De acordo com a Small Business Prices, Portugal ocupa o primeiro lugar no risco de burnout na União Europeia, sendo dos países com maior probabilidade de verificar este fenómeno e também aquele que tem uma das semanas de trabalho mais longas, com os salários mais baixos.

É neste contexto que as empresas têm agora um desafio acrescido para manter o bem-estar dos seus colaboradores. “Se cuidares bem das tuas pessoas, elas vão cuidar bem do teu negócio”, uma frase da autoria de Richard Branson, que Vanda Brito, diretora de Recursos Humanos da Kelly, utiliza para expressar a importância que uma cultura empresarial virada para o wellbeing das suas pessoas tem no mundo do trabalho nos dias de hoje.

O burnout é, segundo a American Psychological Association (APA), a exaustão física, emocional ou mental acompanhada de diminuição da motivação, diminuição do desempenho e atitudes negativas em relação a nós próprios e aos outros. Resulta, assim, do desempenho sob um nível elevado de stress e tensão, causado por esforço físico ou mental extremo e prolongado ou de uma sobrecarga de trabalho.

Burnout não é uma doença mental. Ter burnout é fator de risco para desenvolver depois depressão e perturbações da ansiedade. É uma síndrome associada ao trabalho, mas não é uma doença. Resulta do trabalho e do stress associado, incluindo exaustão emocional, distanciamento em relação ao trabalho ou pouca realização profissional. Isto é um estado de mal-estar psicológico e de mal-estar mental.”, explica Gustavo Jesus, médico psiquiatra e diretor clínico do Partners in Neuroscience.

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Sobre os estigmas mais comuns, Vanda Brito afirma: “eu diria que talvez um dos principais é considerar que isto é problema da pessoa e não propriamente do trabalho, o que não é necessariamente verdade. Ao nível dos estigmas, na verdade, são aqueles que acabamos por encontrar na sociedade, fora o ambiente de trabalho, e, portanto, acabamos por transpor para a organização aquilo que vivemos no nosso dia a dia. É muito associado à fraqueza da pessoa. Pode ser considerada uma fraqueza pessoal ou até às vezes incompetência”, diz Vanda Brito.

No caso deste último estigma mais associado à fraqueza, como descrito pela diretora de RH da Kelly, as pessoas que sofrem de burnout acabam por poder ficar rotuladas como incompetentes e fracas. Rótulos estes que acabam – ainda – por ficar associados às pessoas, apesar da mudança de paradigma que se tem vindo a observar na esfera da saúde mental.

Gustavo Jesus acrescenta também que o panorama atual teve um impacto positivo no que toca a este tema. “O problema já existia, a pandemia ajudou. O teletrabalho, os modelos híbridos e os próprios modelos de trabalho modificaram a vivência do stress no trabalho. Nomeadamente, a carga de trabalho, as horas, o equilibro - ou ausência dele - entre o trabalho e a vida pessoal”. Diz, ainda, que “desde que exista trabalho pode existir burnout e sobretudo têm de existir cuidados para que a saúde mental possa ser mantida”.

Em última instância, importa perceber a relevância do investimento em políticas que promovam a saúde mental. Tal como explicou o psiquiatra, “do ponto de vista do empregador, esses investimentos vão ter um retorno, vão melhorar a funcionamento das equipas e os resultados”. Assim, as empresas devem olhar para este tema com uma nova lente, com a ambição de tornar o mundo do trabalho num lugar saudável e que, deste modo, alavanque o potencial de todos os agentes nele envolvidos.

Este e outros temas relacionados com o universo laboral estão em discussão no podcast HumanaMente Falando.