Leiria é o único hospital do Serviço Nacional de Saúde a realizar esta intervenção à tiroide, que não deixa marcas visíveis e tem uma rápida recuperação.
Pouco passava das 09:30 de dia 15, quando o cirurgião Jaime Vilaça e a sua equipa entraram no bloco operatório, onde a paciente, uma mulher de 28 anos, começou a ser anestesiada.
Dois furinhos na axila e um na zona da aréola permitiram a introdução dos dispositivos, que permitem introduzir uma microcâmara de alta resolução ao interior do corpo e instrumentos altamente delicados.
A lente é os olhos do cirurgião Jaime Vilaça, que vê todo o interior como se estivesse ‘in loco’. Com um trabalho de alta precisão, vai abrindo caminho até chegar ao tumor, retirá-lo para um saco ainda dentro do corpo, puxado pelos dispositivos.
Pelo caminho, é usado um sensor para identificar o nervo da corda vocal e assegurar o melhor dos resultados.
Para assinalar o Dia Mundial da Tiroide, a agência Lusa foi convidada a assistir à cirurgia endoscópica transaxilar no Hospital de Santo André, do Centro Hospitalar de Leiria, que iniciou este tipo de intervenção em setembro de 2022.
“Isto é um tipo de cirurgia minimamente invasiva, que traz vantagens inequívocas para os doentes. Desde logo, uma ótima recuperação e um resultado estético fantástico, porque não se consegue perceber que a pessoa foi intervencionada. Depois, beneficia de todos os grandes benefícios da cirurgia endoscópica: uma imagem amplificada, com uma iluminação otimizada em que conseguimos perceber e ver muito bem todas as estruturas nobres que temos de preservar nesta operação”, explicou Jaime Vilaça, no final da cirurgia.
O especialista iniciou este tipo de intervenção em 2014, no setor privado.
“Hoje, temos mais de 200 casos tratados e iniciámos um programa com o nosso hospital [Leiria] em setembro do ano passado. Já temos aqui cerca de duas dezenas de casos tratados. Os resultados têm sido muito apreciados pelos nossos doentes. Parece-nos que o SNS precisa desta modernidade”, sublinhou.
Segundo Jaime Vilaça, o CHL “está muito empenhado em trazer inovação e educação ao âmbito da cirurgia, com estes avanços que podem trazer uma melhoria muito grande para a recuperação dos doentes e para o seu resultado final”.
As técnicas endoscópicas e as tradicionais são como “um músico que domina a pauta, mas que quer aprender um outro instrumento”.
“Um violino nada tem a ver com o piano. A técnica é toda ela diferente, ainda que a melodia possa ser a mesma, porque o propósito da intervenção é o mesmo”, comparou o cirurgião.
Jaime Vilaça adiantou que, para pessoas jovens, “com uma vida ativa e laboral”, esta cirurgia “tem um grande benefício”, pois tem “uma recuperação rápida, pouca dor e não apresenta cicatriz”.
Assim, não há a “estigmatização de as pessoas saberem a intervenção que foi efetuada”.
“Isso pode ter um impacto importante em termos laborais, no mundo competitivo como hoje é”, realçou.
Natércia Alves, 43 anos, foi uma das primeiras utentes a ser intervencionada por este método em Leiria: “Pensei que seria uma operação tradicional, com o corte no pescoço”, revelou, ao assumir que o facto de ser uma “nova experiência” a deixou algo inquieta, mas confiou.
“A recuperação foi boa. Correu sempre tudo bem. Não tive muitas dores. Como trabalho na parte estética, ajuda um bocadinho e estou contente com os resultados”, disse.
Também José Gomes Soares, 76 anos, o primeiro a ser intervencionado em Leiria, está “satisfeitíssimo” com a cirurgia endoscópica transaxilar da tiroide: “Fiquei com umas pequenas rugas, efeito do nódulo que tinha à volta do pescoço, com cinco centímetros. A recuperação foi boa e estou impecável”.
O diretor clínico, Salvato Feijó, realçou que esta intervenção “vem na sequência de um investimento que o CHL tem feito nos últimos anos na diferenciação, na inovação e a criar condições para atrair capacidade técnica e novos elementos para preencher o quadro hospitalar com técnicas inovadoras”.
Segundo o médico, esta é uma técnica “muito menos interventiva, portanto, é um passo em frente na cirurgia da tiroide, seja ela da patologia benigna seja da patologia maligna”.
No último ano, o serviço de Endocrinologia do CHL fez cerca de 650 punções tiroideias.
“Uma grande percentagem destes doentes tem de ter sequência de intervenção cirúrgica. Temos muitos doentes com patologia tiroideia na região e esta é uma técnica que vai forçosamente ter muito maior expressão. Fizemos uma aposta correta”, reconheceu.
A causa mais frequente desta intervenção é o “nódulo suspeito e tratamento de tumores malignos”.
Segundo Jaime Vilaça, “já foi feita uma cirurgia de ressecção total da glândula tiroideia por via endoscópica, que foi a primeira a fazer-se em Portugal”.
Estima-se que as doenças da tiroide afetem cerca de 10% dos portugueses, com maior incidência no sexo feminino, cerca de 90% dos casos.
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