No entanto, os cuidadores queixam-se de ficarem “esquecidos” atrás dos seus dependentes. E perguntam “quem cuida de nós?”.
A apresentação das medidas de apoio ao cuidador informal, no passado dia 15 de Fevereiro de 2019, era algo há muito esperado pelos cuidadores, existindo diversas associações que assim o exigiam, e que levou a que muitos cuidadores começassem a sentir-se mais valorizados. De acordo com as estatísticas, estima-se que existam, em Portugal, cerca de 800 mil cuidadores informais.
Ainda é cedo para perceber o que poderá implicar este novo estatuto do cuidador informal, pois é um processo que leva o seu tempo. Prevê-se, à semelhança do que acontece noutros países, que possam ser criados apoios financeiros e oportunidades de formação para os cuidadores informais, bem como seja melhorada a articulação com a rede de cuidados de saúde.
É importante referir que estas medidas abrangem apenas os cuidadores informais. Estes são aqueles que assumem os cuidados de uma pessoa dependente (criança, idoso, deficiente ou doente), fora do âmbito profissional e sem qualquer contrapartida financeira. Embora não seja uma exigência do estatuto, na maioria dos casos, essa função é exercida por familiares ou amigos. A ajuda prestada pode ser feita ao nível de tarefas domésticas, financeiras e/ou através de apoio pessoal ou médico. A pessoa dependente pode viver com o cuidador na mesma casa, na sua própria casa ou numa instituição.
Principais dificuldades sentidas pelos cuidadores
Para uma correta aplicação e definição dos apoios necessários para os cuidadores, torna-se importante compreender não só as suas vivências e pontos fortes, como perceber especialmente os seus desafios e dificuldade, e que tipo de ajuda os cuidadores percecionam como sendo necessária para a melhor execução do seu papel e para a melhoria da sua vida e da pessoa dependente.
Em primeiro lugar, os cuidadores informais realizam a sua missão de forma não remunerada, pelo que suportam, quase sem apoios, os custos de cuidar da pessoa dependente a seu encargo. Deste modo, a missão do cuidador informal revela-se duplamente difícil: cuidar de alguém que necessita de cuidados permanentes, geralmente a tempo inteiro, e faze-lo sem qualquer remuneração, uma vez que tal tarefa dificilmente é compatível com ocupar um emprego remunerado.
Os elevadores custos são outro dos maiores desafios percecionados pelos cuidadores, sobretudo com gastos médicos, transportes e obras na própria casa (geralmente necessárias para acomodar o dependente). Além desta dificuldades financeiras, os cuidadores queixam-se da falta de conhecimento acerca de serviços do apoio disponíveis, da falta de informação acerca do diagnóstico feito à pessoa a seu cargo e, particularmente, pela desvalorização do seu papel por parte dos profissionais de saúde. É importante salientar este aspeto, pois os cuidadores informais não são percecionados como fazendo parte da rede de serviços de saúde, pelo que a falta de acessibilidade a esses mesmos serviços agrava ainda mais o cumprimento da sua missão de cuidador.
Também ao nível familiar são notadas grandes dificuldades. A situação de ter um dependente a cargo implica a necessidade de alterar rotinas, pelo que a própria família tem que adaptar-se a uma nova realidade mediante a tarefa de cuidar. Esta realidade, ela mesmo, é geradora de sobrecarga, dado que o cuidador tem que gerir a sua vida familiar e, ao mesmo tempo, executar as tarefas de cuidador.
Outra dificuldade percecionada pelos cuidadores é o grande esgotamento sentido no dia a dia. Uma vez que a autonomia da pessoa varia com o seu nível de incapacidade, a tarefa do cuidador também é variável e, frequentemente, exige uma constante adaptação, consoante as exigências da situação. Além disso, a tarefa é realizada a tempo inteiro, o que provoca no cuidador um grande desgaste.
As dificuldades sentidas pelos cuidadores a nível psicológico
De facto, uma investigação feita nesta temática identificou como principais desafios dos cuidadores a sobrecarga ao nível físico e as dificuldades ao nível psicológico. Este estudo comparou dois grupos de pessoas com a mesma faixa etária, os que eram cuidadores e os que não tinham esse papel de cuidar de alguém. Verificou-se que os primeiros apresentam uma saúde física mais empobrecida e, consequentemente, um maior consumo de medicamentos. Além disso, o estudo identificou que a função de cuidador era fonte de sobrecarga e tensão, originando problemas ao nível psicológico, estando associada a elevados níveis de sintomatologia depressiva, acumulados com sentimentos como tensão, constrangimento, fadiga, stress, frustração, isolamento social e alteração de autoestima, isto é, transtornos psicossociais motivados pelo stress.
Ainda faltam as ajudas que se traduzam num verdadeiro apoio ao cuidador
Tendo tudo isto presente, pode dizer-se que a aprovação das medidas de ajuda ao cuidador informal foi um passo muito importante, mas ainda não contempla as medidas necessárias que se traduzam num verdadeiro apoio ao cuidador.
Essas medidas passariam por permitir a conciliação da vida profissional com a missão de cuidador, nomeadamente com soluções de alívio ao nível financeiro. Deveriam ser incluídas medidas ao nível da formação e reconhecimento do cuidador como parte integrante da rede de serviços de saúde, logo com uma melhor articulação e acesso aos mesmos. E, sobretudo, medidas de apoio especial ao nível dos cuidados de saúde do próprio cuidador, tais como custos médicos, medicação e tratamento psicológico. Porque há que perceber que o cuidador também necessita de ser cuidado!
Margarida Rogeiro / Psicóloga e Psicoterapeuta
© PsicoAjuda – Psicoterapia certa para si, Leiria
Comentários