“Estas pessoas deveriam ter ido ao centro de saúde, deveriam ter sido logo encaminhadas no tratamento da diabetes, e provavelmente não teriam necessidade de internamento. Poderiam ter ficado em casa com uma supervisão online ou telefónico por parte do médico”, adiantou à agência Lusa José Manuel Boavida, sublinhando que nestes casos “os médicos e enfermeiros são absolutamente necessários e imprescindíveis”.
Durante o período de quarentena obrigatória, estima-se que entre 10 a 20 mil pessoas não conseguiram ter acesso a um diagnóstico e intervenção precoces, que é aquilo que mais permite evitar complicações e internamentos.
“Muita gente ficou por diagnosticar, o que quer dizer que serão diagnosticados mais tarde, e provavelmente com sequelas maiores, com uma reversibilidade da compensação mais difícil, e provavelmente com uma evolução das complicações”, disse o especialista, na semana em que se assinala o Dia Mundial da Diabetes (14 de novembro).
José Manuel Boavida disse que estavam a diagnosticar, em média, 200 pessoas por dia, cerca de 60 mil pessoas por ano, e que “um arrastamento desta situação pode levar a uma complicação muito grande do atendimento destas pessoas”.
“Se o pé diabético não é diagnosticado e tratado a tempo leva a um aumento das amputações”, advertiu, adiantando que já pediu ao Ministério da Saúde os números das amputações dos primeiros seis meses deste ano, que já existem ao nível dos hospitais, estando a aguardar reposta.
Em relação à retinopatia diabética, José Manuel Boavida disse que os rastreios que são feitos nos centros de saúde e na comunidade estão atrasados alguns estão mesmo suspensos.
“Isto pode levar a um atraso do tratamento de situações oftalmológicas, um aumento da cegueira e da diminuição da visão”, alertou.
Já no que respeita ao rim e à nefropatia, o endocrinologista lembrou que a diabetes é a principal causa de insuficiência renal e que o relato que é feito pelos nefrologistas é que “durante os meses do primeiro surto praticamente não houve ninguém a entrar em diálise, o que quer dizer que depois na fase do desconfinamento entrou muito mais gente em diálise”.
“As consequências destes atrasos só se podem medir a médio prazo, disse, sublinhando que é preciso “estar com uma atenção muito grande para ver os impactos e as necessidades destas pessoas”.
“Portanto, quer ao nível do pé, quer ao nível do rim, quer ao nível dos olhos, quer ao nível dos novos diagnósticos, são quatro fatores que claramente nos preocupam”, sublinhou.
Outro fator que preocupa a APDP “é o aumento da mortalidade” e a falta de esclarecimento sobre estes números, receando que “a diabetes seja uma das doenças que está por de trás deste aumento”.
Dados do INE divulgados a 30 de outubro indicam que, desde o início da pandemia, em março, morreram mais 7.396 mortes do que a média do período homólogo dos cinco anos anteriores, sendo a covid-19 responsável por 27,5% destas mortes.
“A diabetes como doença silenciosa, é uma doença devastadora, porque ela, tal e qual como um tsunami, vai subindo lentamente e quando dispara ela tem uma ação catastrófica sobre a vida das pessoas”, rematou.
Dados do Observatório Nacional da Diabetes indicam que nos primeiros seis meses a hospitalização para a população diagnosticada com covid-19 foi de 14,5%, enquanto nas pessoas com diabetes essa percentagem subiu para 43,3%, o que corresponde a três vezes mais.
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