É a primeira vez que uma mutação no gene DAB1, um dos maiores do genoma humano e conhecido por ser essencial no desenvolvimento neurológico durante o período embrionário, é associado a uma doença neurodegenerativa.

O estudo de várias gerações de três grandes famílias portuguesas com esta ataxia ajudou a chegar a estes resultados e permitiu também o desenvolvimento de um novo teste genético que irá alargar as possibilidades de diagnóstico e aconselhamento genético a familiares mesmo antes dos sintomas aparecerem.

O teste permite também orientar a nível reprodutivo e psicossocial as muitas famílias com ataxias hereditárias de transmissão dominante, em que os filhos de um progenitor afetado tem 50% de probabilidade de herdar a mutação e vir a desenvolver ataxia ao longo da vida.

Segundo a investigadora Ana Seixas, “muitas vezes os familiares, sabendo que as hipóteses de tratamento são limitadas, dizem-nos que saber qual a doença que têm já ajudava”. Ana Seixas refere também que “foi um trabalho de grande complexidade, mas que valeu ainda mais a pena realizar porque podemos finalmente responder à generosa colaboração de gerações de famílias portuguesas com ataxia hereditária que participaram neste, e outros, estudos”.

Os investigadores do i3S descobriram que uma sequência repetitiva de nucleótidos – os blocos básicos do ADN onde está armazenada a nossa informação genética – no cromossoma 1 causa esta doença neurodegenerativa chamada ataxia SCA37, clinicamente muito semelhante à doença de Machado-Joseph, a ataxia hereditária mais comum em Portugal e com elevada prevalência nas ilhas dos Açores. No trabalho, explicam igualmente a razão pela qual os efeitos desta doença são mais precoces e, consequentemente, mais graves de geração para geração.

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Ataxias são doenças neurodegenerativas caracterizadas pela falta de coordenação de movimentos e pela falta de equilíbrio para as quais não existe tratamento. Estão associadas à degenerescência de determinadas áreas do cérebro e sobretudo do cerebelo, na sua maioria com origem genética. A SCA37, alvo deste estudo, já havia sido clinicamente descrita, mas a causa genética escapava ao escrutínio dos investigadores. Isabel Silveira, coordenadora do estudo, confessa que há mais de uma década tem andado à procura da mutação que causa esta doença e que a tarefa não foi simples, por diversos motivos. As três referidas famílias portuguesas permitiram-lhe seguir o rasto genético da doença e desvendar o segredo do problema.

Foi no gene DAB1 que se encontrou “uma nova sequência genética apenas presente nos doentes e ausente nos indivíduos saudáveis, a qual é responsável pelo desenvolvimento da ataxia” afirma Joana Loureiro, uma das autoras do artigo. “O DAB1 é essencial para o desenvolvimento neurológico no período fetal e mantém importante atividade na vida adulta especialmente no cerebelo, a região do cérebro mais afetada pela ataxia”, acrescenta Joana Loureiro.

Quando os investigadores introduziram a sequência alterada num embrião do peixe-zebra observaram o aparecimento de malformações graves e uma baixa taxa de sobrevivência dos embriões, provando a toxicidade que a sequência acarreta.

Por outro lado, “o acompanhamento das famílias, e 41 doentes em particular, foi essencial para perceber que esta ataxia apresenta efeitos mais graves de geração para geração”, afirma Isabel Silveira. Na verdade a doença pode surgir entre os 18 e os 60 anos e quanto mais cedo se inicia mais graves serão as consequências, pois progride com a idade. A equipa percebeu que o tamanho da sequência alterada aumentava ao passar de geração, particularmente se o progenitor portador for homem. E que quanto maior for o tamanho da sequência, mais cedo a doença se desenvolve. Até ao momento, todas as famílias identificadas são do sul do país, onde a frequência desta doença rara é elevada. Isabel Silveira pensa que “a causa genética agora descrita poderá estar também na origem da condição clínica de indivíduos de famílias de outras origens geográficas, nomeadamente algumas famílias espanholas que clinicamente estavam descritos como possuindo a SCA37, mas cuja causa genética ainda não é conhecida”.

A descoberta publicada na prestigiada revista científica norte-americana American Journal of Human Genetics é o ponto de partida para a investigação laboratorial de estratégias para o tratamento desta doença.

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