“Cabe ao médico de família saber o que fazer, acompanhar o doente e ajudá-lo a viver com a doença”, assumindo que “não vai passar, mas pode ser controlada”. Nesse sentido, “é fundamental manter uma boa hidratação da pele, sempre e toda a vida”.

HealthNews (HN) – Em Portugal estima-se que existam perto de 440 mil pessoas com dermatite atópica. Qual o papel do médico de família no diagnóstico e tratamento?

Rui Nogueira (RN) – Temos um papel bastante importante em três áreas: precocidade do diagnóstico, tratamento e monitorização e, não menos importante, explicar aos doentes o que é a dermatite atópica porque, provavelmente, quando se trata de adultos, irá acompanhá-los durante a vida inteira.

Nos lactentes é muito frequente mas, na maioria dos casos, ocorre uma remissão espontânea; nas crianças também pode haver alguma remissão mas nos adultos já não é assim.

Cabe ao médico de família saber o que fazer, acompanhar os doentes, ajudá-los, explicar-lhes o que é a doença e, desse modo, contribuir para aumentar a literacia em saúde e o conhecimento sobre a sua doença.

HN – Muitos doentes com dermatite atópica acabam por ser “reféns” da própria pele. Como é que os doentes lidam com a gravidade e imprevisibilidade da doença?

RN – As pessoas podem sofrer mais com esta doença se não a compreenderem e não souberem atuar com precocidade nas agudizações. Sendo uma doença crónica, será necessário ter uma atitude de autonomia e de compreensão da doença, no sentido de a controlar de uma forma precoce e manter sempre uma parte do tratamento: a boa hidratação da pele.

É absolutamente necessário que as pessoas tenham a preocupação de usar um creme hidratante. Sempre. Para toda a vida.

Este problema é mais grave e preocupante nas pessoas mais velhas, que já de si têm mais necessidade de hidratar a pele. Nestes doentes, é ainda mais premente hidratar de uma forma permanente, durante o tratamento e como prevenção, para evitar agudizações ou a sua severidade.

As pessoas com dermatite atópica também devem evitar a exposição solar excessiva. Há ainda a possibilidade de agravamento com alguns medicamentos, nomeadamente os diuréticos. Cada vez temos mais doentes hipertensos nos quais usamos diuréticos. Isso significa que temos de estar muito atentos a estas situações e considerar a dermatite atópica quando estamos perante a escolha de medicamentos para o doente hipertenso, adequando o tratamento a cada doente.

HN – Perto de 15% dos doentes tem dermatite atópica grave. Controlar a doença é uma realidade ou apenas uma utopia?

RN – Não é uma utopia, é uma realidade. Claro que não depende apenas da precocidade do diagnóstico mas também da precocidade do tratamento. As agudizações podem ser graves mas há doentes que, mesmo sem agudizações, têm dermatite atópica grave.

A gravidade também está relacionada com as zonas da corpo mais afetadas. Não nos esqueçamos que a pele é o maior órgão que possuímos e o mais visível. As dermatites atópicas são mais graves quando afetam zonas mais difíceis de tratar ou mais expostas, como a face.

HN – Como podem ser prevenidas as crises?

RN – A hidratação é fundamental. Sempre. E ainda com mais cuidado no início de uma crise ou quando os doentes detetam que se aproxima uma crise.

Parece também haver alguma relação com situações de maior stress. Claro que não está nas mãos de cada um poder evitar totalmente o stress, mas é possível aprender a viver de uma forma menos stressada e aumentar o autocontrolo para evitar situações que podem contribuir para a agudização da dermatite atópica.

HN – Os cremes hidratantes (emolientes) são a primeira linha de tratamento, mas os ingredientes que os compõem podem variar bastante. Quais os que devem ser evitados e porquê?

RN – Os hidratantes que devem ser evitados são aqueles que, de algum modo, possam ser agressivos ou tenham composições menos conhecidas. Aquilo que nos interessa num creme hidratante é simplesmente hidratar. Não deve, por isso, associar doses baixas de corticóides.

Os corticóides devem ser prescritos pelo médico e usados separadamente dos hidratantes. Até porque estes últimos usam-se em toda a pele, enquanto os corticóides são utilizados somente nas zonas atingidas pela dermatite atópica.

HN – No dia 14 de setembro assinala-se o Dia Mundial da dermatite atópica. Qual a mensagem que gostaria de deixar?

HN – O ponto mais importante é que o doente aprenda a viver com a sua dermatite atópica, aprenda a ver quando há agudizações, saiba atuar antes, e mantenha sempre uma boa hidratação da pele.

Não se deve adiar o início do tratamento. O médico de família, por estar muito perto das pessoas, tem de as ajudar no tratamento, adaptando-o a cada circunstância, assumindo que esta é uma doença crónica, que não vai passar, mas que pode ser controlada.