Que doenças são estas?

As Doenças Congénitas da Glicosilação são uma família de doenças metabólicas raras, de cariz genético e hereditário. Atualmente conhecem-se mais de 100 diferentes formas de CDG, sendo que, na sua maioria, estas síndromes são multi-sistémicas, pediátricas, altamente incapacitantes e com uma grave componente neurológica.

Luísa Diogo, médica pediatra
Luísa Diogo, médica pediatra créditos: PR

Como surgem?

Estas doenças surgem quando ocorrem defeitos na maquinaria de adição de açúcares (glicosilação) a proteínas e/ou lípidos. A importância deste mecanismo molecular, a glicosilação, pode ser melhor compreendida pelo seu envolvimento na patofisiologia de uma grande variedade de doenças humanas comuns, incluindo o cancro, a diabetes mellitus, a doença de Alzheimer, doenças cardiovasculares, imunológicas e infeciosas.

Há alguma forma de prevenção?

O diagnóstico atempado é essencial para que os doentes e famílias possam receber o melhor acompanhamento clínico disponível para cada tipo de CDG, assim como para que as famílias possam receber aconselhamento genético adequado numa gravidez posterior, uma vez que se trata de doenças hereditárias.

Qual é a frequência da sua incidência?

Estima-se que a forma mais frequente da doença - PMM2-CDG (CDGIa) - possa ter uma incidência de 1/20.000. No entanto apenas se conhecem cerca de 1.000 casos em todo o mundo.

Como é feito o diagnóstico?

Entre os principais fatores que contribuem para o subdiagnóstico destas patologias incluem-se o desconhecimento destas doenças por parte dos profissionais de saúde e manifestações clínicas transversais e comuns a outras patologias mais frequentes. Estes mesmos fatores resultam num tempo médio até ao diagnóstico de 2 a 5 anos.

Existem diversos métodos de diagnóstico, sendo que alguns são específicos de alguns subtipos da doença. Todavia, a focagem isoelétrica da transferrina (a transferrina é uma glicoproteína sanguínea, ou seja, uma proteína modificada com açúcares, presente no sangue) é o método standard de rastreio para um grande número de CDG e envolve uma simples análise sanguínea. Todavia, este é apenas um teste preliminar, sendo que, metodologias adicionais, mais complexas, incluindo a análise genética, são necessárias para obter um diagnóstico definitivo.

O diagnóstico pode ser feito no período pré-natal, em duas circunstâncias: quando há um prévio diagnóstico na família (caso “índex”) com alteração genética identificada, ou quando os sinais e sintomas exibidos pelo feto o façam suspeitar.

Estas doenças podem matar?

Os doentes têm mortalidade aumentada, sobretudo nos primeiros anos de vida, devido a infeções ou insuficiência de um orgão vital como o fígado ou o coração.

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É possível ter qualidade de vida com estas doenças?

Estas doenças estão associadas a acentuada morbilidade, com atingimento frequente do sistema nervoso e possível envolvimento multissistémico, sem que haja ainda um tratamento eficaz. Os doentes e famílias podem no entanto conseguir uma razoável qualidade de vida, desde que tenham acesso a informação adequada sobre a natureza da sua doença, a vigilância clinico-laboratorial regular, com prevenção/antecipação e tratamento de eventuais complicações e aos indispensáveis apoios sócio-económicos.

A conjugação de esforços entre serviços de saúde especializados, apoios educativos e sociais personalizados, e as famílias é crucial. Neste contexto, destaca-se o papel das associações de doentes.

Tratam-se de patologias crónicas ou podem desaparecer ao longo da vida?

São doenças genéticas, crónicas, que se mantém ao longo da vida. Apesar de poderem apresentar mortalidade elevada em idades jovens, habitualmente não cursam com neurodegeneração e pode verificar-se uma estabilização prolongada do quadro clínico e mesmo algum grau de recuperação funcional em alguns doentes.

O tratamento é apenas farmacológico?

A grande maioria das CDG não tem qualquer terapia disponível. Alguns subtipos parecem beneficiar da ingestão de determinado tipos de açúcares.

O transplante de órgãos, nomeadamente de fígado e coração, teve sucesso terapêutico em alguns doentes que apresentavam falência. Contudo, para a maior parte dos doentes, apenas é possível fazer a gestão das diferentes manifestações clínicas prevenindo e/ou tratando as diferentes complicações.

As explicações são da médica pediatra Luísa Diogo a propósito do Dia Mundial para a Consciencialização das Doenças Congénitas da Glicosilação (16 de maio)