"Estamos a trabalhar com Angola, com Cabo Verde e com Moçambique para ver se iniciamos estudos em simultâneo em todos os países para podermos comparar os dados e os resultados", disse Filomeno Fortes, em entrevista à agência Lusa. "Temos as equipas criadas e os protocolos estabelecidos e estamos a ver se nas próximas semanas podemos começar a receber algumas amostras [em Lisboa] para apoiarmos alguns países no sequenciamento" do vírus, acrescentou.
O especialista em saúde pública sublinhou a importância de perceber se o vírus que está a circular em África e, nomeadamente nos países lusófonos, é o mesmo que está a circular em outros continentes, qual a intensidade da sua carga viral e a resposta aos tratamentos.
"Na possibilidade de se introduzir uma vacina daqui a um ano, vai ser importante saber que tipo de vírus circula ou terá circulado nestes países porque terá de ser específica para esse tipo de vírus", disse.
Por outro lado, Filomeno Fortes encorajou os países a fazerem também estudos de imunidade para perceberem qual a percentagem de população infetada e que possa estar imune.
Como exemplo dos progressos na investigação da doença, apontou Moçambique, onde foi já possível perceber que 75% dos infetados com o novo coronavírus são assintomáticos.
O IHMT está também a trabalhar com países lusófonos no estabelecimento de protocolos ligados à vigilância epidemiológica, adiantando que é preciso encontrar respostas para várias interrogações que estão a ser levantadas com a propagação da doença.
"Porque é que em muitos dos casos que aconteceram em Angola não houve transmissão domiciliar? Um indivíduo estava infetado, conviveu com a família durante vários dias até ser identificado e não houve transmissão da doença. É uma questão epidemiológica de interesse para percebermos este fenómeno", disse.
Especialista pede mais envolvimento das universidades
O diretor do Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT), Filomeno Fortes, pediu hoje aos governos dos países africanos lusófonos mais envolvimento das universidades no combate à pandemia de covid-19 e acesso aos dados sobre a doença.
"Há necessidade de um maior envolvimento da academia dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP). O apelo seria que os políticos procurassem trabalhar mais estritamente com a academia, que é fundamental nesta fase para evitar 'fake news' e identificar as boas práticas", disse Filomeno Fortes, em entrevista à agência Lusa.
O responsável do IHMT e especialista em saúde pública assinalou que, em regra, existe nos governos uma separação entre as áreas da ciência e tecnologia, onde se encontram as universidades, e da saúde e pediu, por isso, um trabalho mais próximo dos dois setores.
"Há necessidade de haver uma ligação entre os serviços de ciência e tecnologia e os serviços de saúde, mas tem de ser uma ligação real. Não pode haver dificuldades, por exemplo, no acesso aos dados", disse.
"Se a academia não tiver acesso aos dados e às equipas de terreno, vai ser difícil implementar estudos de investigação", acrescentou.
O Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) criou, em parceria com a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), uma plataforma 'online' para reunir conteúdos científicos em português sobre a pandemia de covid-19, o Centro de Informação COVID 360/IHMT/NOVA/CPLP.
Está ainda a trabalhar com os países da África lusófona na realização de estudos simultâneos sobre o novo coronavírus.
O IHMT/NOVA, que é observador consultivo da CPLP, quer, através da plataforma, fomentar a interação com técnicos e especialistas do espaço lusófono, em especial dos países africanos, facultar ferramentas de apoio aos seus planos de contingência e disponibilizar informação científica atualizada.
A organização tem também vindo a realizar uma série de seminários virtuais sobre a pandemia que tem como público-alvo os profissionais de saúde e investigadores dos países lusófonos.
O próximo evento está marcado para sexta-feira, 22 de maio, e vai abordar o aparecimento e desenvolvimento da pandemia na Ásia e Europa.
Para 29 de maio, está marcada nova sessão, desta vez dedicada ao aparecimento e desenvolvimento da pandemia na África lusófona.
Em África, há 2.997 mortos confirmados, com mais de 95 mil infetados em 54 países, segundo as estatísticas mais recentes sobre a pandemia naquele continente.
Entre os países africanos que têm o português como língua oficial, a Guiné-Bissau lidera em número de infeções (1.089 casos e seis mortos), seguindo-se a Guiné Equatorial (719 casos e sete mortos), Cabo Verde (349 casos e três mortes), São Tomé e Príncipe (258 casos e 11 mortos), Moçambique (156 casos) e Angola (58 infetados e três mortos).
O país lusófono mais afetado pela pandemia é o Brasil, com mais de 18.800 mortes e mais de 291 mil infeções.
Em todo o mundo, há mais de cinco milhões de casos da covid-19 e 328 mil mortos.
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