Este sensor descartável viabiliza o desenvolvimento de testes de urina baratos e biodegradáveis e abre caminho para a deteção de outros biomarcadores importantes.
O papel, material que usamos no nosso dia a dia, pode permitir o desenvolvimento de sensores biodegradáveis e baratos capazes de detetar doenças. Foi esta a ideia explorada por uma equipa de investigadores do i3N e que foi publicada recentemente num artigo da Carbon, uma revista científica internacional sobre materiais de carbono. O artigo revela que sensores feitos diretamente a partir de papel podem detetar e quantificar, com sucesso, a concentração de ácido úrico em amostras reais de urina.
Bohdan Kulyk, um dos investigadores que participou no estudo, explica que um dos objetivos do projeto foi produzir um sensor flexível, sustentável e com um baixo custo de produção. Para desenvolver este sensor, a equipa liderada pela docente Florinda Costa utilizou espuma de grafeno, um material que pode ser obtido a partir de papel convencional. Bohdan adianta que a utilização de grafeno surge porque este é um material condutor de elevada razão superfície/volume e com excelente desempenho eletroquímico, abrindo assim a possibilidade de criar um "biossensor para deteção de parâmetros biológicos”.
Como transformar o papel num sensor?
A descoberta do grafeno em 2004 foi, para muitos cientistas, “a descoberta do século XXI” devido às suas propriedades únicas. O material, composto por uma única camada de átomos de carbono, é conhecido por ser leve, flexível e um excelente condutor de eletricidade.
Foi precisamente este material, o grafeno, que a equipa da UA utilizou para desenvolver o sensor de papel. Para isso, os investigadores utilizaram a tecnologia laser para produzir o “grafeno induzido por laser” (LIG – laser-induced graphene). Esta técnica, adianta António Fernandes, consiste em irradiar o papel com um feixe laser de forma a transformar a superfície do papel (celulose) em espuma de grafeno.
O investigador Nuno Santos refere que o sensor já foi testado em amostras de urina humana e revelou enorme seletividade, provando ser eficiente a detetar ácido úrico. Uma vez que não recorre a enzimas no processo de deteção, estes sensores apresentam uma estabilidade e durabilidade superiores aos sensores enzimáticos, sem necessidade de conservação/condicionamento específico antes da utilização. Adicionalmente, e ao contrário de muitos testes descartáveis qualitativos que existem atualmente, este sensor é quantitativo, permitindo aos seus utilizadores obter uma informação mais clara sobre os valores descritos no teste.
Outra vantagem destes sensores, explicam os investigadores, é que as pessoas podem utilizar os testes em casa e, espera-se, no futuro, que os sensores possam estar ligados a sistemas de transmissão de dados que enviam a informação diretamente para uma ficha clínica à qual os profissionais de saúde tenham acesso, libertando recursos médicos. Sónia Pereira acrescenta ainda que, além de ser muito barato, estes testes têm potencial para aplicações em situações em que o acesso ao diagnóstico é uma dificuldade.
O grafeno induzido por laser tem também sido explorado por esta equipa para desenvolver outro tipo de dispositivos, nomeadamente sensores físicos em poliimida e em cortiça, os quais foram obtidos no âmbito da tese de doutoramento de Alexandre Carvalho.
Os sensores em papel foram desenvolvidos no âmbito da tese de doutoramento de Bohdan Kulyk, financiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, com a parceria da Universidade Nova de Lisboa. O artigo é assinado por Bohdan Kulyk, Sónia Pereira, António Fernandes, Elvira Fortunato, Florinda Costa e Nuno Santos.
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