«Eu tenho um cancro. foi diagnosticado pela primeira vez há 15 anos. Submeti-me a tratamentos convencionais e o cancro entrou em remissão, mas tive uma recidiva. Decidi então aprender tudo o que pudesse para ajudar o meu organismo a defender-se da doença. Enquanto médico, investigador e ex-director do Centro de Medicina Integrativa da Universidade de Pittsburgh, tinha acesso a informações de valor inestimável sobre métodos naturais para prevenir ou ajudar a tratar o cancro. Há sete anos que o mantenho à distância».
Este é um excerto de «Anticancro – um novo estilo
de vida», o mais recente livro de David Servan-Schreiber. Médico, aos 31 anos viu-se no papel de paciente. E aprendeu.
Não só percebeu quais os medos e frustrações de quem está doente e não sabe se se vai curar como, depois de uma recidiva, decidiu descobrir o que poderia fazer, no dia-a-dia, para manter o cancro à distância. Felizmente, decidiu contar-nos tudo no seu novo livro e, também,
nesta entrevista que deu à saber viver.
Ter cancro mudou a forma como encarava a sua profissão?
Sim, passei a estar muito mais interessado em perceber
o que podia fazer, naquele momento, para ajudar os meus pacientes. Tornei-me muito mais próximo do sofrimento deles porque percebia aquilo que eles estavam a sentir, passou a haver uma muito maior empatia.
O que sentiu quando teve uma recidiva?
A recidiva é um momento muito difícil de atravessar
porque sentimos que aquilo nunca vai ter fim e que o cancro é mais forte do que o nosso corpo. Mas foi também o momento em que percebi que, por mais que os tratamentos convencionais
tivessem salvo a minha vida e parecessem
indispensáveis, não eram o suficiente e teria de procurar outras formas de ajudar o meu corpo a defender-se.
Sentiu-se impotente quando, depois da cirurgia e quimioterapia, o seu médico disse que, em termos
de estilo de vida, não havia nada de especial
que pudesse fazer para manter o cancro à distância?
de estilo de vida, não havia nada de especial
que pudesse fazer para manter o cancro à distância?
Eu sabia que isso não podia ser verdade. Importa esclarecer que, actualmente, não existe qualquer método alternativo para curar o cancro.
É completamente
insensato tentar curar esta doença sem recorrer aos melhores métodos da medicina convencional ocidental: a cirurgia, a quimioterapia, a radioterapia, a imunoterapia e, dentro
de pouco tempo, a genética molecular. Mas, da mesma forma, é completamente insensato confiar apenas nesta abordagem puramente técnica e menosprezar a capacidade
natural do nosso organismo de se proteger de tumores. Por isso, não me senti impotente mas percebi que ia ter de investigar sozinho.
O que estava a tentar descobrir exactamente?
Demorei meses a tentar perceber como podia ajudar o meu organismo a proteger-
se, de forma natural, do cancro. Participei em conferências com investigadores que exploram este tipo de medicina, explorei bases médicas e publicações científicas e concluí que a informação estava dispersa e tinha de ser associada porque só em conjunto
revelava o papel essencial das nossas defesas naturais na luta contra o cancro.
Veja na página seguinte: As lições que se aprendem com a doença
E o que aprendeu?
Se todos nós temos um potencial cancro adormecido, todos nós temos um organismo
concebido para detectar e lutar contra o processo de desenvolvimento de tumores.
No Ocidente, uma pessoa em cada quatro morrerá de cancro mas três em cada quatro não morrerão.
Isto significa
que os mecanismos de defesa do seu organismo serão accionados e elas morrerão
devido a outras causas que não cancro. Cada um de nós pode aprender a usar as defesas naturais do organismo para viver uma vida mais longa e mais rica.
Escreveu que vivemos com mitos que diminuem a nossa capacidade de combater
o cancro. Pode dar-nos um exemplo?
o cancro. Pode dar-nos um exemplo?
O maior mito é as pessoas acreditarem que o cancro é geneticamente determinado, o que não é verdade e as investigações provam-no. Os factores genéticos contribuem, no máximo, em 15 por cento das mortes por cancro. A fatalidade genética não existe e podemos aprender a proteger-nos através do estilo de vida.
Em que consiste o novo estilo de vida anticancro que propõe no seu novo livro?
Consiste em quatro abordagens que qualquer
um de nós pode pôr em prática.
A primeira consiste em aprendermos a proteger-nos das mudanças que ocorreram a partir de 1940 e que impulsionaram a actual
epidemia de cancro.
A segunda abordagem
passa por aprender a adaptar a nossa alimentação de modo a eliminar promotores
de cancro e a incluir o maior número
possível de componentes fitoquímicos que combatem activamente os tumores.
A terceira consiste na busca de paz de espírito,
derrubando barreiras psicológicas que alimentam os mecanismos biológicos de desenvolvimento do cancro. Por último, a quarta abordagem ensina-nos a importância de encontrar uma actividade física adequada,
criando um relacionamento mais activo com o nosso corpo que estimule o sistema imunitário e reduza a inflamação causadora do desenvolvimento de tumores.
Que mudanças contribuiram para a epidemia
de cancro?
de cancro?
Há, pelo menos, cinco factores responsáveis:
em primeiro lugar, a adição de grandes quantidades de açúcar à nossa alimentação. Nos EUA, o consumo de açúcar por pessoa,
anualmente, passou de cinco quilos, em 1830, para 70 quilos anuais em finais do século XX. De cada vez que ingerimos açúcar originamos processos de inflamação
que fomentam o crescimento do cancro.
O segundo factor são as alterações nos processos agrícolas e pecuários. Os animais
comiam erva, o que já não acontece e transformou a cadeia alimentar e, consequentemente,
a nossa alimentação, tornando-a pro-inflamatória, cheia de gorduras trans. O terceiro factor é a exposição a um grande número de produtos químicos que não existiam antes e que são cancerígenos como o amianto, benzina, pesticidas, derivados
do plástico, susbstâncias integradas em cosméticos e perfumes...
Veja na página seguinte: Os conselhos do especialista
E qual é a quarta mudança?
A redução da actividade física. Gosto de perguntar
às pessoas se alguém tem avós que não fossem a pé para a escola. Actualmente, quantos de nós conhecem crianças que vão a pé para a escola?
A nossa relação com a actividade física transformou-se completamente
nos últimos 50, 60 anos e está provado
que a prática de exercício físico é uma forma de protecção contra o desenvolvimento
do cancro.
A quinta mudança é a densidade na nossa rede social. É bastante visível nas áreas metropolitanas que as pessoas
mudam-se, em média, de cinco em cinco anos, indo para longe dos vizinhos, amigos, família, etc. Isto é normal mas, em fases de grande stress, isso pode ter consequências.
Os estudos mostram que um dos principais factores de protecção contra os efeitos biológicos do stress no nosso corpo é a densidade da nossa rede social.
Voltando ao novo estilo de vida que propõe,
quais são os alimentos anticancro por excelência?
quais são os alimentos anticancro por excelência?
O chá verde, a soja, o gengibre... Na família
das couves temos a couve-flor, brócolos,
couve-de-bruxelas e couve chinesa. Depois encontramos o alho, cebola, alho francês, chalota e cebolinho.
Estou muito impressionado com os resultados dos estudos
em relação ao açafrão-da-Índia, que o elegem como o anti-inflamatório natural
mais poderoso actualmente identificado.
Mas a lista de alimentos anticancro é muito mais extensa...
Mais pormenorizadamente, qual é a importância da actividade física na prevenção/
combate ao cancro?
combate ao cancro?
A actividade física é um dos factores principais
de protecção contra o crescimento
do cancro. Actualmente, tudo leva a acreditar que a prática regular de exercício
físico reduz substancialmente o risco de recaída e, no que diz respeito ao cancro da mama, actualmente existem estudos publicados
que sugerem que uma mulher que tenha tido cancro da mama e que caminhe 30 minutos, seis vezes por semana, estará a reduzir as chances de recaída em 50 por cento.
E podemos estar a falar, simplesmente,
de ir a pé para o emprego... Os melhores fármacos não conseguem estes resultados e, aliás, nada impede que essa mulher tome o fármaco e vá a pé para o emprego...
Qual é a ligação entre mente e cancro?
Sempre que temos períodos prolongados de desesperança, desespero, impotência, a noradrenalina e o cortisol que o cérebro produz para reagir a essa desesperança ajudam
a desencadear a inflamação e diminuem
a capacidade do sistema imunitário se defender. Não causa cancro mas ajuda a promover o crescimento de um cancro ainda inexistente.
Da sua experiência, a vontade de viver é uma arma importante contra o cancro?
Sim, no sentido de nos levar a usar as ferramentas
que temos para nos defender. Estimula-nos a cumprir o tratamento até ao fim, a fazer a alimentação que devemos,
a praticar exercício físico, a aprender
a gerir o stress, a pedir apoio às pessoas que são mais importantes na nossa vida e que nos podem ajudar.
Celebra o aniversário do dia em que soube que tinha um tumor no cérebro. Porquê?
Porque fez-me ter consciência de que devia viver a minha vida de forma diferente,
que precisava de a alimentar. Foi um ponto de viragem, uma espécie de segundo nascimento.
Texto: Teresa d'Ornellas
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