“O facto de os indivíduos mais velhos terem sido os mais atingidos pela mortalidade por covid-19 tem um impacto nas tendências de envelhecimento da população. No curto prazo, regista-se um certo rejuvenescimento da estrutura etária – não por aumento da natalidade, mas por decréscimo da sua população mais velha – e uma diminuição do índice de longevidade”, adianta o relatório “Pandemia de COVID-19: Desafios para a saúde dos portugueses”.
Segundo o documento deste órgão independente de consulta do Governo, em 2020, primeiro ano da pandemia, registou-se um excesso de cerca de 12 mil óbitos, comparando com o número médio de mortes observadas entre 2016 e 2019.
“Este excesso de mortalidade iniciou-se logo no mês de março de 2020, continuando ao longo dos restantes nove meses desse ano, e nos meses de janeiro, fevereiro e de julho a dezembro de 2021, ainda que com menor expressão”, adianta o documento do CNS presidido por Henrique Barros.
Em 2020, as regiões com maior excesso de mortalidade, comparando com a média de 2016-2019, foram o Norte, com 154 óbitos por 100 mil habitantes, o Alentejo (144 mortes) e a Área Metropolitana de Lisboa (106 mortes).
“Se o excesso de mortalidade observado em março e abril e de outubro em diante coincidiram com os picos de incidência da infeção (primeira, segunda e início da terceira vaga), o excesso de mortalidade sentido no final de maio e entre julho e agosto de 2020 não coincidiu com incidências elevadas no país”, revela o documento.
A taxa de mortalidade em Portugal subiu de 10,9 por mil em 2019 para 12 em 2020 e cerca de 19 mil pessoas perderam a vida com covid-19 até ao final de 2021.
“Se cerca de 80% dos casos de infeção registados ocorreram em indivíduos abaixo dos 65 anos, já 93% dos óbitos COVID-19 atingiram as franjas mais velhas de população (acima dos 65, com especial destaque para os mais de 85)”, refere o relatório.
O CNS alerta ainda que a natalidade e a fecundidade podem ter sido – ou vir ainda a ser – influenciadas pela pandemia e pela alteração da vida quotidiana dos portugueses.
Os dados publicados no documento indicam que, em 2020, nasceram 84.426 crianças em Portugal, menos 2.294 do que na média dos anos 2016-2019 e, no final de 2021, os dados provisórios indicavam que tinham sido registados apenas 79.548 recém-nascidos, o que corresponde a menos 4.878 do que no ano anterior.
“A queda entre 2019 e 2021 vem reforçar essa tendência, para a qual podem ter contribuído o medo da pandemia, os constrangimentos económicos e sociais colocados às famílias, a dificuldade de as franjas mais jovens de população acederem a condições de vida autónomas que lhes permitam sequer perspetivar um projeto de procriação”, avança o CNS.
Quanto à esperança média de vida, baixou dos 81,8 em 2019 para 81,1 em 2020, “facto que não serão alheios os impactos, diretos e indiretos, da pandemia”, refere o relatório, que salienta também que, de 2020 para 2021, houve uma redução dos níveis de stresse, ansiedade e depressão dos portugueses.
Essa diminuição reflete uma adaptação generalizada às adversidades da pandemia, ainda que menos evidente em alguns grupos populacionais, como nas mulheres, nas pessoas desempregadas e com doença crónica, explica o relatório.
Neste capítulo dedicado aos indicadores sociais e demográficos, o documento concluiu também que os trabalhadores pouco qualificados de baixas remunerações, com contratos precários ou envolvidos na economia informal, foram “não só como dos mais atingidos pela pandemia, como os que suportam intensamente as suas consequências negativas sobre o seu nível de vida”.
Relativamente à educação durante a pandemia, que teve dois períodos de suspensão da atividade presencial nas escolas durante 2020 e no primeiro semestre de 2021, o CNS constatou que, comparativamente com outros países, Portugal foi dos que “adotou uma política mais severa nesta matéria, sem que se fundamentasse verdadeiramente a evidência científica que a suportava”.
O documento adianta que, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, em 2020 e 2021 (descontando férias, fins de semana e feriados), as escolas até ao nono ano fecharam cerca de 100 dias, “dados que contrastam com os de outros países europeus, nomeadamente Espanha, Bélgica ou França (cerca de 50)”.
O documento, que é apresentado hoje numa sessão na Assembleia da República, analisa o impacto da pandemia nos principais indicadores sociodemográficos, na saúde mental da população e na prestação de cuidados de saúde.
Criado em 2016, o CNS é um órgão independente de consulta do Governo, que visa garantir a participação dos cidadãos na definição das políticas de saúde e promover uma cultura de transparência e de prestação de contas perante a sociedade.
PC // ZO
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