“Mãe, gostava tanto de ter um animal de estimação”. Reconhece esta frase? Certamente que sim pois é típica de vários lares portugueses e da panóplia de pedidos que os filhos fazem aos pais ou a outros familiares chegados em certa etapa da infância. Quais os benefícios ou riscos da relação dos animais e das crianças? Leia tudo neste artigo.
A relação entre o homem e o animal remonta a 0,5 milhões de anos. O típico cão tarefeiro passou a ser um cão companheiro, carinhosamente considerado por praticamente todos nós como o “melhor amigo do homem”. E de facto, quem tem cães ou outros animais, refere a enorme companhia que proporcionam aos humanos. Não tão poucas vezes, são considerados como verdadeiros membros da família e até são lembrados como uma prenda de Natal nesta época do ano, seja em forma da comida ou ração apropriada ou um brinquedo… Nada mais natural!
Costuma também dizer-se que quem não gosta de animais “não tem bom coração” e que estes detectam facilmente “as boas pessoas”. Mitos ou frases feitas à parte, a verdade é que quando se aborda a questão do relacionamento entre as crianças e os animais, há que ter em consideração alguns procedimentos e regras. Acima de tudo, deve reinar o bom senso!
“Os adultos devem ser os supervisores, reguladores e responsáveis desta relação”, explica a Dr.ª Clara Alves Pereira, pediatra do Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa, EPE. As crianças são imaturas em várias fases do desenvolvimento e devem compreender que os animais “não são brinquedos”.
Quando colocar um animal junto de uma criança?
A resposta não é fácil. Tudo depende do seu grau de desenvolvimento psicomotor, do ambiente familiar em que se insere e da idade. “As crianças não se inserem num grupo homogéneo. Com menos de um ano, exploram o mundo e não têm noção do que podem encontrar. Se virem um cão, podem facilmente puxar-lhe o rabo como se de um boneco se tratasse”, refere a pediatra.
A noção de brincadeira só começa aos três de idade, aproximadamente, pelo que cerca de um ano antes, a criança ainda não tem noção do que é um animal nem dos perigos e consequências que podem advir do relacionamento com o mesmo. “Até aos três anos, é normal que a criança explore o mundo inconsequentemente e só aos cinco é que começa a interiorizar regras ainda que não as entenda na totalidade”, salienta Clara Alves Pereira.
Alguns pais já tinham animais antes do nascimento dos filhos e ficam muito ansiosos com esta situação. “Tenho um bebé mas já tinha um gato. O que fazer? Devo dar o animal e deixar de o ter?.” Eis uma das perguntas que os pais costumam colocar aos pediatras. A resposta não é unânime e tudo depende de cada caso. É certo que os animais podem ser responsáveis por algumas infecções (como por exemplo, zoonoses), alergias e acidentes domésticos sobretudo com crianças que ainda tenham imaturidade imunológica. No entanto, “apesar dos riscos, os animais não são a fonte major de infecções humanas”, tranquiliza a pediatra.
Cada família deve decidir de forma individual a melhor altura para ter um animal de estimação em casa. É essencial promover o afecto e o compromisso de qualquer família nesta nova responsabilidade para que os benefícios ultrapassem ou sobreponham eventuais riscos.
Existirá um animal ideal? Talvez. Basta que tenha algum cuidado na selecção. O animal deve ser dócil, ter boa saúde e de fácil socialização com as crianças.
Minimizar e prevenir os riscos
A escolha adequada do animal; a implementação de medidas preventivas; a higiene, os cuidados alimentares e de saúde são fundamentais para que a existência de um animal em qualquer lar seja saudável para os que lá moram. Clara Alves Pereira adianta que “a maioria dos animais de companhia não parece constituir um risco para o aparecimento de doenças”. Não se deve tirar um animal de casa “pelo risco de surgimento de alergias, a menos que os sintomas alérgicos sejam consequência directa do convívio com o animal.” Como facilmente se verifica, os riscos e os benefícios devem ser devidamente ponderados no seio de cada família.
Os pais devem ensinar o animal a reagir adequadamente à criança e constituem parte essencial na supervisão permanente. “Não se pode mesmo facilitar”, aconselha a médica pediatra. Em simultâneo, a criança também deve aprender a brincar com o animal.
Esta relação deve ser, acima de tudo, saudável e nunca substitutiva dos pais. “Tem de existir um bom exemplo parental”, refere Clara Alves Pereira.
Se a escolha recair sobre um gato ou cão, certifique-se que existe um historial de contacto com crianças e a interacção deve ser gradual e adequada.
Os pais devem promover tempo de qualidade para regular o convívio entre os animais e as crianças. Nunca deixe a criança a brincar sozinha com o animal sem supervisionar o momento. Uma decisão consciente, devidamente informada e ajustada promove a cumplicidade, a ternura, a diversão, o afecto e a responsabilidade entre as crianças e os animais.
Benefícios bem identificados
Sabia que a presença de animais é mais frequente em lares portugueses com crianças cujos pais sempre tiveram estes companheiros na sua infância? Os benefícios do relacionamento das pessoas com os animais são psicológicos, fisiológicos e ao nível da socialização.
Nos adultos, os animais proporcionam:
- O aumento da actividade física;
- Favorecem o conforto e o afecto;
- Diminuem o stress, a solidão e a ansiedade;
- Proporcionam o convívio familiar e a partilha de ensinamentos aos filhos;
- Aumentam as oportunidades de solidão.
Nas crianças, denotam-se como principais vantagens:
- Estimulação do desenvolvimento psicomotor;
- Incentivo à actividade física;
- Aumento dos sentimentos de auto-estima e de tolerância;
- Melhoria do humor, da concentração e da brincadeira;
- Melhoria da aprendizagem de regras sociais;
- Manutenção das relações de confiança e de intimidade;
- Fornecimento de efeitos terapêuticos e de estimulação.
Estudos indicam que os animais:
- Proporcionam um suporte emocional em doentes com Alzheimer;
- Diminuem a tendência para a depressão nos doentes com sida;
- Reduzem a percepção da dor nas crianças;
- Despertam a interacção em crianças com perturbações de comportamento, como por exemplo, o autismo;
- Diminuem a tristeza e a solidão de doentes crónicos.
Estratégias para lidar com cães estranhos
Quando há cães e crianças a partilhar a mesma casa, a criança aprende que tipo de brincadeiras são aceites e como pode lidar com o cão se for este o animal que os pais escolham. No entanto, as crianças devem saber que nem todos os animais são iguais e que há que ter cuidados redobrados com cães desconhecidos.
- A criança só se deve ficar junto de cães que não conhece sob a supervisão de um adulto;
- Só deve aproximar-se de um cão se este estiver com trela;
- Se o animal estiver do outro lado de uma vedação, a criança não deve ser autorizada a tentar tocar no animal, nem sequer colocar as mãos na vedação;
- Antes de chegar perto de qualquer cão, a criança deve pedir autorização ao dono do animal e os pais devem certificar-se que é a proximidade é segura;
- A criança não deve dirigir-se a um animal a correr ou aos saltos. Pode facilmente assustá-lo;
- Ao aproximar-se e ao brincar, a criança deve manter a cara afastada do focinho do animal;
- Se o animal for amigável, a criança deve fazer festas de preferência no dorso, evitando a zona do focinho;
- Ao fazer “festas”, algo que as crianças gostam muito, não devem recuar a mão – avançar e retirar a mão é visto como uma brincadeira para o cão que pode saltar ou ir atrás da mão para brincar;
- O cão nunca deve ser abraçado, apertado ou puxado;
- A criança não deve gritar nem fazer movimentos bruscos;
- Nunca deve olhar directamente o cão nos olhos.
Texto: Cláudia Pinto
A responsabilidade editorial e científica desta informação é do jornal
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