Nos últimos anos, o número de mulheres a candidatar-se à presidência de uma câmara municipal ou de uma junta de freguesia aumentou face a décadas anteriores.
Na campanha para as próximas eleições autárquicas, um pouco por todo o país, também não faltam rostos femininos nos cartazes para o sufrágio do próximo dia 29 de setembro. Muitos deles estreiam-se nas lides políticas.
É o caso de Ana Salgueiro, Cândida Lopes e Carla Marques, mulheres que decidiram juntar mais uma à lista de atividades em que já estão envolvidas com o objetivo de servir a comunidade em que se inserem. «O que me leva a querer presidir uma junta de freguesia é o facto de todos criticarmos os nossos políticos, o que não nos leva a lado nenhum se não formos proativos e não fizermos valer as nossas ideias», assume Cândida Lopes, 37 anos, casada e ex-militar do exército português, que se candidata pelo PS à presidência da Junta de Freguesia de Benfica do Ribatejo.
«No estado em que está o país, são poucas as pessoas que tem coragem de assumir um desafio desta natureza, mas ficar de braços cruzados não resolve os nossos problemas», acrescenta ainda a secretária do vereador José Carlos Silva no município de Almeirim. «Quero escutar a população. Torná-la mais ativa e mais participativa nas decisões da freguesia», promete a licenciada em ciências da informação e da documentação. Aproximar as decisões políticas dos cidadãos comuns é também uma das motivações de Ana Salgueiro, 35 anos, casada, dois filhos, candidata do PSD à presidência da Junta de Freguesia de Martinchel, uma pequena localidade nos arredores de Abrantes.
«Gosto imenso do local onde nasci e onde resido mas apercebo-me que Martinchel está em declínio e é necessário um trabalho de agregação para contrariarmos a tendência de desertificação, para que a minha aldeia crie condições para a fixação de pessoas», defende a bióloga e técnica superior de segurança e higiene do trabalho. Nas cidades maiores, os problemas maiores e os focos de intervenção prioritária nem sempre coincidem, mas o fator motivacional das candidatas não difere muito.
«Não me estou a candidatar à presidência [de uma junta de freguesia] mas faço parte de uma equipa que quer trabalhar como um todo para melhorar a nossa freguesia», justifica também Carla Marques, 45 anos, divorciada, dois filhos, que integra a lista do PS para a presidência da União de Freguesias de Moscavide e Portela, nos arredores de Lisboa, como candidata independente. «O que mais me alicia no trabalho de um autarca é a possibilidade de trabalhar para a população e de desenvolver projetos de proximidade», acrescenta ainda a atual presidente da Associação dos Moradores da Portela.
Ana Salgueiro, Cândida Lopes e Carla Marques concorrem pela primeira vez numas eleições. Se ganharem, passam a mover-se num mundo ainda dominado maioritariamente por homens. «Pela escola que tive no exército, sempre desempenhei funções que eram destinadas maioritariamente aos homens. Por isso, não me faz grande diferença pessoal entrar neste território», confessa Cândida Lopes. «Nos tempos que correm, a tendência é para uma igualdade cada vez maior entre os dois sexos», considera.
«Embora saiba que as pessoas da minha freguesia ainda são um pouco conservadoras, estou confiante que posso vencer este desafio. Apesar dos preconceitos, sei como lidar com eles», garante a candidata. «Não tenho qualquer problema com isso nem penso nessas questões dessa forma. Mais do que homens ou mulheres, temos de ser competentes e respeitarmo-nos mutuamente. Mais do que o género, ligo, isso sim, à competência e capacidade de desenvolver trabalho», admite Ana Salgueiro.
«Sinceramente, não tenho encontrado qualquer dificuldade ou obstáculo [ nesta aventura política pelo facto de ser mulher]. Há muito que me movo muito bem num mundo de homens, como se diz. Sempre tentei que me vissem como uma pessoa e quero me reconheçam pelo trabalho que fiz e que poderei vir a fazer», refere ainda Carla Marques. Para esta jurista, a política nunca foi uma ambição. «Nunca foi um sonho. Não tenho filiação partidária. Tenho as minhas convicções e os meus ideais. Juntei-me a uma equipa em que acredito mas estou como independente», revela.
Ingressar na vida política ativa também não estava nos planos de vida de Cândida Lopes. «Nunca pensei sequer que algum dia poderia vir a entrar neste mundo. No entanto, foi-me endereçado este convite, que entendi não poder recusar, pois é uma oportunidade para fazer algo de útil pela sociedade e, ao mesmo tempo, obter realização pessoal», assume. «Vou até onde me deixarem ir, sempre com os pés bem assentes no chão e com a consciência dos meus limites. E com o cuidado necessário para não me deixar levar pelo poder», diz ainda.
Ana Salgueiro também não era uma mulher com ambições políticas. «Político é alguém que trabalha para o bem comum e para o bem público e isso já eu faço sem ter qualquer cargo definido.
Fizeram-me um convite, ponderei e aqui estou a disponibilizar-me para ajudar de uma forma mais direta e interventiva», assegura. A lista de 26 pessoas que a bióloga encabeça integra 13 mulheres.
«Cumprimos a lei da paridade», faz notar a filha da terra. Dos sete lugares elegíveis, três tem rostos femininos. A principal candidatura adversária também é liderada por mulheres e duas das cabeças de lista à presidência da Câmara Municipal de Abrantes também são do sexo feminino. Nos últimos anos, tanto a freguesia como o município têm sido lideradas por mulheres com vontade de fazer mais pelo bem comum.
«Cada vez temos mais mulheres com formação superior, mais bem informadas, socialmente mais ativas, sendo normal que queiram contribuir de uma forma ativa, partilhando os conhecimentos adquiridos, bem como aqueles característicos das mulheres, como a boa gestão, o equilíbrio emocional, para o bem comum, para o bem público. As mulheres têm uma outra forma de fazer política», garante Ana Salgueiro. «É a evolução natural. As mulheres sempre foram muito lutadoras e interventivas», acrescenta Carla Marques.
«Se tanto mulheres como homens frequentam as mesmas escolas, têm a mesma formação, praticam os mesmos desportos, têm acesso aos mesmos empregos e podem até ser militares, é com naturalidade que cada vez mais se envolvam nas mais diversas áreas da sociedade», afirma ainda Cândida Lopes, para quem a ação social é uma das áreas de intervenção prioritárias, tal como para Ana Salgueiro. «Estou motivada. Ao longo dos últimos anos tenho participado de uma forma ativa na vida da minha freguesia. Colaborei em projetos em que ninguém acreditava», sublinha mesmo.
Os primeiros dias de campanha têm permitido um contacto maior com a população e têm exigido um esforço pessoal acrescido mas não têm, de um modo geral, abalado as convicções das candidatas. Antes pelo contrário! «Se ganhar, como presidente de junta, serei interventiva. Não vou esperar pelas coisas. Vou atrás do melhor para a nossa terra. Existem projetos e programas de financiamento aos quais nos podemos candidatar e garanto que não irei desperdiçar nenhuma dessas oportunidades», promete Ana Salgueiro.
Cândida Lopes também promete arregaçar as mangas e pôr mãos à obra. «Quero criar eventos para as crianças e jovens e desenvolver projetos que envolvam a população mais idosa, para que a sua qualidade de vida melhore e para que se integrem mais na sociedade. E quero que a população veja na junta de freguesia um local onde possa ir resolver os seus problemas e encontrar uma solução», defende a antiga instrutora de código da estrada e condução que, nos tempos de militar na Figueira da Foz, chegou a ser primeiro-sargento.
«É importante estabelecer sinergias entre as várias instituições cívicas que têm desenvolvido um trabalho muito importante na freguesia e desenvolver um trabalho de humanização das populações. Todos temos sempre algo para dar e há muito quem necessite de receber. As pessoas são o nosso maior valor e é para elas que temos de trabalhar. Todos juntos somos melhores e conseguimos fazer mais», afirma Carla Marques.
O apelo ao voto e à participação é um desígnio comum às três candidatas, até porque a abstenção é um dos inimigos eleitorais que mais temem. «Ficar de braços cruzados não resolve os nossos problemas. Se temos a ideia que os nossos políticos estão obcecados pelo poder e não executam as funções para as quais são eleitos com competência, temos que nos mexer e tratar de os substituir», defende Cândida Lopes.
«Como disse Platão, o castigo para aqueles que não se envolvem em política é o de serem governados por seres inferiores e eu não quero que isso aconteça. Nem a mim nem à população da minha freguesia», afiança a candidata socialista à presidência da Junta de Freguesia de Benfica do Ribatejo. As próximas eleições autárquicas estão marcada para o próximo dia 29 de setembro, uma data que, independentemente dos resultados, ficará para sempre na memória destas três mulheres.
Texto: Luis Batista Gonçalves
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