“Seria um erro grave, do ponto de vista da própria saúde pública, coletiva, não incluir os imigrantes nos planos nacionais de vacinação, segundo os mesmos critérios aplicados aos cidadãos nacionais [por exemplo idade e doenças associadas]”, afirmou o português António Vitorino, em entrevista à Lusa através da plataforma de videoconferência Zoom.

A Organização Internacional para as Migrações (OIM) tem insistido no apelo à inclusão dos imigrantes nos planos nacionais de vacinação, “em igualdade de circunstâncias com os cidadãos” dos países de destino.

“Não se trata de criar uma bolha prioritária para imigrantes, de maneira nenhuma”, descartou António Vitorino, que participou, na terça-feira, numa conferência ministerial dedicada às migrações, realizada em Lisboa pela presidência portuguesa do Conselho da União Europeia (UE).

“Não se trata de nenhum privilégio, antes pelo contrário”, porque “mutas vezes os imigrantes têm relutância em contactar os serviços de saúde”, particularmente os que se encontram em situação irregular, assinala.

O que é preciso — frisa — é estabelecer “uma relação de confiança” entre o Estado e os migrantes.

“Pelo superior interesse da saúde pública, os Estados não devem utilizar o processo de vacinação para outros efeitos que não sejam exclusivamente os de saúde e [devem] dar garantias de que não utilizam o processo de vacinação para aplicar medidas de política migratória, designadamente expulsar as pessoas”, especifica.

O diretor-geral da OIM admite como “evidente que a travessia de fronteiras no futuro vai ter de incorporar um conjunto de critérios de saúde”, mas adverte que esses critérios “têm de ser objeto de um debate”, dado “o risco sério de criar uma divisão” — em infraestruturas e qualificações — entre países “mais desenvolvidos” e “menos desenvolvidos”, que poderão “não ter condições” para fazer um controlo rigoroso.

“É um desafio muito grande, porque estamos implicitamente a aceitar que possa haver uma mobilidade a duas ou mesmo três velocidades”, reconhece.

“Não há recuperação económica, não há retoma do comércio internacional, se, ao mesmo tempo, não houver retoma da mobilidade humana. Este não é só um problema (…) dos países mais pobres, é um problema coletivo e têm de se encontrar respostas coletivas”, vinca António Vitorino.

Sobre a suspensão das patentes das vacinas contra a covid-19, proposta pelos Estados Unidos, António Vitorino considera que “a proposta americana é um sinal político muito importante”, mas também que a UE “tem razão” quando diz que essa opção não terá efeitos a curto prazo.

“Vejo com bons olhos a iniciativa”, reconhece, sublinhando, porém, que “o grande problema” é a falta de capacidade de produção de vacinas.