Em declarações na abertura da 32ª Conferência Regional para África da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), a decorrer entre hoje e a próxima quinta-feira em Malabo, capital da Guiné Equatorial, Gabriel deu ainda conta de que o continente africano foi igualmente a região no mundo onde a pandemia de covid-19 mais se fez sentir relativamente à qualidade da nutrição.
A má nutrição prevalecente em 2021 alcançou 21% da população total africana de 1,3 mil milhões de pessoas, “o que foi mais de o dobro do que se passou em qualquer outra região do mundo”, sublinhou diretor-geral adjunto da FAO.
“Relatórios recentes indicam que os níveis de insegurança alimentar extrema nos países da região do Sahel e da África Ocidental quase quadruplicaram entre 2019 e 2022”, disse ainda Abebe Haile Gabriel. O número de pessoas expostas a uma eventual situação de crise ou ainda pior nestas zonas do continente passou de 10,8 milhões em 2019 para 40,7 milhões em 2022, acentuou o responsável.
David Phiri, coordenador da FAO para a sub-região da África Oriental, a quem coube a responsabilidade de apresentar as prioridades da organização para o próximo biénio no continente, deu conta de que “um total de 490 milhões de pessoas em África viviam em pobreza extrema em 2021”, número que soma 9 milhões de pessoas ao registado em 2019.
Por outro lado, “cerca de mil milhões de pessoas em África não tinham como suportar uma dieta saudável em 2020”, acrescentou Phiri.
Acresce que, se a pandemia de covid-19 “levou à maior contração das economias da África subsariana em toda a história”, de acordo com o mesmo responsável, a guerra na Ucrânia e as suas repercussões globais ameaçam fortemente quaisquer perspetivas de uma recuperação rápida e consistente.
“O crescimento económico, que se previa que pudesse crescer de -1,7% do Produto Interno Bruto no conjunto de países da África Subsariana em 2020 para 3,7% em 2021 e 3,8% em 2022 pode bem estar comprometido pelo que está atualmente a passar-se fora do continente africano”, afirmou o coordenador da FAO.
“Processos e eventos à escala global estão a produzir impactos importantes nos sistemas agroalimentares de África. Por exemplo, a guerra na Ucrânia está a afetar as cadeias de abastecimento alimentar e os preços, assim como o fornecimento de fertilizantes, em particular nos países cujas importações são principalmente provenientes e um ou dos dois países envolvidos na guerra”, sublinhou Haile Gabriel.
“A recuperação dos impactos provocados pela pandemia de covid-19 tem construído um desafio importante em muitos países em África. Os impactos nos países mais vulneráveis pode ser devastador”, alertou o mesmo responsável.
As alterações climáticas estão também a produzir efeitos dramáticos no continente. De acordo com o diretor-geral adjunto da FAO, “comunidades no Corno de África estão a passar uma das mais severas secas de que há memória na sequência de três pobres estações de chuvas”.
“Estimativas recentes mostram que nos próximos três meses entre 13,1 e 14,1 milhões de pessoas estarão em situação de crise de insegurança alimentar ou ainda pior devido à seca”, mas o que torna a situação “ainda pior” é o facto de os mecanismos e capacidades para mitigar estes choques múltiplos serem fracos ou inexistentes”, lamentou Gabriel.
Neste contexto, a transformação dos sistemas agroalimentares em África “é urgente”, segundo a FAO. A modernização da agricultura e a transformação rural desempenha um papel central no desenvolvimento sustentável e prosperidade para África, disse o diretor-geral adjunto da organização, que deixou, porém, um aviso: “O tempo está a esgotar-se”.
Gabriel sublinhou que a Comissão da União Africana confirmou recentemente que a maior parte dos seus estados-membros estão a falhar nos compromissos assumidos no quadro dos objetivos para o desenvolvimento aprovados pela organização pan-africana, precisamente em Malabo, em 2014 e reforçou que “sem um esforço extraordinário dos países membros e de outros parceiros, será difícil alcançar essas aspirações”.
A conferência que decorre em Malabo é a mais alta instância de decisão da FAO em África. Nos próximos quatro dias, ministros da Agricultura e funcionários governamentais de mais de 50 países africanos, assim como grupos da sociedade civil, representantes do sector privado, parceiros para o desenvolvimento e países observadores tomarão decisões sobre as políticas a assumir em África, no quadro da estratégia da FAO para o período de 2022-2031.
“Melhor produção, melhor nutrição, melhor ambiente e melhor vida sem deixar ninguém para trás” é o mote escolhido pela organização para grande parte das discussões a levar a cabo na conferência, que passarão pelas prioridades a definir nos domínios da ciência e ambiente, constituição de uma plataforma para a área da saúde, assim como pelas prioridades políticas para uma “cobertura inclusiva dos vários choques nos sistemas agroalimentares”, segundo Gabriel.
A promoção do comércio e investimento no quadro do Acordo de Comércio Livre africano e na garantia de que as mulheres e jovens não são deixados para trás na corrida da transformação dos sistemas agroalimentares foram outros dos compromissos assumidos pelos organizadores da conferência.
“A ação ao nível dos países é crítica. Acreditamos que o sucesso obriga a que trabalhemos juntos de forma coerente. Não há outra forma. Juntos podemos transformar a alimentação e agricultura”, afirmou Abebe Haile Gabriel.
Francisca Eneme Efua, ministra da Agricultura da Guiné Equatorial, fez uma declaração no mesmo sentido, em nome do país anfitrião dos trabalhos.
“A forme e a insegurança alimentar persistem no nosso continente, exacerbadas por desafios como a pandemia, os efeitos das alterações climáticas, os conflitos armados, o terrorismo, mercenários, surtos de pragas e doenças, tanto em animais como nas plantações”, começou por sublinhar a governante equato-guineense.
“Enfrentamos vários desafios nos nossos sistemas alimentares em África e estes requerem o nosso esforço concertado para os superar”, afirmou Francisca Eneme Efua.
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