Sou uma pessoa naturalmente interventiva, que conversa com relativa facilidade com qualquer interlocutor. Mas, na semana passada, senti-me muda. Numa sala com cerca de 10 pessoas, surgiu o tema dos filhos e dos netos e, a dado momento, as pessoas mais velhas que eu explicaram-me a diferença que existe, para elas, entre ser mãe e ser avó. “O tempo, apenas o tempo”, disseram-me.

E, então, aquelas mulheres com mais de 50 anos começaram a partilhar vivências. A confessar que, quando tinham filhos pequenos, o tempo mal chegava para a maternidade. Que concentraram, por desejo ou necessidade, os seus esforços nas carreiras e que, na maior parte dos dias, só tinham tempo para dar o jantar e, logo em seguida, deitar as crianças. “Perdi-lhes a infância”, repetiram.

Ouviu-se então falar das exigências desmedidas. Da falta de paciência com que no final do dia chegavam a casa. Do desconhecimento que chegaram a ter dos gostos, das necessidades e dos desejos dos seus filhos. Do tempo ter passado demasiado depressa e de hoje olharem para o passado com arrependimento. Com vontade de poder mudar o que, tantos anos depois, se sabe ter sido uma clara inversão de prioridades.

Mas depois vieram os netos. E, aí, elas já tinham percebido a importância do tal tempo, fazendo com que tudo fosse diferente. Já não importa se eles comem no sofá, se sujam o chão com migalhas, se viram o quarto do avesso quando vão brincar. “Porque o mais importante é permitir que eles sejam felizes”, lembraram.

E foi esta frase que me calou. Não pela falta de raciocínio ou de palavras, mas antes porque dei por mim a fazer um exercício de autoanálise. Eu tenho tempo para os meus filhos. Muito, na maior parte das vezes. Acompanho-os em todas as fases das suas vidas, conheço de cor os seus gostos, estou lá todos os dias para as partilhas e para os desabafos, deixo-os comer no sofá e até vou lidando razoavelmente bem com as migalhas que todos os dias espalham pelo chão. Deixo-os brincar na rua, deixo-os voar e acredito que sou uma mãe realmente descomplicada.

Mas, por outro lado, nem sempre sou o que queria ser. De manhã, grito para se despacharem; no final do dia, refilo para fazerem os trabalhos de casa e implico com os ténis espalhados pelo chão; à noite, reclamo quando os mais pequenos resolvem brincar quando já deviam estar a dormir. E nem sempre tenho paciência, ou respondo bem, ou me apetece lidar com as ‘poeiras’ que a maternidade também oferece.

Sim, é verdade que isto é comum à maioria das mães. Mas também é verdade que são incorreções e que, lá está, o tempo passa a correr. Tão depressa que já tenho duas filhas adolescentes e dois miúdos que já me pedem para ir a pé, e sozinhos, para a escola. E amanhã, eles já não serão meus, fazendo-me ficar com as memórias de uma vida feliz que, durante tantos anos (mas tão poucos…), povoou a nossa casa. Com essas e com as lembranças de quando ocupei o tempo da forma menos adequada: mais preocupada com as normas que com a felicidade plena.

Porque educar também é isto: um processo mútuo de aprendizagem e conhecimento. Eles aprendem a ser o melhor possível, nós aprendemos a “ser-lhes” o melhor que conseguimos.

E, então, no final daquela conversa, fui beber um café. Sozinha e ainda presa nos meus pensamentos. Até que reparei numa menina pequena que, mesmo na mesa ao lado, passeava o seu bibe verde e quadriculado, exigindo alegremente a atenção dos pais. “Para um bocado, Maria”. “Deixas-me beber o café?”. “Bolas, que esta miúda nunca está quieta…”.

E, muitas vezes, é isto a vida de uma mãe. O difícil é aprender a ser diferente antes de nos tornarmos avós.