Naquela que é descrita como a primeira pesquisa abrangente sobre a experiência de criminalidade entre a população da UE (incluindo Reino Unido e Macedónia do Norte, único país não-comunitário que tem estatuto de observador junto da Agência para os Direitos Fundamentais), concluiu-se que, no ano que precedeu a pesquisa, quase um em cada três europeus foram vítimas de assédio (o que representa 110 milhões de pessoas) e 22 milhões foram fisicamente agredidos.
O estudo – que envolveu 35 mil inquiridos, entre janeiro e outubro de 2019 – revela que 9% das pessoas na UE experimentaram algum tipo de violência nos últimos cinco anos, com percentagens nacionais entre os 3 e os 18 por cento.
No caso do assédio, 41% dos europeus reconhecem tê-lo experienciado, com taxas que variam entre os 15 e os 62%. Esta percentagem reduz significativamente se o assédio tiver ocorrido no espaço virtual (14%).
Para justificar o desfasamento entre a pesquisa e os dados oficiais relativos à criminalidade, a Agência para os Direitos Fundamentais (FRA, na sigla em inglês) nota que “as vítimas de crimes, tipicamente, não reportam as suas experiências” e que “frequentemente têm dificuldades em aceder aos seus direitos e podem sentir-se sem voz”.
Apenas um terço das vítimas reportou os ataques físicos sofridos e somente um décimo fez o mesmo no caso do assédio.
A denúncia aumenta se a violência física tiver um caráter sexual (para 60%), mas diminui se o agressor for familiar (22%).
A agência com sede em Viena, capital austríaca, considera que agora ficou clara “a real extensão do crime na UE” e aponta os grupos mais vulneráveis: nos últimos cinco anos, foram mais vítimas de ataques físicos os jovens dos 16 aos 29 anos (23%), as pessoas de minorias étnicas (22%), as pessoas LGBTI ou não-heterossexuais (19%) e as pessoas com deficiência (17%).
Citado no comunicado sobre os resultados da pesquisa, o diretor da FRA, Michael O’Flaherty, assinala que a UE tem legislação para assegurar proteção às vítimas de crimes, mas os governos nacionais “têm de fazer mais para garantir às vítimas os seus direitos e fornecer-lhes o apoio de que precisam”.
Por outro lado, “as vítimas frequentemente desconhecem os seus direitos” e acabam por não reportar os crimes por “medo de retaliação ou intimidação por parte dos agressores”.
É ainda frequente que as vítimas considerem que a agressão que sofreram não foi grave. Entre as principais razões para não denunciarem o sucedido estão ainda a incompetência das autoridades (23%) ou mesmo a falta de confiança na polícia (14%).
A FRA insta os Estados-membros a que garantam o acesso à justiça, providenciando a todas as vítimas “informação adequada, apoio e proteção”, nomeadamente habilitando-as a avançarem com procedimentos criminais.
Apenas um em cada três inquiridos reportou à polícia os casos de violência física e os episódios de assédio foram denunciados por apenas 11%. “Os grupos que são mais alvo de crimes de ódio – pessoas de minorias, LGBTI e com deficiência – reportam incidentes de violência mais frequentemente”, nota a FRA.
Os governos devem “prestar particular atenção às necessidades específicas” dos grupos mais vulneráveis e informá-los “de uma forma que eles percebam”, apela a agência.
Além disso, acrescenta, o apoio prestado às mulheres deve ser melhorado. Mais de um terço da violência física contra as mulheres aconteceu em casa (37%), com 69% a indicarem efeitos psicológicos posteriores.
Nos casos de assédio, perto de três em quatro casos (72%) foram praticados por pessoas que elas não conheciam e a maioria aconteceu em público.
Perto de duas em três mulheres assumem que evitam ir para locais sem gente (apenas 36% dos homens) e 41% admitem ter receio de ficarem sozinhas com alguém conhecido de quem temam investidas de assédio ou agressão (apenas 25% dos homens).
Já quando os homens são vítimas, a violência acontece mais no espaço público e é mais perpetrada por desconhecidos.
Como os agressores são maioritariamente homens (numa proporção “esmagadora” se estivermos a falar de violência física, realça a FRA), os Estados-membros devem incluí-los na educação para a prevenção da violência.
A FRA assinala as disparidades entre os Estados-membros, que refletem “diferenças de cultura e níveis de confiança”, mas, em geral, mais pode ser feito para “encorajar e facilitar” a denúncia do crime.
O relatório também avaliou os crimes de roubo e fraude (bens e serviços). No primeiro caso, a média europeia situa-se nos 8% nos últimos cinco anos, enquanto que no segundo sobe para 26% - e aqui, os jovens e os mais instruídos são mais vulneráveis, "possivelmente porque fazem mais compras online”, aponta a FRA.
Tanto nuns como noutros, estes crimes têm taxas de denúncia mais altas (72% no roubo, 95% na fraude bancária).
Se mais de metade dos europeus interviria se presenciasse um caso de violência, já apenas 17% estariam disponíveis para testemunhar em tribunal.
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