Quando ouvimos falar de Terapia Familiar instantaneamente pensamos em famílias disfuncionais, parentalidade desadequada, pais pouco sensíveis, em resumo famílias doentes.

A ideia que a Terapia Familiar é um processo terapêutico para famílias que estão doentes, é em grande medida, baseada na crença que as perturbações do desenvolvimento ou os problemas de saúde mental da infância são simples reflexos da qualidade dos cuidados parentais e do funcionamento familiar.

Hoje cientificamente sabemos que as Perturbações do Espectro do Autismo não são reflexo de mães gélidas do tipo frigorífico como alguém ousou um dia dizer, nem a Perturbação de Hiperactividade e Défice de Atenção é a expressão infantil de famílias pouco tranquilas.

Curiosamente afirmações como por exemplo “Em regra, numa família tranquila não há filhos irrequietos”, são afirmações que continuam a alimentar na nossa sociedade a ideia que existe uma culpa que habita nos pais e na família. Reforçando a crença, que as crianças não precisam de tratamento, mas sim os pais, eles os verdadeiros doentes. Que disparate!

Podemos afirmar sem medo, nem receios e de forma perentória, que todas as perturbações do Desenvolvimento têm causas multifatoriais, sendo o resultado de uma interação imbricada entre genes e meio ambiente. Sendo a qualidade dos cuidados a uma variável central no diálogo genes e ambiente, mas não é por certo a variável que por si só explica tudo, e muito menos explica de forma direta a emergência quadros atípicos de desenvolvimento.

Desengane-se quem acredita que a Terapia Familiar “cura” a doença mental, longe estamos do tempo que alguém viu na Terapia Familiar a “cura” para a Esquizofrenia e para os Quadros Psicóticos. No mesmo sentido, a Terapia Familiar não é a “cura” para uma Perturbação do Espectro do Autismo ou para uma Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção.

Quem diariamente trabalha com crianças com perturbações de desenvolvimento sabe que a grande maioria das crianças têm pais e famílias extraordinárias incansáveis na dedicação, esforço e preocupação. Pais que diariamente se esforçam para compreender e ajudar os seus filhos a superarem obstáculos de forma integrarem-se o mais possível na nossa sociedade, por vezes demasiado intolerante com a diferença.

A Terapia Familiar nas Perturbações do Desenvolvimento é uma reposta para estas famílias extraordinárias, que têm o desafio acrescido de viverem com uma criança, com um perfil de desenvolvimento menos típico. É uma resposta terapêutica, na medida que visa a promoção da saúde mental, mas não é uma resposta terapêutica no sentido de “curar” uma família ou uma determinada perturbação do desenvolvimento.

Senão “cura”, então porquê fazer terapia familiar?

Porque ser pai ou mãe de uma criança diferente, exige ser-se extraordinário na forma como se comunica, como se lê o comportamento, como se antecipa e prepara-se os contextos de vida diária. Este é um processo que naturalmente em determinadas fases do ciclo da vida pessoal dos pais ou do ciclo de vida familiar, pode ter naturalmente percalços ou desafios acrescidos por exemplo no nascimento de um outro filho, num divórcio, na morte de um familiar, ou na simples confrontação com o insucesso escolar.

É nestes momentos de maior esforço para a família, que a Terapia Familiar nas Perturbações do Desenvolvimento faz todo o sentido, como uma resposta que tenta garantir que a criança continua a beneficiar de respostas parentais sensíveis às suas necessidades específicas.

Diríamos que a Terapia Familiar é uma excelente resposta para famílias saudáveis, que sabem bem que a sala do terapeuta não é um lugar de culpa, como tantos outros, mas sim um lugar de responsabilidade e de desafio constante.

Pedro Vaz Santos/Psicólogo Clínico / Terapeuta Familiar
pedro.santos@pin.com.pt

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