O estudo é da responsabilidade da Federação Europeia de Transportes e Ambiente (T&E, na sigla original), uma organização de defesa de políticas sustentáveis para o setor dos transportes.
Em comunicado, a T&E alerta que o “lobby” europeu dos combustíveis está a pressionar para que haja uma maior queima de culturas alimentares, apesar do colapso no abastecimento de cereais vindos da Ucrânia e da Rússia e de uma iminente crise alimentar mundial.
No documento a T&E apela a que se termine com a transformação do trigo e de outras culturas alimentares em etanol e considerou imoral a pressão para o aumento da produção de biocombustíveis, feita pelo setor, numa altura de escassez alimentar global.
“Todos os anos queimamos nos nossos carros milhões de toneladas de trigo e outras culturas para alimentar os nossos automóveis. Isto é inaceitável face a uma crise alimentar global. Os governos têm de parar urgentemente a queima de culturas alimentares nos automóveis para reduzir a pressão sobre os fornecimentos críticos”, disse, citado no comunicado, Maik Marahrens responsável na T&E pela área dos biocombustíveis.
O estudo indica que tirar o trigo dos biocombustíveis europeus iria compensar em mais de 20% a quebra no fornecimento de trigo ucraniano, em colapso devido à invasão do país pela Rússia, no mês passado.
Na quinta-feira um grupo de organizações não governamentais (ONG) europeias apelou aos governos dos vários Estados-membros para que suspendessem imediatamente a utilização de culturas alimentares para produção de biocombustíveis.
Mas há também apelos crescentes, especialmente entre o ‘lobby’ europeu dos biocombustíveis (ePure e European Biodiesel Board, citados pela T&E), para que o petróleo russo seja substituído por biocombustíveis produzidos a partir de culturas como trigo, milho, cevada, girassol, colza e outros óleos vegetais.
“Mesmo que a Europa duplicasse a área de terras agrícolas que dedica aos biocombustíveis – equivalente a pelo menos 10% das terras agrícolas da UE (União Europeia) para culturas – isto substituiria apenas 7% das importações de petróleo da UE da Rússia”, diz-se no comunicado, no qual se acrescenta que, para substituir todas as importações russas de petróleo por biocombustíveis produzidos internamente, seriam necessários utilizar pelo menos dois terços das terras agrícolas do bloco europeu para a produção de culturas para biocombustíveis.
A associação Zero, uma das organizações ambientalistas portuguesas que faz parte da T&E, diz em comunicado que em Portugal, em 2021, cerca de 27% do biodiesel produzido resultou da utilização de culturas alimentares, principalmente colza, soja e óleo de palma.
Francisco Ferreira, presidente da Zero, diz no comunicado que a indústria dos biocombustíveis está a intensificar os seus esforços de lobby para pressionar a utilização de mais cereais como o trigo e o milho na produção de biocombustíveis, como forma de substituir o petróleo russo.
E acrescenta Maik Marahrens: “Ao fazê-lo, de forma cínica está a tirar partido das preocupações das pessoas relativamente ao preço dos combustíveis, colocando o lucro acima da segurança alimentar. Isto é algo imoral, num cenário em que se assiste a milhões de pessoas em todo o mundo que não podem sequer pagar um pão”.
A Zero e as associações ambientalistas FAPAS (Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade), GEOTA (Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente) e Oikos – Cooperação e Desenvolvimento enviaram na quinta-feira uma carta ao ministro do Ambiente e da Ação Climática a pedir a suspensão imediata da utilização de alimentos para consumo humano e animal na produção de biocombustíveis em Portugal.
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