Para evitar acabar em cima de uma mesa de operações, são muitos os que, em desespero de causa, procuram um especialista em osteopatia integrada. Em entrevista, João Paulo Santos Silva, osteopata e diretor da clínica OSTEOJP – Osteopatia, Terapia e Formação, em Linda-a-Velha, com consultas regulares em Castelo Branco e Coimbra, explica o que (não) podem fazer para aliviar estes e outros problemas.
Nos últimos tempos, tem-se ouvido falar mais em osteopatia integrada. Quais são os principais problemas das pessoas que vos procuram e o que é que podem fazer por elas?
Muitas das pessoas que aparecem ao pé de nós vêm realmente com situações graves de hérnias ou com dores crónicas e já passaram por todo o lado. Em muitos casos, a medicação que fizeram não resultou e não querem ser operadas. Temos também situações de pessoas que são operadas e que continuam a ter dores.
Nestas situações, é a parte psíquica que os deita abaixo. Temos de tratar a parte psíquica primeiro e, depois, tratar a parte neurológica e só de seguida a parte muscular. Neste período, deixamos de ser apenas um técnico de estruturas ou, como já alguém nos chamou, engenheiros do corpo, para sermos um amigo.
Para sermos aquele que ouve e aquele que trata. E, de repente, temos uma pessoa que está ali ao pé de nós e que nos pede por tudo que a ajudemos. É uma responsabilidade muito grande e eu já estou nisto há quase duas décadas…
Há 20 anos, quando começou, a imagem e o conhecimento que as pessoas tinham da osteopatia integrada eram radicalmente diferentes dos que têm hoje. Atualmente, sente que esse reconhecimento já existe ou ainda lidam de alguma forma com algum desconhecimento e algum preconceito? Os outros profissionais de saúde, por exemplo, ainda olham para vocês de lado?
Em termos de reconhecimento, já existe, sem dúvida. Hoje em dia, já há cinco licenciaturas. Já há universidades interessadas na osteopatia porque existe uma situação palpável e científica de peso. As estruturas [corporais] estão montadas. Não é uma coisa esotérica. É, realmente, uma coisa científica.
Quando me aparece um clínico nas minhas consultas para ser tratado por causa de uma lesão, isso já me diz qualquer coisa. Tenho muitos enfermeiros da zona de Castelo Branco que pedem para ser tratados porque a vida deles não é fácil. Trabalham muito e lidam com pesos por causa do posicionamento que fazem dos doentes.
A nível de postura, têm, por vezes, dores crónicas, por causa das quais nos contatam. Conseguir mudar a vida deles e, depois, acompanhá-los para fazer uma prevenção já nos diz qualquer coisa… Há bons profissionais em todo o lado mas, depois, também há os maus e os mais ou menos. Temos grandes osteopatas, uns mais ou menos e outros péssimos. O reconhecimento é como tudo. Há bons, há maus…
Veja na página seguinte: Ainda há quem veja os osteopatas como profissionais de saúde de segunda?
Mas sente que já conquistaram o vosso lugar ou ainda estão a batalhar para atingir esse reconhecimento?
Sim, ainda há muita gente que não acredita, sem dúvida. Vamos dando pequenos passos. Tem sido uma evolução no tempo… Mas, quando os médicos nos veem exactamente, não como uns charlatões mas como profissionais que os podem ajudar ao nível das estruturas de saúde, é excelente. Há clínicos que reconhecem o nosso valor!
Então estão no bom caminho, portanto…
Sim, estamos no bom caminho!
Já existem cursos, já têm um certo reconhecimento, mas podemos fazer aqui um paralelismo. O casamento homossexual é, hoje, possível em Portugal mas, apesar disso, o preconceito continua a existir. Apesar de terem um maior suporte científico e até uma visibilidade maior que não tinham antes, no vosso dia a dia ainda sentem que são vistos como profissionais de saúde de segunda?
Somos um bocadinho. Nós temos de pagar o IVA e não temos diretamente nenhuma ligação com a Segurança Social é verdade. Ainda somos vistos um bocadinho à margem. A imagem que alguns técnicos [de saúde] tentaram passar que isto não era medicina ainda ficou para algumas pessoas.
Já chegaram ao pé de mim e disseram-me que tinham ido a um osteopata e que tinham ficado na mesma, pondo a responsabilidade em cima de nós. Tive que demonstrar a essa pessoa que, muito provavelmente, o meu colega fez alguma coisa que na altura era necessária para o tratamento mas, ainda assim, a dor não se foi embora.
Os profissionais que começaram não tiraram o curso em Portugal. Muitos foram tirá-los fora do país e, quando regressaram, regressaram com toda a sapiência. Eu também não tirei o meu curso em Portugal. Tive de me ir embora para aprender…
Foi para onde?
Tirei-o em Espanha mas também passei por França. Estive lá fora a aprender para vir para Portugal. A osteopatia nasceu nos EUA e depois veio para Inglaterra e para França. Os franceses têm uma osteopatia diferente da dos americanos e da dos ingleses. A filosofia é igual mas a maneira de fazer difere. Eu tive a sorte de trabalhar tanto de uma maneira como da outra.
O que é que as diferencia?
Uma é mais manipulativa e mais direta e a outra é um bocadinho diferente porque impõe algumas leis. É essa a diferença! Mas o eixo da filosofia de trabalho e a maneira de fazer em termos de manuseamento biomecânico é igual. A anatomia e a fisiologia está lá toda. Aquilo [formação que fazem para poder exercer] é quase um curso de medicina. Nos últimos dois anos, ensinam-nos muito sobre anatomia, fisiologia, radiologia…
Temos tudo quase exatamente como os cursos de saúde e, depois, é que há uma especialização. A diferença é que algumas pessoas diziam que eram osteopatas e, se calhar, não o eram. Por isso, alguma imagem ainda ficou desfocada…
Veja na página seguinte: Há quem afirme que os osteopatas não tratam, só aliviam. Verdade?
Há quem afirme que os osteopatas não tratam, só aliviam. É uma definição demasiado redutora ou, na prática, é mesmo assim?
Quando nos surge alguém com uma hérnia discal, nós não conseguimos tirar a hérnia discal. Só uma operação é que a vai tirar! Agora, nós aliviamos essa dor e, nalgumas situações, até conseguimos que o disco volte ao sítio. Aliviamos a estrutura e recolocamo-la no sítio mas também reposicionamos todo o corpo.
E, ao repô-lo, manuseando os ligamentos e os nervos e todo o seu funcionamento, temos um corpo completamente aliviado. Para ter uma coluna direita, depois de tirarmos as dores, vai demorar muito tempo e, muitas vezes, são seis ou sete meses com consultas, mês a mês ou de dois em dois meses.
Ao fim desse tempo, essas pessoas chegam ao pé de mim já com as estruturas direitas e com os ombros na mesma altura e dizem que já se sentem bem. Há um trabalho de longo curso que vamos fazendo mas, pouco a pouco, veem-se resultados. Não aliviamos apenas a dor. Nalgumas situações, tratamo-la. Agora, claro que pode voltar outra vez.
Somos dinâmicos. O ser humano não é estático. Há situações em que a dor aparece sempre porque a rigidez fica lá. Hoje em dia, o stresse é uma das piores coisas. O corpo ressente-se e, no dia a dia, não andamos felizes. Gostávamos de ser felizes diariamente e não conseguimos. As pessoas, muitas vezes, voltam com queixas mas nós conseguimos aliviar e até tratar algumas.
Apesar da responsabilidade que têm, não está tudo nas vossas mãos. Passam também informações e indicações às pessoas. Não vale a pena virem ter convosco para fazer um tratamento se, depois, em casa, se sentam todas tortas no sofá, pois não? O paciente também tem de ter aqui alguma responsabilidade, não é?
Exatamente! Eu estive a fazer a minha própria pesquisa num call center durante seis meses e, durante esse período, andei a tratar as pessoas numa cadeira, era quase uma cadeira de massagem, para lhes mostrar a má posição que adotavam e para lhes reposicionar o corpo todo. Estamos a falar de miúdos com 22 e 23 anos já com hérnias discais e com dores crónicas por má postura.
Estão sentados horas a fio numa cadeira em frente ao computador com um telefone à frente. Muitas das vezes, com o sistema nervoso pressionado porque têm de tentar atingir uma meta e resultados. Estão com os níveis de stresse sempre em cima. Durante esses seis meses, o que fiz foi tentar lutar para lhes aliviar a tensão e a dor, mas também tive de ensinar muitos deles a estarem direitos nas cadeiras.
Hoje em dia, temos um grupo de pessoas diariamente em frente a um computador com posturas erradas em que o posicionamento do próprio computador e até do teclado colocam o corpo e a parte ocular sempre em tensão e isso faz com que todo o cérebro e todos os músculos estejam em tensão. Sugiro-lhes que se levantem, que mudem de posição, que levantem um bocadinho os pés…
Sugiro que ponham o corpo mais direitinho e que levantem um bocadinho mais a parte onde têm o suporte do computador e que metam o ecrã ao nível dos olhos e vão ver que vão ficar menos tensos. A mudança do corpo no dia a dia também nos ajuda a ter uma vida mais saudável e também é importante fazermos exercício físico. Nós já não fazemos exercício físico.
Deixámos de fazer exercício físico. Somos muito sedentários. Vamos de carro para casa e depois do sofá da sala para a cama. Quem fizer exercício físico tem uma vida mais saudável. Hoje em dia, não há tempo para nada. Isso é que é o pior! E isso faz com que, diariamente, o corpo esteja sempre em descompensação…
Veja na página seguinte: Os trabalhos que os pacientes levam para casa
Para corrigir isso, passam trabalhos para casa às pessoas, como na escola?
Muitas das vezes, sim! E tenho tentado trabalhar com alguns técnicos a nível de fisioterapia e estamos a tentar ter tai chi, uma arte marcial chinesa que também ajuda o corpo em termos de mobilidade. Há muitas possibilidades… Isto é um mundo tão vasto… Podemos reposicionar o corpo e a mente para estarem mais libertos e menos tensos para as estruturas ficarem menos bloqueadas.
Um especialista estrangeiro disse há uns tempos que, no futuro, todos os problemas da neurologia serão resolvidos pela fisioterapia e os musculares pela osteopatia integrada. Essa é também a visão que tem?
Eu acho que trabalhar em conjunto é muito mais importante do que uma coisa e outra porque nem toda a gente sabe tudo. O osteopata não trabalha só a parte muscular. Temos que perceber que muitas das pessoas pensam que só manipulamos e não é só isso. E a fisioterapia é necessária para tudo o que quer que seja a nível neurológico, em termos de acidentes vasculares cerebrais…
É essencial reposicionar as estruturas [do organismo] mas a parte clínica também é fundamental. Trabalhar em conjunto é o mais importante. Se o fizermos, os doentes vão ter melhores resultados do que os que obtêm agora e tomar menos medicação. Nós somos dos países que tomamos mais medicamentos.
Eu fui, durante 12 anos, um dos responsáveis pelas Termas de Monfortinho e sei o que se passa na área do termalismo, que em França e noutros países tem outra importância. Os médicos [desses países] mandam [os pacientes] para o termalismo. O português, hoje em dia, é excelente. Há muito bons profissionais e as estruturas termais são muito boas. Já não são aquilo que eram antigamente…
Texto: Luis Batista Gonçalves
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