Muitos de nós procuram lugares como as florestas para aquilo a que chamamos recarregar energias. Fazer trilhos, caminhadas, corrida ou só passeios são algumas das atividades mais procuradas.

O silêncio que se esconde debaixo das altas copas das árvores contrasta com o ruído desenfreado das cidades e , talvez já só por isto, não dispensamos de uma fuga para uma vida “mais verde”. Se Edith Piaf, nos anos 1960, romantizava por uma vida mais rosa – la vie en rose­ – hoje procuramos também uma vida mais “verde” – la vie en vert.

A Mata Nacional do Bussaco será a primeira floresta da Península Ibérica a ser certificada com o título de “Floresta terapêutica”. A certificação é da responsabilidade da International Certification Office Healing Forest of  BioCon Valley® GmbH,  instituição que coordena estes processos a nível internacional e da qual a Destinature - Agência para o Desenvolvimento do Turismo de Natureza  - é parceira, tendo sinalizado neste contexto o potencial da Mata Nacional do Bussaco. A Destinature é assim pioneira e líder nestes processos de certificação no nosso país.

healing forest
healing forest unsplash

Uma floresta terapêutica é "uma área florestal destinada ao uso terapêutico em casos com indicações especiais", explica Stefanie Frech, gestora de projetos na Healing Forest International Certification Office e responsável pelo processo de certificação da Mata Nacional do Bussaco.

A importância desta certificação está, maioritariamente, relacionada com o carácter  terapêutico e medicinal que esta certificação lhe confere numa ótica de prevenção terciária. "Os tratamentos de doenças na floresta são adequados para influenciar positivamente os prejuízos causados ​​pelas doenças se acompanhados por terapeutas treinados", acrescenta Stefanie.

As florestas têm sido, ao longo dos anos, lugares importantes para a relação do Homem com a Natureza, e mais recentemente, estudos científicos têm-se virado para a sua importância na área da saúde e bem-estar. “A exposição a espaços naturais está associada a duas vertentes da saúde mental: uma menor prevalência de doença mental, sobretudo de depressão, ansiedade e perturbação de hiperatividade, bem como maiores níveis de bem-estar psicológico”, explica Karine Silva, investigadora no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar.

Está assim cientificamente provado que o contacto com a natureza, como um passeio ou atividade na floresta, tem influência no estado de humor, havendo uma “sensação de relaxamento associada a uma diminuição da pressão arterial, frequência cardíaca e níveis de hormonas de stress no sangue”, explica Karine. Apesar dos estudos ainda serem recentes sabe-se que isto pode acontecer também pela libertação de alguns compostos orgânicos de certas árvores e plantas.

A biodiversidade de uma floresta é também bastante importante, pois dependendo das diferentes plantas e árvores, são também mais diversos os estímulos e benefícios causados. "Por exemplo, sabemos que as coníferas têm um efeito positivo, por causa dos óleos essenciais, também chamados de terpenos. Para o ser humano, a inalação desses óleos essenciais é positiva, pois dilatam o trato respiratório", exemplifica Stefanie.

Uma floresta húmida é mais benéfica para a saúde do que uma floresta seca "e são preferidas florestas mistas", explica a responsável pela certificação das florestas.

O contacto frequente e prolongado com a natureza também pode contribuir para a diminuição dos níveis de ruminação mental. “A ruminação é quando revisitamos vezes sem conta os mesmos pensamentos negativos sobre nós próprios ou sobre algo que nos tenha acontecido”, explica a investigadora em ecopsicologia.

É também nas florestas, principalmente junto a cascatas de água, que existe uma grande concentração de iões negativos que proporcionam a sensação de bem-estar e de ar puro. Já nos ambientes urbanos respiramos pouco ar puro, uma vez que existem grandes concentrações de iões positivos.

Cascata
Cascata créditos: Pexels

Por vezes também a contemplação da natureza, ou de elementos dela, como uma flor, uma planta, um animal ou uma cascata, gera um sentimento de espanto que pode “alterar a perceção sobre o mundo e sobre nós próprios gerando sentimento de ligação profunda a algo maior do que nós próprios e inunda-nos de gratidão, compaixão e generosidade para com os demais seres vivos”, explica a investigadora.

Quais são os critérios para uma Floresta Terapêutica?

Apesar destes benefícios da natureza, nem todas as florestas estão indicadas como Florestas Terapêuticas (Healing Forest) uma vez que esta designação só pode ser feita se cumprir uma série de critérios. Stefanie Frech esteve no dia 26 de junho na primeira visita técnica à Mata Nacional do Bussaco com responsáveis da Destinature e explica como são desenhados os critérios para esta certificação. "Primeiro, avaliamos as informações básicas fornecidas pelo proprietário florestal interessado. Se possível, o ICO (International Certification Office) inspeciona a floresta para ter uma ideia do potencial uso como floresta curativa."

A certificação de uma floresta segue um procedimento padronizado de critérios. "Os principais critérios são que a floresta seja o mais natural possível e ofereça atenuação de ruído, bem como proteção visual contra o vento e ar de boa qualidade; e deve ter caminhos com diferentes níveis de esforço e graus variados de dificuldade", começa por enumerar, mas para Stefanie "o mais importante é a oferta de atividades regulares por terapeutas florestais treinados e membros de outras profissões terapêuticas (por exemplo, fisioterapeutas, ergoterapeutas) em áreas designadas para atividades terapêuticas, bem como para exercícios de relaxamento."

Após a primeira visita, e elaborados os devidos relatórios com os diferentes membros do projeto, concluiu-se que a Mata Nacional do Bussaco apresenta várias  características que atendem aos critérios exigidos como "o tamanho e a localização, a infraestrutura e a acessibilidade", refere. O processo de certificação ainda está a decorrer, há aspetos ainda a serem postos em prática como a sinalização, mas Stefanie ficou impressionada na sua visita. "Fiquei muito impressionada com as diferentes áreas dentro da Mata do Bussaco, a parte com oliveiras muito antigas, o caminho das palmeiras e o espaço aberto, com imenso potencial para ser aproveitado como área terapêutica. Com esta variedade natural, a Mata do Bussaco pode ser utilizada para múltiplos fins, como medidas de prevenção e reabilitação", diz.

A primeira floresta a ser certificada pela ICO foi uma floresta austríaca. "Uma floresta ligada a um mosteiro que trata pacientes com doenças cardiovasculares e do aparelho músculo-esquelético", mas não é exclusiva a estes, também é acessível a turistas e pessoas que a procuram por lazer. Em 2023 já foi certificada uma floresta curativa na Alemanha e  até ao final do ano espera-se a certificação de outra no mesmo país. "Estão em curso outros processos de certificação na Alemanha, Áustria, Eslovénia e sem esquecer Portugal, existindo também vários interessados ​​de outros países, como Finlândia, Lituânia e Grécia", remata Stefanie.

“Os banhos de floresta”: uma prática possível de fazer na Mata Nacional do Bussaco

O conceito de Banhos de Floresta tem origem no Japão, shirin-yoku, e referia-se à prática oriental de imersão na natureza com o objetivo de ativar todos os sentidos.

floresta no japao
floresta no japao créditos: Unsplash

Alex Gesse, formador na Forest Therapy Hub, e especialista em “banhos da floresta”, reconhece os benefícios da natureza e explica-nos melhor em que consistem. “Nós podemos estar de forma passiva na floresta e já temos uma série de benefícios; mas o que fazemos é tentar impulsionar esses benefícios através de técnicas e práticas específicas”, explica.

A grande diferença está na postura com que se está na natureza e nestes “banhos da floresta”, Alex Gesse explica que não se pretende que se esteja apenas passivamente a respirar ar puro, mas que haja um foco nos sentidos. “Aqui trabalhamos sobretudo os sentidos e, por isso, focamo-nos em atividades que promovam isso, como tocar uma árvore, mexer no chão, cheirar uma planta, ou observar a floresta e procurar algo que nos surpreenda”, exemplifica.

O formador lembra que as pessoas na sua generalidade têm os sentidos fechados e estas atividades ajudam a abri-los.Uma das atividades, que é algo tão simples, é alguém sentar-se na floresta a olhar para o céu, porque nós não olhamos para o céu, estamos focados nos pés, que nos dá segurança por onde andamos a caminhar, ou agora nos telemóveis, ou olhamos para a frente”, acrescenta.

Após a explicação científica fica fácil perceber por que é que estas atividades trazem benefícios para a saúde e ajudam na saúde, não só a física, mas principalmente a saúde mental, um dos focos desta imersão. “Neste momento estamos a desenvolver um estudo, em colaboração com uma aluna nossa de Edimburgo, para perceber de que forma estas atividades  diminuem o stress nos estudantes. No Chile , uma das nossas alunas,  estava a trabalhar a gestão das emoções vinculada ao bullying nas escolas. Estamos a abrir muitos espaços onde estamos a aplicar este tipo de técnicas para melhorar a vida das pessoas.”, esclarece.

“O primeiro feedback que temos de qualquer participante dos banhos da floresta é que estão mais relaxados, descansados e sentem que tiveram tempo para eles próprios”, conta.

Os “banhos da floresta” são normalmente de duas a três horas e a duração da atividade está suportada pela ciência. “A partir da terceira hora o impacto no nosso bem estar desta área na floresta diminui”, diz Alex.

Sobre a Mata Nacional do Bussaco, Alex Gesse não tem dúvidas que é uma justa candidata à certificação de “Floresta Terapêutica”. “Eu acho que uma das principais características está relacionada com as infraestruturas, ou seja, o acesso é fácil e depois a grande vantagem é a biodiversidade da própria floresta. A Mata do Bussaco mesmo sendo uma floresta plantada tem uma biodiversidade imensa que tem uma série de qualidades; está longe dos barulhos e é uma mata que está cheia de água: é um lugar imensurável”, diz.

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