“Os grandes desafios que se colocam hoje ao sistema de saúde como um todo, e em especial, ao SNS, decorrem de um conjunto de fatores que são críticos para a nossa capacidade de resposta integrada às necessidades em saúde dos cidadãos residentes em Portugal”, alerta o novo relatório sobre a carreiras médicas hoje entregue pelo bastonário da OM, Miguel Guimarães, ao ministro da Saúde.

O documento salienta que os custos dos cuidados de saúde constituem um “desafio importante” que merece atenção, defendendo ser necessário encontrar “soluções internas e externas, com base na cooperação nacional e internacional, que possam minimizar o seu impacto”, sem colocar em causa a qualidade dos cuidados prestados aos cidadãos.

O envelhecimento da população e a baixa taxa de natalidade representam o segundo desafio com que o sistema de saúde se confronta, refere o relatório agora entregue ao ministro Manuel Pizarro e que preconiza que as soluções nacionais para essa questão demográfica passam por uma relação de proximidade entre a Saúde e a Segurança Social.

A OM defende, assim, que deve ser feita uma “aposta clara num instituto público nacional, devidamente financiado e independente, para a promoção da saúde, a prevenção da doença e a educação e literacia em saúde e utilização correta do sistema de saúde”.

De acordo com o relatório, este novo organismo deveria integrar e envolver professores, arquitetos, engenheiros, médicos e outros profissionais de saúde e de outras áreas conexas.

“A descentralização de competências na área da saúde pode ser um contributo importante para a nossa capacidade de estar mais próximo e cuidar das pessoas mais frágeis e combater as fortes desigualdades sociais em saúde que não param de crescer”, reconhece ainda a ordem.

Quanto à garantia de cuidados de saúde de qualidade e em tempo clinicamente aceitável – o terceiro desafio -, o documento sublinha que esse acesso assume uma “importância crucial para a qualidade e sobrevida das pessoas”, mas que não tem tido uma resposta eficiente nos anos recentes.

“O estigma dos últimos anos em abrir as portas a uma cooperação efetiva, regulada e devidamente fiscalizada, entre o setor público e os setores privado e social” é uma das razões apontadas pela OM para essa ineficiência.

O relatório refere ainda que a “variação na prática clínica” constitui um quarto desafio que coloca problemas adicionais no planeamento, organização e execução dos cuidados de saúde, em diferentes níveis de atendimento aos utentes.

“Este desafio, de mais fácil resolução, não sendo particularmente impactante em Portugal, não deixa de ser preocupante e motivo para uma intervenção no sentido de normalizar processos e procedimentos, fundamentais para o sucesso de várias medidas na área da saúde”, alerta a ordem.

O quinto desafio, de acordo com o documento, está relacionado com “ineficiente uso de informação”, que constitui um “sério problema na gestão adequada” do percurso do doente no SNS e no sistema de saúde.

“Na verdade, o acesso à informação, incluindo exames complementares de diagnóstico e terapêutica, de uma forma global no sistema de saúde, continua a não ser uma realidade”, sublinha a OM, para quem a “principal transformação digital, com benefícios muito importantes para os doentes, para os médicos e para a sociedade, continua por fazer”.

“O processo clínico único constitui uma medida essencial para melhorar a qualidade da saúde dos nossos doentes, evitar desperdícios e potenciais complicações, e gerar uma poupança para as pessoas e para o Estado”, preconiza a instituição liderada por Miguel Guimarães.

A ordem alerta também para a situação dos “cuidados fragmentados versus cuidados integrados”, o sexto desafio que afeta todos os setores da saúde e que coloca “sérios problemas” na organização do trabalho e no planeamento da oferta de cuidados.

Perante isso, o relatório defende uma cooperação entre diferentes instituições, serviços e nível de cuidados, que deve ter uma coordenação nacional e regional, capaz de gerar eficiência dentro do SNS e do sistema de saúde caso seja necessário.

 “Já existe evidência [prova] científica suficiente que mostra de forma clara que os resultados da gestão de topo protagonizada por médicos, com competência específica na área da gestão, são em média superiores aqueles que dependem exclusivamente dos administradores de carreira”, refere o documento.

O sétimo desafio elencado pela OM refere-se à “duplicação” da medicina defensiva e do desperdício, alegando que constituem um “problema grave em muitos sistemas de saúde, que resultam numa ineficiência significativa no que diz respeito à qualidade da gestão e dos cuidados de saúde”.

Por último, a ordem alerta para o “atraso deliberado na adoção da inovação” terapêutica e tecnológica no SNS, que faz com que os doentes não tenham acesso aos tratamentos mais eficazes, mas também à frustração dos médicos “por não conseguirem tratar os seus doentes de acordo com a evidência científica e as melhores práticas clínicas”.

“Muitos médicos preferem trabalhar em unidades de saúde em que o acesso a investigação e inovação é reconhecido como uma prioridade pelas administrações das unidades de saúde. O que leva a que muitos médicos optem por trabalhar fora do SNS, por encontrarem melhores condições globais de trabalho” salienta a ordem, que considera que esta situação é “fácil de resolver se existir boa vontade política”.