Fibromialgia, artrite reumatoide e enxaqueca são as situações mais dolorosas que a Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) aponta como sendo as de maior prevalência feminina.
As diferenças anatómicas entre o homem e a mulher, bem como os mecanismos biológicos que incluem hormonas sexuais e fatores genéticos e ainda as influências psicosociais fazem com que a mulher seja mais suscetível à dor.
Com a ajuda dos melhores especialistas fomos saber como evitar estas e outras dores frequentes nas mulheres:
Enxaqueca
Segundo os dados da Sociedade Portuguesa de Cefaleias, estima-se que 8 a 15% dos cidadãos dos países ocidentais sofrem de enxaquecas. José Pereira Monteiro, presidente do Colégio de Neurologia da Ordem dos Médicos, afirma que a prevalência desta patologia no sexo feminino «é cerca de duas vezes superior à do sexo masculino, sendo a diferença maior no período etário fértil».
Atingindo essencialmente mulheres entre os 30 e os 40 anos, a enxaqueca é «uma variedade de dor de cabeça que surge por episódios agudos separados por períodos livres de dor». Durante as crises, que duram entre 4 a 72 horas, «a dor é geralmente unilateral (só um lado da cabeça, embora possa variar de crise para crise ou mesmo ser bilateral), de intensidade moderada a severa (geralmente perturbando ou impedindo a atividade normal) e pulsátil (como o coração a bater dentro da cabeça)», refere o neurologista.
Agrava com os movimentos da cabeça e acompanha-se de «intolerância à luz e aos ruídos (e, por vezes, também aos cheiros), bem como enjoos, podendo terminar em vómitos intensos», adianta. José Pereira Monteiro diz ainda que «em cerca de 15 a 20% dos casos, a crise é antecedida por manifestações visuais (estrelas, linhas, riscas, zig-zag ou ondas alastrantes), sensitivas (como formigueiros ou picadelas), diminuição de força de um lado do corpo ou dificuldade em falar».
Como prevenir e tratar
Existem diversos fármacos que permitem «prevenir a ocorrência de crises em mais de 60% dos casos», garante José Pereira Monteiro. O especialista explica que, «através da associação de fármacos é possível obter níveis de prevenção mais elevados». Paralelamente, «as crises que, mesmo assim ainda surjam, podem ser combatidas precocemente com fármacos potentes, como os triptanos, que têm elevada eficácia, sobretudo, se ingeridos precocemente». Deve recorrer ao médico, pelo menos, uma vez para fazer o diagnóstico correto e «sempre que as crises surjam com grande severidade e/ou com uma frequência superior a três vezes por mês».
Fibromialgia
Atinge cerca de 3% da população feminina entre os 20 e os 50 anos.
A fibromialgia é uma síndrome musculoesquelética crónica, não inflamatória e de causa desconhecida.
Está na origem de uma incapacidade física e emocional, provoca dor generalizada nos músculos, ligamentos ou tendões mas não afeta as articulações e os ossos. Esta patologia manifesta-se através de dores generalizadas, fadiga, alterações do sono e perturbações cognitivas.
Segundo Jaime Branco, professor de Reumatologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa (UNL), as características de personalidade, nomeadamente o «perfeccionismo compulsivo, a ansiedade, os estados de depressão, a incapacidade de relaxamento e de desfrute da vida e a incapacidade de lidar com situações hostis», favorecem o aparecimento da fibromialgia. É diagnosticada através da presença de dor com mais de três meses de duração e da «existência de pontos dolorosos à pressão digital em áreas simétricas do corpo».
Como prevenir e tratar
Para Jaime Branco, a melhor forma de prevenir a fibromialgia é tratar a dor: «a dor aguda é um alerta de que há algo que está mal no nosso organismo. A dor crónica deve ser tratada o mais profunda e precocemente possível para que não suceda o fenómeno de uma dor local passar a uma dor regional e, depois, tornar-se generalizada». No que diz respeito ao tratamento, o reumatologista diz que «não existe um único fármaco que cure a fibromialgia, existem vários adequados a cada tipo de dor». Jaime Branco sublinha que «é crucial tratar a dor» e, para isso, é necessário «conjugar o tratamento medicamentoso com boas práticas de exercício físico, reeducação do intestino e do sono, tratar situações de depressão, entre outros».
Artrite reumatoide
A artrite é uma inflamação das articulações que causa dor, inchaço, rigidez e perda de função nas mulheres a partir dos 40 anos.
Ocupa o terceiro lugar em problemas de saúde, a nível mundial, e é a causa principal de incapacidade física.
Em Portugal, estima-se que existam cerca de 40 mil doentes. A causa é desconhecida, no entanto o Instituto Português de Reumatologia (IPR) explica o mecanismo que a desencadeia.
«Existe uma resposta errada do sistema imunitário, que reconhece as próprias células como estranhas e ataca-as, causando uma resposta inflamatória nas articulações e outros órgãos», indica o IPR. Quase sempre em resultado das más posturas, stress, ou excesso de peso, as mulheres são mais vulneráveis devido à redução de massa muscular que resulta da descida dos estrogénios durante a menopausa.
A intensidade da doença depende de cada pessoa, do desgaste físico, do peso e da carga genética. Nas mulheres, as articulações mais afetadas são as das mãos e dos joelhos. O diagnóstico é feito através da história clínica e avaliação das articulações. Inclui também análises ao sangue, ecografia músculo-esquelética e ressonância magnética.
Como prevenir e tratar
Luís Cunha Miranda, reumatologista, afirma que a melhor forma de prevenção é a «assistência por especialistas em Reumatologia, o cumprimento do plano de medicação e de apoio, bem como um seguimento regular». A estratégia terapêutica, segundo o especialista, implica não só a toma de medicamentos mas também outro tipo de abordagens complementares, «como os programas de medicina física e de reabilitação, exercício, alimentação e, em alguns casos, a cirurgia». Luís Cunha Miranda refere ainda os benefícios das terapêuticas biotecnológicas, «estes medicamentos são tecnologicamente mais evoluídos e apresentam grandes melhorias no controlo da doença».
Lombalgia
A lombalgia comum (dores nas costas) é uma das doenças reumáticas mais importantes e que afeta mais pessoas em todo o mundo.
«Ao longo da vida, entre 70 a 80% das pessoas irão sofrer, pelo menos, um episódio de lombalgia», alerta Luís Cunha Miranda. O especialista diz que, «anualmente, a prevalência varia entre 25 a 45% e as mulheres têm um risco superior (32% nos homens e 40% nas mulheres)», com uma maior incidência entre os 35 e os 55 anos.
Não se sabe quais as razões principais dessa maior prevalência, contudo algumas situações contribuem para essa dor, em particular, «o menor desenvolvimento muscular e os espaços de trabalho e domésticos não adaptados à mulher, sendo a utilização da pílula também apontada em alguns estudos como implicada no aumento da lombalgia». Outra situação em que existe um aumento das queixas de dor lombar é a gravidez, cuja taxa de dor lombar pode variar «entre 48% e 90%».
Por outro lado, o tabagismo, a obesidade, a baixa atividade física, a postura e as alterações da coluna, bem como os fatores psicológicos, aliados à idade e à predisposição genética, favorecem o desenvolvimento desta patologia. Luís Cunha Miranda esclarece que «o sedentarismo, por si só, não é a causa principal do aparecimento desta doença, contudo uma boa forma física resultante de exercício físico regular parece ser fator de proteção de aparecimento da lombalgia bem como da sua passagem a dor crónica».
Como prevenir e tratar
A base da prevenção da lombalgia está na correção dos fatores de risco. Segundo Luís Cunha Miranda, «deixar de fumar, ter cuidado com as posturas e com os pesos, quer em meio laboral quer nas atividades diárias em casa, e a manutenção de exercício adaptado regular são pontos importantes para a prevenção». Quando a lombalgia se prolonga por algumas semanas ou quando tem características diferentes do habitual («adormecimento e sensação de formigueiro ou queimadura ou a irradiação da dor para as virilhas ou para as pernas»), deve consultar-se o médico de família para este avaliar e orientar uma consulta de especialidade caso seja necessário.
«O tratamento deve ter em conta o que desencadeia essa mesma dor», revela o reumatologista. «O plano terapêutico farmacológico ou não farmacológico poderá passar por anti-inflamatórios, analgésicos, programas de medicina física e de reabilitação, podendo chegar à cirurgia», indica, acrescentando ainda que «um dos mitos da dor lombar que deve ser erradicado é o de que o repouso absoluto é obrigatório; hoje sabe-se que este deve ser um repouso ativo».
Dores pélvicas
A dor que ocorre na altura da menstruação, também chamada dismenorreia pode ser de dois tipos, primária e secundária.
Tereza Paula, ginecologista na Maternidade Alfredo da Costa, explica que a dismenorreia primária não está associada a qualquer tipo de patologia. «Ocorre tipicamente nos primeiros anos após a idade da primeira menstruação, ou seja, no final da adolescência e início dos 20 anos», indica a especialista. A sua causa não está completamente esclarecida.
Segundo a especialista, «aceita-se que é devida à produção de uma prostaglandina (F2 alpha) que estimula a contração das fibras musculares do útero e diminui a circulação sanguínea provocando assim a dor». Por outro lado, a dismenorreia secundária está associada a patologias como, por exemplo, endometriose, doença inflamatória pélvica, quistos do ovário, estenose do colo do útero, adenomiose, tumores uterinos, pólipos e congestão pélvica. Este tipo de dismenorreia geralmente ocorre numa idade mais tardia, entre os 30 e os 45 anos, de acordo com a especialista.
Como prevenir e tratar
A dismenorreia primária pode ser prevenida ou controlada através de «contracetivos orais e anti-inflamatórios não esteroides», segundo Tereza Paula. Mas, no caso de ocorrerem dores muito fortes, é recomendável recorrer ao médico para despistar alguma patologia que seja responsável pelas dores. Para além disso, a especialista alerta ainda para a necessidade de despiste da dor pélvica crónica, por ser um problema comum e difícil de resolver. De causa desconhecida e de uma resposta fraca ao tratamento, «a sua abordagem deve ser multidisciplinar, pois podem estar envolvidas disfunções da bexiga, do intestino e sexuais, bem como depressão e ansiedade. O tratamento inclui analgésicos, antidepressivos e deve ser feita também uma abordagem psicoterapêutica».
Texto: Claúdia Vale da Silva
Revisão científica: José Pereira Monteiro (presidente do Colégio de Neurologia da Ordem dos médicos), Jaime Branco (professor de Reumatologia na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa), Luís Cunha Miranda (reumatologista) e Tereza Paula (ginecologista na Maternidade Alfredo da Costa)
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