-lo num hotel de luxo, o primeiro do género na região, sem, todavia, perder a identidade e a(s) memória(s) daquele lugar. Para dar origem ao projeto, decidiu ir viver para o casebre branco que hoje serve de apoio à piscina e ao restaurante Hortelão.
Nos dois anos seguintes, enquanto delineava o conceito, falou com trabalhadores rurais, arqueólogos e historiadores. Não queria desonrar o passado do monte mas também não abdicava do conforto e da comodidade que os tempos de hoje exigem. No momento de escolher o arquiteto que iria materializar aquilo que tinha em mente, só lhe ocorreu um nome, Eduardo Souto de Moura, vencedor de vários prémios nacionais e internacionais. Foi nele que José António Uva confiou para presevar a essência de todo aquele espaço.
Manter os traços da arquitetura vernacular portuguesa existentes em São Lourenço do Barrocal, marcados pela cal na parede, pela tijoleira e pela madeira, era ponto assente. Recuperar ao máximo o que era possível também. Algumas das telhas que os hóspedes hoje observam ainda apresentam as manchas escuras que foram ganhando com o tempo. Para substituir algumas das que vão exigindo manutenção, José António Uva recorre a unidades fabris do Alentejo e do Algarve que ainda fabricam umas do mesmo género.
Depois de oito anos de desenvolvimento e de maturação do projeto e de mais dois anos de construção, a unidade hoteleira abriu, finalmente, portas em regime de soft opening em março de 2016. Os interiores, marcados por uma elegância rural e por um requinte rústico, com apontamentos contemporâneos, foram idealizados pelo atelier de conceção e criação de projetos de arquitetura, design de interiores e mobiliário lisboeta Anahory Almeida, propriedade de Felipa Almeida e de Ana Anahory, mulher de José António Uva.
São Lourenço do Barrocal vive (muito) de detalhes. Para além dos tapetes de Arraiolos com um padrão exclusivo no chão, há mármore de Estremoz nas mesas que foram desenhadas de propósito, cartas antigas, fotografias de família, ilustrações feitas à mão, utensílios de outras épocas e até objetos pessoais dos lá viveram. Alguns deles decoram a receção e as divisões das 40 unidades de alojamento do complexo hoteleiro, que integra 22 quartos, duas suites e 16 casas, além de um bar, de um spa e de dois restaurantes.
O Hortelão, mais descontraído, com um espaço coberto e com mesas corridas ao ar livre, localizado entre a piscina e a horta biológica, só está aberto entre meados de abril e meados de outubro, ao contrário do que sucede com o São Lourenço do Barrocal, mais formal. Aberto durante todo o ano, recupera as raízes profundas da tradição culinária da região, incorporando-lhe as azeitonas, o azeite, os cereais e os produtos hortícolas que são produzidos na herdade, tal como o vinho, pisado e fermentado logo ali na adega.
Os números impressionam. Para além de se gabar de ter 275 dias de sol por ano, São Lourenço do Barrocal integra 600.000 metros quadrados de olivais, alguns deles centenários, mais 150.000 metros quadrados de vinhas, 10.000 metros quadrados de horta biológica e 16 dólmenes neolíticos com 7.000 anos. É também lá que se pode admirar o segundo maior menir da Pensínsula Ibérica. Alguns hóspedes gostam de ir até lá a pé, mas a maioria prefere fazê-lo numa das bicicletas que o hotel cede gratuitamente.
Há também quem o admire em cima de um cavalo. Para além de passeios, há aulas de volteio. Para passar o tempo, são muitas as atividades disponíveis, algumas delas desenvolvidas em colaboração com parceiros locais, como é o caso da observação de estrelas, da realização de provas de vinhos e de workshops de olaria ou dos passeios de observação de aves, que podem ser feitos na propriedade ou nas margens do lago do Alqueva, onde também se pode praticar pesca desportiva ou voar de balão de ar quente.
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