Os amigos acharam que o Projeto Mais Valia, lançado pela Fundação Calouste Gulbenkian há dois anos, “tinha a cara” de António Pereira, professor reformado, de 58 anos, e ele acedeu a concorrer à bolsa de voluntariado sénior.
António é um dos 12 voluntários que já partiram em missão para os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), mas está “disponível” para repetir, “seja onde for”.
O primeiro destino foi Porto Alegre, aldeia na zona mais pobre de São Tomé. A estação das chuvas dificultou-lhe o sono, mas não afetou o entusiasmo do trabalho com a organização não-governamental Leigos para o Desenvolvimento, que, no terreno, conta sobretudo com jovens, que o tratavam por “avô” e o receberam “muito bem”.
Entre março e abril, António deu “a alma” na formação de professores. Queria ser útil, “a tal gota no oceano que pode fazer a diferença”, mas não tem dúvidas de que recebeu “muito mais” do que ofereceu. “O que mais me tocou foi a disponibilidade e a sede que as pessoas tinham de aprender e a forma como quase me adotaram”, conta à Lusa.
O terreno foi uma “surpreendente lição de vida”, porque, embora se considere “poupado”, viveu “a um nível de recursos básicos” que nunca tinha experimentado. “Mostrou-me que tenho mais do que pensava. E gasto menos hoje”, realça.
Outros 15 voluntários vão começar a partir em breve. Maria Teresa Santos já tomou as vacinas e tirou o visto, “entusiasmada” com a partida para a Guiné-Bissau, onde a Fundação Fé e Cooperação (FEC), instituição ligada à Igreja Católica, precisa da sua colaboração na área das necessidades educativas especiais.
Porém, como ainda está no ativo, tem sido difícil conciliar o trabalho com o voluntariado. E a propagação do vírus Ébola veio baralhar ainda mais as contas, com a Gulbenkian a preferir protelar a missão.
Maria Teresa nunca esteve na Guiné, mas sabe “que é um país com fracos recursos e uma grande instabilidade política”, onde “é muito fácil o relacionamento humano”. Candidatou-se para testar o “conhecimento adquirido” e “pôr à prova” o que é capaz de fazer “em contextos onde os recursos são menos abundantes”.
Sem descartar “alguns receios”, Maria Teresa elogia “a filosofia de base do programa” de voluntariado sénior, que “pega em pessoas que têm uma experiência de vida mais longa”.
Maria Hermínia Cabral, responsável pelo Programa Gulbenkian Parcerias para o Desenvolvimento, explica que a fundação criou este projeto “inovador”, mas “com bastante risco”, quando percebeu que “uma camada de gente (…) estava a reformar-se muito jovem”.
Ora, essa “gente” tinha “imensas competências” e, simultaneamente, precisava de “fazer algum corte com o quotidiano”, observa, constatando que o voluntariado “é uma forma de devolver às gerações futuras”.
O Projeto Mias Valia recebeu 360 candidaturas, sujeitas a um “criterioso processo de seleção”, que demorou quase um ano, escolhendo 50 voluntários com mais de 55 anos.
Geralmente, explica, os voluntários partem em equipa e não ficam no terreno mais do que dois meses, sabendo “perfeitamente” o que têm de fazer enquanto estão em missão, plano detalhado após “um namoro” prévio entre o parceiro local, a fundação e o candidato.
Vocacionado sobretudo para as áreas de educação, saúde e artes, a ideia é “adequar a oferta à procura” e satisfazer “necessidades técnicas específicas” das organizações.
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