Uma relação amorosa funciona quase sempre num contínuo entre dois polos opostos: o da realização e o do desastre. Nos casais onde pelo menos um dos parceiros tem uma Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA) esta premissa não será diferente. Mas a verdade é que alguns estudos ao longo do tempo nos têm mostrado que um indivíduo com uma PHDA tem quase o dobro da probabilidade de se divorciar, e outros mostram-nos ainda que cerca de 58% destas relações apresentam características clinicamente disfuncionais.

Ainda assim, voltemos à tal premissa inicial, e pensemos então acerca dos ingredientes que podem tornar estas relações particularmente desafiantes para ambos os parceiros. Desde logo deparamo-nos com o facto dos próprios sintomas da PHDA, que decorrem de dificuldades ao nível da impulsividade, da desatenção, da auto-regulação e do funcionamento executivo, serem muitas vezes confundidos e erradamente interpretados, se não vejamos: é bastante provável que o parceiro com uma PHDA seja muitas vezes esquecido, distraído e muito desorganizado, ou seja que falhe bastante mais vezes do que gostaria (e seria esperado!) com as suas responsabilidades e obrigações (para consigo e para com o seu parceiro). Também sabemos que é bastante provável que o parceiro com PHDA possa ter uma maior dificuldade em comunicar de forma eficaz, que reaja mais vezes de forma muito intensa e excessiva com as suas emoções, que perca a cabeça com relativa facilidade e que diga, de forma impulsiva, coisas muito destrutivas e que magoam o outro (coisas essas que as desculpas depois do jantar, pouco ou nada adiantarão).

A verdade é que é mais fácil, muito fácil que situações semelhantes a estas aconteçam e sejam vividas por ambos. Assim como também será mais fácil, que na continuidade e com o passar do tempo, estas situações e comportamentos tendam a ser interpretadas pelo outro como falta de amor ou de cuidado (como se o parceiro já não gostasse de si), e até mesmo como um certo desinvestimento na relação – “se já lhe disse tantas vezes, porque é que ele(a) não faz?”, “está sempre a cometer os mesmos erros”, “e se ele(a) quer, porque é que as coisas nunca mudaram até hoje?”.

Para além deste lado (pois este é só um dos lados da relação), não esqueçamos o outro: o lado do indivíduo com PHDA, alguém que não raras vezes começa a sentir que o companheiro que escolheu se tornou num controlador incansável, que tentar conferir, verificar e inspecionar cada pormenor da vida em comum. E talvez pior do que isso, que pode sentir que não importa o quanto se esforce, nem o quanto tente fazer (ao seu jeito!), nunca terá feito o suficiente para deixar o seu companheiro satisfeito naquela relação. E é quando este ciclo se instala na rotina do casal que começam as dificuldades que são verdadeiramente difíceis de gerir. Frequentemente, este parece um problema sem resolução aparente, e muitos sentirão que mais vale desistir. Contudo parece importante reforçar que existem soluções alternativas a esta, e que pensar a PHDA como um conjunto de características e tendências, positivas ou negativas, que orientam e definem a forma de estar da pessoa é apenas o início de uma jornada.

Só assim, se pode também aprender que essas mesmas características podem ser geridas com estratégias adequadas, ou mesmo com uma intervenção estruturada e especificamente dirigida às dificuldades nucleares da PHDA (a nível individual) e ao seu impacto na relação (ao nível do casal), encorajando sempre o esforço, o optimismo e a paciência necessárias para fazer o caminho de mãos dadas. Conhecer a PHDA, empatizar, procurar ajuda, tentar de forma diferente em vez de tentar sempre mais e igual, e nunca esquecer que são sempre precisos dois para se dançar um tango, serão sempre partes dessa jornada para uma relação mais feliz e plena.

Mariana Rigueiro Neves – Consulta da PHDA no Adulto

mariana.neves@pin.com.pt

PIN – Progresso Infantil 

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