A mamografia é considerada o exame mais eficaz para diagnosticar o cancro da mama, uma patologia que atinge cerca de 4.500 portuguesas por ano. Mas a melhor idade para fazer a primeira mamografia é tema de debate há anos e as orientações variam muito de país para país. A Organização Mundial da Saúde recomenda o primeiro rastreio aos 35. Nos Estados Unidos da América, a American Cancer Society (ACS) alterou, em outubro de 2015, as suas directrizes.
Este organismo passou a recomendar que, em mulheres saudáveis, seja feito a parti dos 45 e não dos 40 como até aqui. Outra novidade nas novas recomendações foi o facto de o exame de palpação mamária deixar de estar indicado. Para emitir as novas diretrizes, a ACS fez uma revisão dos estudos mais recentes e dividiu as recomendações em fortes (quando considerou haver uma evidência clara) e qualificadas (quando há evidência clara do benefício, mas menos certeza no que toca à ponderação de vantagens e desvantagens).
Segundo Celeste Alves, médica radiologista, responsável pela radiologia mamária da Unidade de Mama do Centro Clínico da Fundação Champalimaud, em Lisboa, «estas novas orientações não diferem de forma relevante das guidelines aplicadas na maior parte dos países da Europa». A especialista comenta as principais alterações. Para as mulheres que são apologistas do autoexame mamário, veja como é que este deve ser feito passo a passo.
Mamografia anual a partir dos 45 anos
Esta recomendação (forte), que adia em cinco anos a idade da primeira mamografia tem por base a diminuição da mortalidade associada ao exame e à probabilidade de falsos positivos. Estudos observacionais sugerem uma diminuição da mortalidade entre os 20 e os 40 por cento com a mamografia, mas alguns estudos randomizados (mais credíveis) indicam que «85 por cento das mulheres teria morrido, tendo ou não realizado a mamografia».
Os especialistas consideraram ainda que «as mulheres jovens têm cancros mais agressivos, mas também menos probabilidade de desenvolver cancro». Esta aumenta com a idade e atinge o auge entre os 51 e os 54 anos, diminuindo após a menopausa. Por outro lado, cerca de 61 por cento das que fizeram mamografias logo a partir dos 40 tiveram pelo menos um falso positivo até aos 50.
Celeste Alves, médica radiologista, comenta as recomendações dos especialistas norte-americanos. «Os falsos positivos ocorrem porque a densidade da glândula mamária ainda é muito elevada na mulher jovem. Isto implica a realização de testes suplementares para esclarecimento, mas também faz aumentar os falsos negativos que podem gerar uma falsa tranquilidade», refere.
«Em Portugal, o Programa Nacional para as Doenças Oncológicas recomenda a primeira mamografia aos 50 anos para mulheres sem qualquer sintoma e sem fatores de risco acrescidos, isto é, um risco de dez por cento, igual ao da população geral, e a partir daí um exame bianual até aos 69», acrescenta ainda a especialista.
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Mamografia bianual a partir dos 55 anos
Trata-se de uma recomendação (qualificada) baseada num estudo que analisou as características dos tumores de 15.440 mulheres entre os 40 e os 85 anos, diagnosticados no âmbito de uma mamografia anual e bianual. A proporção de tumores em estágio IIB (maiores que 15 mm) era maior em mamografias bianuais nas mulheres em pré-menopausa, mas não nas pós-menopáusicas. Daí a recomendação de bianual nesta fase.
«O intervalo de rastreio está relacionado com o conhecimento da biologia dos tumores e seus tempos de crescimento», comenta Celeste Alves. «Na mulher peri ou menopáusica e sem terapêutica hormonal de substituição, o intervalo de dois anos é adequado para o diagnóstico precoce de uma lesão mamária com aparecimento no intervalo do rastreio», afirma ainda a responsável pela radiologia mamária da Unidade de Mama do Centro Clínico da Fundação Champalimaud.
Palpação mamária e autoexame sem indicação
O exame de palpação da mama, pelo médico, ou o autoexame, feito pela mulher, para detetar nódulos suspeitos deixa de estar indicado (recomendação qualificada). A ACS refere que não há evidência direta que permita sustentar a sua utilidade. Um estudo cohort feito nos EUA, por exemplo, concluiu que por cada 0,4 cancros invasivos por mil mulheres que estes exames permitem detetar, há 20,7 resultados falsos positivos.
«A palpação mamária efetuada pelo médico deixou de se considerar importante porque só deteta lesões em estádios avançados e também pode induzir ansiedade e levar à repetição desnecessária de exames, dado existirem numerosas alterações benignas que se traduzem por nódulos. De qualquer modo, faz parte da observação clínica que todo o médico deve fazer, quer seja de medicina geral e familiar ou de ginecologia», diz Celeste Alves.
«Quanto ao autoexame, mantém-se a recomendação, não para o diagnóstico precoce do cancro da mama, mas para alertar a mulher para a necessidade de conhecer a sua mama e as alterações ao longo do ciclo fisiológico mensal e da vida. Deve ser mensal, logo após o período menstrual (fase em que está menos sensível) e aprendida desde o início da idade adulta», realça a especialista.
Os grupos de maior risco
A população feminina surge, obviamente, no topo da lista. «As mulheres com risco de cancro de mama intermédio ou elevado devem ser seguidas em consulta especializada e realizar a mamografia complementada com ecografia mamária ou eventual ressonância mamária», refere Celeste Alves.
«A avaliação e periodicidade são estabelecidas pelo médico. Fatores como a história familiar ou mutações genéticas podem determinar formas específicas de diagnóstico e terapêuticas profiláticas», explica ainda a especialista.
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Os prós e contras da mamografia
Como em tudo, também este método de análise tem vantagens e desvantagens. «Ainda há incertezas quanto à dimensão dos benefícios da mamografia», lê-se no editorial do artigo que divulga as novas diretrizes. A mulher deve tomar uma decisão informada, ponderando vantagens e desvantagens, sobretudo os custos físicos e psicológicos dos testes falsos positivos, dizem.
Em 2013, investigadores da faculdade de medicina da Universidade do Porto, autores de um estudo sobre meios complementares de diagnóstico, diziam ao jornal Público que, «se num período de dez anos forem rastreadas com mamografia 2000 mulheres, evita-se a morte de uma, mas são feitos dez diagnósticos desnecessários e dados 200 falsos positivos».
or outro lado, contrapõe Celeste Alves, «apesar das incertezas, este é o único exame que, utilizado de forma isolada, permite reduzir a mortalidade em 20 por cento». «Enquanto não existir um teste de eficácia superior, continua a ser o gold standard para o diagnóstico precoce», refere ainda a especialista.
Os programas de rastreio gratuitos a que pode recorrer
Existem programas de rastreio gratuitos coordenados pelas várias delegações da Administração Regional de Saúde destinados a todas as mulheres entre os 45 e os 69 anos. Consulte a ARS da sua área de residência ou o site da Liga Portuguesa Contra o Cancro em www.liga contracancro.pt.
Texto: Bárbara Bettencourt com Celeste Alves (médica radiologista e responsável pela radiologia mamária da Unidade de Mama do Centro Clínico da Fundação Champalimaud em Lisboa)
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