Do universo de 1,6 milhões de infetados de SIDA em Moçambique, apenas 640 mil procuram tratamento, mas um terço abandonam-no logo no primeiro ano, segundo dados oficiais revelados em Maputo durante a apresentação do relatório "Aconselhamento em HIV/TB: Quem está a fazer o trabalho".

"A maior parte das organizações no terreno está a trabalhar, mas o Governo não está a garantir o seu próprio pessoal e, por isso, existe uma lacuna", disse à Lusa Carlota Silva, analista da MSF para o tema de SIDA, à margem da apresentação do relatório.

Apontando para os "conselheiros leigos", profissionais de formação curta e responsáveis pelo apoio psicossocial nas comunidades, como meio alternativo para fazer face aos altos índices de prevalência da doença em Moçambique, Carlota Silva considerou que o Governo moçambicano precisa garantir que o tratamento seja feito com mais qualidade e tenha um acompanhamento contínuo.

Falta de pessoal médico

"É importante que haja mais vontade política por parte do Governo. Neste momento, os clínicos e enfermeiros são muito poucos", adiantou Carla Silva, acrescentando que os atuais 501 conselheiros registados em Moçambique não são capazes de responder ao crescente número de pessoas infetadas.

De acordo com o relatório da MSF, até ao final do ano Moçambique precisa de 1.893 conselheiros para atingir as metas estabelecidas pelo Governo.

Para Carlota Silva, a falta de condições económicas e a distância entre os postos de saúde e as residências das populações estão também entre as principais causas da desistência das pessoas em tratamento.

"Nós defendemos que o tratamento tem de ser muito simplificado para o paciente e o conselheiro tem a função de ajudá-lo, orientando-o em todo processo", reiterou a analista da organização, que tem projetos nas províncias de Maputo e Tete.

Também Lucas Molfino, chefe da missão da MSF, apontou o acompanhamento contínuo como um dos principais desafios no combate à sida em Moçambique, considerando que os clínicos não estão a conseguir responder à taxa de prevalência da doença no país, fixada em 11,%, de acordo com dados da ONUSIDA em 2014, e apelando para um maior envolvimento do Governo e das organizações da sociedade civil.

"A falta de apoio político e financeiro para um aconselhamento contínuo compromete os compromissos internacionais de combate a epidemia", declarou Lucas Molfino.

O relatório, que resulta de uma parceria entre a MSF, a ONU e a Rensida, compara Moçambique a sete Estados africanos, nomeadamente Lesoto, Malauí, África do Sul, Suazilândia, Zâmbia e Guiné Conacri, e constata que o país está a "negligenciar recursos cruciais" no combate à epidemia, embora haja progressos no âmbito da expansão da rede de tratamento.

O Governo moçambicano desembolsou 10,2 % do Orçamento do Estado de 2015 para apoiar o setor da saúde, num aumento de 1,1% face a 2014.