O tempo vai refrescando, o Outono instala-se no dia-a-dia, com a natureza a dar os sinais da época: as copas das árvores a amarelarem, o Sol que teima em esconder-se sobre o manto de nuvens. Com os assomos do Inverno é reconfortante o calor proporcionado pela dúzia de castanhas, escaldando nas mãos, compradas em resposta ao apelo mais que apregoado do "quentes e boas".
Consideradas, actualmente, quase como uma "guloseima" de época, as castanhas, em tempo idos, constituíram um nutritivo complemento alimentar, substituindo o pão na ausência deste, quando os rigores e escassez do Inverno se instalavam. Cozidas, assadas ou transformadas em farinha, as castanhas sempre foram um alimento muito popular, cujo aproveitamento remonta à Pré-História.
Castanhas pelo São Martinho:
Assadas com sal grosso, cozidas com ervas aromáticas, secas tornando-se "piladas" e utilizadas depois de bem demolhadas, acompanhando em puré outros preparos, ou servindo uma sopa aveludada e cremosa, o consumo de castanhas estende-se de finais de Setembro até ao início da Primavera. São, contudo, particularmente procuradas e celebradas no dia de São Martinho, a 11 de Novembro.
Actualmente esbateram-se os festejos e raros são os que celebram a ocasião com circunstância, embora em restaurantes e associações se vá reabilitando a tradição.
Em tempos idos, eram comuns os "Magustos", ou seja, grandes fogueiras ao ar livre, no campo, "rodeadas de grupos alegres que cantam e dançam enquanto a fogueira medra e as castanhas estoiram" (Leite Vasconcellos/Vida Tradicional Portuguesa).
O vinho novo, jeropiga ou água-pé jorravam generosamente acompanhando as castanhas assadas, pois, como diz o adágio "no dia de São Martinho vai à adega e prova o vinho".
A Castanha na cozinha e tradição portuguesas:
Actualmente olhamos para a castanha e associamo-la a uma época particular, vendo-a praticamente como um deleite outonal. Contudo, noutros tempos, este fruto do castanheiro, encerrado num invólucro, lembrando um ouriço-cacheiro, possuía uma enorme importância na dieta alimentar dos portugueses. Assadas ou cozidas, as castanhas estão intimamente ligadas à tradição portuguesa.
O castanheiro, árvore de grande porte da família das fagáceas ou das castaneáceas, atinge grande longevidade; considerado para muitos povos, como um símbolo de perenidade, de fartura e abastança. O fruto do castanheiro, a castanha, eclode ao fim de 10 anos de vida da árvore, formando-se dentro de um ouriço.
O termo castanheiro aparece citado num documento em 960 d.C. muito antes da formação de Portugal (1143). A castanha foi, a par da bolota, um produto básico na alimentação, até aos séculos XV/XVI, altura em que se introduz no nosso país a batata e o milho. No decorrer do século XVI, em terras do Norte e das Beiras, consumiam-se mais castanhas do que pão.
No século XVII, a castanha era considerada um dos produtos básicos da alimentação dos beirões. Em anos maus chegou a ocupar o lugar do pão, que escasseava, (fazia-se a "falacha"), e a substituir as batatas.
Para além do valor económico que ainda hoje representa para algumas terras de Trás-os-Montes, a castanha utiliza-se cada vez menos em sopa no Minho e, com significado, no Alto Douro e Terra Fria Transmontana.
No Norte e na Beira Interior, regista-se a existência de grandes soutos, mas também há castanheiros na região de Entre-Douro-e-Minho e em serras como Sintra e Monchique. No Barroso fazia-se ainda há poucos anos um caldo de castanhas em que estas eram reduzidas a puré, a que se juntava apenas um pouco de unto.
Também nas feiras dos Santos da região de Valpaços, já raramente se encontra a marrã assada, acompanhada por castanhas assadas ou cozidas.
Os velhos transmontanos ainda usam as castanhas como alimento à noite. Comem-nas cozidas apenas em água e sal.
Para além da sua importância alimentar, a castanha encerra um significado simbólico arreigado às festas do Ciclo do Outono. É comum nas celebrações dos Santos, Fiéis Defuntos e S. Martinho.
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